Série "LIÇÕES DE SALA-DE-AULA"
A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Teoria Geral - Parte I
Clemilton da Silva Barros
1
INTRODUÇÃO
O objetivo do curso é demonstrar a importância da efetividade para o Direito Processual Moderno (fase instrumental), avaliando, neste contexto, a
pertinência das últimas mudanças legislativas em sede de execução; sistematizar
conceitualmente as diversas modalidades de execução, que serão estudadas
no decorrer do curso; e fazer compreender a dualidade do regramento da execução (ou
efetivação do direito), classificada esta tendo em vista a natureza do título
em que se funda (título judicial ou extrajudicial)
Importa
inicialmente proceder-se a um estudo sistemático do Código de Processo
Civil Brasileiro, tendo em mente a tutela jurisdicional postulada pela parte. O
CPC tem a seguinte divisão:
Livro I
– Processo de Conhecimento – busca
estabelecer a certeza jurídica definindo a titularidade de um direito;
Livro II
– Processo de Execução – visa
satisfazer (efetivar) um direito já devidamente definido;
Livro III – Processo Cautelar – visa garantir a
efetividade de um processo principal (conhecimento ou execução) e não de um
direito.
Livro IV
– Procedimentos Especiais – para situações em que, via de regra, a tutela
pretendida reclama o acertamento do direito, o acautelamento e a execução na
mesma relação processual;
Livro V –
Disposições Finais e Transitórias – Regula a vigência e a aplicação do Código.
A sua entrada em vigor e o regramento das relações jurídicas pretéritas
(direito intertemporal)
O Código prevê três
espécies de processos e um procedimento que conjuga características dos três
processos.
O processo de execução pode ser definido como a
atividade estatal que tem por fim a realização prática do comando concreto
derivado do direito objetivo (Cândido R. Dinamarco).
2
TUTELAS JURISDICIONAIS
A partir da
sistemática adotada pelo CPC e considerando-se o tipo de proteção pretendido,
três podem ser as modalidades de tutelas jurisdicionais:
a) tutela de certeza, ou de conhecimento, ou
declaratória
(o poder jurisdicional certifica, pela coisa julgada, determinada relação
jurídica);
b) tutela de efetivação ou executiva (efetiva
direitos subjetivos); e
c) tutela de segurança ou cautelar (providência
que assegure a efetivação das duas anteriores)
Nota-se que a
tutela executiva é o fim último da atividade jurisdicional. Busca a satisfação
ou realização de um direito já acertado ou definido em título judicial ou
extrajudicial.
Via de regra, a
tutela executiva atua exclusivamente em favor do credor, diferente do que
ocorre com as tutelas cognitivas e cautelares. Não atua, porém, sobre a pessoa
do devedor, mas sobre o seu patrimônio.
3 EVOLUÇÃO DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS
(ESPÉCIES DE EXECUÇÃO)
No sistema
originário do CPC não havia distinções relevantes entre a execução por título
judicial e extrajudicial. O Livro II tratava, de forma indistinta, de ambas.
A sistemática
adotada no texto original do atual CPC (de 1973), herdada do CPC de 1.939,
utilizava um processo para conhecer o direito e outro para efetivá-lo.
Isto, porém, ia de
encontro à celeridade e efetividade do Processo, o que ensejou a deflagração de
várias reformas no sistema de execução do CPC, instalando-se o chamado processo sincrético como regra e o processo autônomo como exceção.
Essas reformas
podem ser assim resumidas:
a) 1º Momento - Lei nº 8.952/1994, que reescreveu o
art. 461, para tratar do cumprimento das obrigações
de fazer ou não fazer;
De acordo com o
art. 461 e seus parágrafos, quando julgado procedente o pedido de obrigações de fazer ou não fazer, o
juiz expede uma ordem ao devedor. Se ele não a atende, desnecessário processo
autônomo de execução. Basta que se postule as providências previstas nos §§ 4º,
5º e 6º do art. 461 para efetivar a determinação judicial.
b) 2º Momento – Lei nº
10.444/2002, que introduziu o art. 461-A, para tratar do cumprimento das obrigações de entrega de coisa;
Antes, o devedor
era citado para promover a entrega, sob pena de busca e apreensão ou imissão de
posse, conforme o bem fosse móvel ou imóvel. Com as alterações acrescentadas
pela Lei nº 10.444/02, a sentença que
condena à entrega de coisa é
mandamental, e dispensa posterior processo de execução.
De acordo com o §
2º do art. 461-A, "não cumprida a obrigação no prazo estabelecido,
expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na
posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel". O processo de
execução para entrega de coisa, tratado no Livro da Execução, ficou reservado
apenas para aquelas obrigações fundadas em título extrajudicial.
c) 3º Momento – Lei nº
11.232/2005, que estendeu o processo sincrético em relação ao cumprimento
das obrigações de pagar quantia certa (obrigação de pagar dinheiro, fundada em título
judicial, exceto contra a fazenda pública), nos termos do art. 475-J;
Foi a maior de
todas as alterações. O cumprimento das
sentenças condenatórias em obrigação de fazer ou não fazer e de entrega de
coisa continua sendo feito na forma dos arts. 461 e 461-A. Mas a lei
modificou a execução das obrigações por quantia certa, e ao fazê-lo, acabou por
transformar a própria estrutura do processo como um todo.
Antes, uma ação com
um pedido de cobrança, desde o ajuizamento da demanda até a satisfação da
obrigação, poderia render até três
processos distintos: o de
conhecimento (de natureza cognitiva); o
de liquidação (também de natureza cognitiva), caso o valor da condenação
não fosse líquido;e o de execução.
Em cada um deles - dada a sua autonomia – era preciso promover-se uma nova
citação do réu. Havia uma sentença, que
punha fim ao processo de conhecimento; outra, ao processo de liquidação, e uma
terceira, que encerrava o de execução.
d) 4º Momento – Lei nº
11.382/2006, que alterou o processo
de execução autônomo, que remanesce basicamente em relação aos títulos extrajudiciais (arts. 652 e segs. do CPC), cujos
procedimentos são aplicáveis subsidiariamente no caso de SATISFAÇÃO DE TUTELA JURISDICIONAL (títulos judiciais).
Antes
dessas alterações, a regra para a
SATISFAÇÃO DOS DIREITOS (tutelas jurisdicionais e título executivo
extrajudiciais) era o processo de
execução autônomo. As exceções eram, por exemplo, ações de despejo e ações
possessórias, para cuja execução não se exigia processo de execução.
Hoje, a regra para a satisfação da TUTELA
JURISDICIONAL é o cumprimento de sentença, ressalvadas algumas situações
excepcionais, conforme previsto no art. 475-N, parágrafo único.
Em suma, a execução hoje rege-se em dois formatos,
ditados pelas Leis nº 11.232/05 e nº 11.382/06. A idéia do legislador foi
proporcionar uma execução mais efetiva, já esta era tida como o grande problema
de frustração do processo.
4 ESPÉCIES DE EXECUÇÃO (ATUAIS FORMAS DE
EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS)
O próprio CPC, no seu Livro II, sistematiza o
processo de execução, tratando-o sob diversas modalidades. Disso, tomando como
referência os variados aspectos da execução, a doutrina aponta as seguintes
classificações:
4.1 Quanto ao procedimento OU natureza do
título
POR FASE (cumprimento de
sentença) ou POR PROCESSO AUTÔNOMO (execução propriamente dita)
4.1.1 Execução por fase
(Processo sincrético, cumprimento de
sentença) – alcança os títulos executivos judiciais, exceto no caso do
parágrafo único do art. 475-N (títulos judiciais atípicos): a sentença penal condenatória; a sentença
arbitral; e a sentença estrangeira homologado pelo STJ.
A execução por fase
alcança as sentenças que reconheçam as seguintes obrigações:
- De fazer ou não fazer (art. 461);
- De entregar coisa (art. 461-A); e
- De pagar (art. 475-J)
4.1.2 Execução por processo
(Processo autônomo) - é própria dos os títulos executivos extrajudiciais (art.
585), mas também alcança alguns títulos judiciais, tais como: as
execuções contra a Fazenda. Pública
(arts. 730 e 731); a execução de
alimentos (arts. 732 e 735); e, excepcionalmente, os títulos judiciais
atípicos (parágrafo único do art. 475-N).
Em face das alterações do CPC, a doutrina vem tratando como EXECUÇÃO
apenas aquela efetuada por processo autônomo (Livro III do CPC, do art. 566 ao art. 795).
4.2 Quanto à natureza da prestação devida
4.2.1 No cumprimento de sentença, quanto à natureza
da prestação, a execução pode ser:
- De obrigação de fazer ou não fazer (art. 461);
- De entregar coisa certa ou incerta (art. 461-A); e
- De pagar (art. 475-J)
4.2.2
Na execução por processo, quanto à natureza da prestação, a execução
pode ser:
a)
Execução de obrigação de dar (ou entregar)
a.1)
DAR COISA, que pode ser
– certa (arts. 621 ao
628) e
- incerta ou indeterminada
(art. 629 ao 631).
a.2)
DAR DINHEIRO (ou execução por quantia certa), que pode ser:
- Execução por quantia certa contra devedor solvente (arts. 646 ao
724);
- Execução contra a Fazenda Pública (arts. 730 ao 731);
- Execução de prestação de alimentos (arts. 732 ao 735);
- Execução fiscal (Lei nº 6.830/80); e
- Execução por quantia certa contra devedor insolvente (arts. 748 ao
786-A).
b)
Execução de obrigação de FAZER (arts. 632 ao 638) e NÃO FAZER (arts. 642 e 643).
4.3 Quanto
à eficácia do título executivo
A execução, a rigor, é sempre definitiva. Contudo,
tendo-se em mente o objetivo de satisfazer o direito do credor no mais curto
prazo possível, desde logo já se executa o houver de incontroverso na execução,
daí a classificação e DEFINITIVA e PROVISÓRIA.
É definitiva quando
não houver qualquer discussão pendente (integralidade ou parte da execução).
Caso contrário, será provisória.
Há distinção no
procedimento, a depender de se tratar de
execução por fase e por processo.
a)
Execução por fase (tem previsão no art. 475-I, § 1º). É
definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se
tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito
suspensivo).
A
execução definitiva efetiva-se nos termos do art. 475-J, sendo processada nos
próprios autos, e a provisória, nos termos do art. 485-O, sendo processada em
autos suplementares, conforme dispõe o art. 475-O, § 3º.
b)
Execução por processo (regida pelo art. 587). A
simples interposição de embargos à execução não induz à execução provisória. É
preciso que o juiz lhe atribua efeito suspensivo.
4.4 Outras classificações
As classificações acima descritas
ganham outras formas e nomenclaturas, contudo, sempre esbarrando praticamente na
mesma substância. Veja-se, por exemplo, o quadro abaixo, em que se toma como
referência basicamente os mesmos elementos, surtindo o mesmo resultado:
CLASSIFICAÇÃO QUANTO À NATUREZA DA OBRIGAÇÃO
|
|||||
Obrigação de dar coisa
|
Execução de entrega de coisa certa
|
||||
Execução de entrega de coisa incerta
|
|||||
Obrigação de fazer e não fazer
|
Execução de obrigação de fazer
|
||||
Execução de obrigação de não fazer
|
|||||
Obrigação de pagar quantia certa
|
Obrigação de pagar quantia certa contra
devedor solvente
|
||||
Obrigação de pagar quantia certa contra
devedor insolvente
|
|||||
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TÍTULO EM QUE SE BASEIA
|
|||||
Títulos
executivos judiciais (Art. 475-N, CPC)
|
Cumprimento de sentença “stricto sensu”
|
Sentença judicial que reconheça obrigação de
fazer e não fazer (artigo 461, CPC)
|
|||
Sentença judicial que reconheça obrigação de
dar coisa (artigo 461-A, CPC)
|
|||||
Execução “sine
intervallo” (ou execução por fase - processo
uno)
|
Sentença judicial que reconheça obrigação de
pagar quantia;
Sentença judicial que reconheça
obrigação de pagar quantia (arts. 475-I e
475-J, CPC)
|
||||
Execução por processo
|
Sentença penal condenatória; Sentença
arbitral; Sentença estrangeira homologada pelo STF: depois de distribuída a
petição inicial e citado o executado, aplica-se o procedimento da nova
lei (art. 475-I ao 475-R, CPC)[1]
|
||||
Títulos
executivos extrajudiciais (Art. 585, CPC)
|
EXECUÇÃO
|
Livro II, CPC/artigos 566 e segs., CPC
|
|||
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO SEU CARÁTER
|
|||||
Execução definitiva
|
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, CPC
|
Fundada em título extrajudicial/sentença
passada em julgado
|
|||
Execução Provisória
|
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, par. 1º e 542, par. 2º, CPC
Artigo 475-O, CPC
|
Fundada em sentença pendente de recurso
desprovido de efeito suspensivo (RE e REsp).
Corre por iniciativa, conta e
responsabilidade do exequente, que se responsabiliza a reparar os danos do
executado, e exige “caução suficiente e idônea, arbitrada pelo
juiz e prestada nos próprios autos” (art. 475-O, I a III, CPC)
|
|||
5 REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de.
Aspectos polêmicos da nova execução. São Paulo: RT, 2006.
DONIZETTI, Elpídio.
Curso Didático de Direito processual Civil. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 47 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2007.
MEDINA, José Miguel
Garcia. Processo Civil Moderno. Execução, 2 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011.
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