quarta-feira, 16 de maio de 2012


Série  "LIÇÕES DE SALA-DE-AULA"


A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
  Teoria Geral  - Parte I

Clemilton da Silva Barros




1  INTRODUÇÃO
            O objetivo do curso é demonstrar a importância da efetividade para o Direito Processual Moderno (fase instrumental), avaliando, neste contexto, a pertinência das últimas mudanças legislativas em sede de execução; sistematizar conceitualmente as diversas modalidades de execução, que serão estudadas no decorrer do curso; e fazer compreender a dualidade do regramento da execução (ou efetivação do direito), classificada esta tendo em vista a natureza do título em que se funda (título judicial ou extrajudicial)
            Importa inicialmente proceder-se a um estudo sistemático do Código de Processo Civil Brasileiro, tendo em mente a tutela jurisdicional postulada pela parte. O CPC tem a seguinte divisão:
Livro IProcesso de Conhecimento – busca estabelecer a certeza jurídica definindo a titularidade de um direito;
Livro IIProcesso de Execução – visa satisfazer (efetivar) um direito já devidamente definido;
Livro III – Processo Cautelar – visa garantir a efetividade de um processo principal (conhecimento ou execução) e não de um direito.
Livro IV – Procedimentos Especiais – para situações em que, via de regra, a tutela pretendida reclama o acertamento do direito, o acautelamento e a execução na mesma relação processual;
Livro V – Disposições Finais e Transitórias – Regula a vigência e a aplicação do Código. A sua entrada em vigor e o regramento das relações jurídicas pretéritas (direito intertemporal)
              O Código prevê três espécies de processos e um procedimento que conjuga características dos três processos.
              O processo de execução pode ser definido como a atividade estatal que tem por fim a realização prática do comando concreto derivado do direito objetivo (Cândido R. Dinamarco).

2  TUTELAS JURISDICIONAIS
            A partir da sistemática adotada pelo CPC e considerando-se o tipo de proteção pretendido, três podem ser as modalidades de tutelas jurisdicionais:
a)  tutela de certeza, ou de conhecimento, ou declaratória (o poder jurisdicional certifica, pela coisa julgada, determinada relação jurídica);
b)  tutela de efetivação ou executiva (efetiva direitos subjetivos); e
c)  tutela de segurança ou cautelar (providência que assegure a efetivação das duas anteriores)
              Nota-se que a tutela executiva é o fim último da atividade jurisdicional. Busca a satisfação ou realização de um direito já acertado ou definido em título judicial ou extrajudicial.
              Via de regra, a tutela executiva atua exclusivamente em favor do credor, diferente do que ocorre com as tutelas cognitivas e cautelares. Não atua, porém, sobre a pessoa do devedor, mas sobre o seu patrimônio.

3 EVOLUÇÃO DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS (ESPÉCIES DE EXECUÇÃO)
              No sistema originário do CPC não havia distinções relevantes entre a execução por título judicial e extrajudicial. O Livro II tratava, de forma indistinta, de ambas.
              A sistemática adotada no texto original do atual CPC (de 1973), herdada do CPC de 1.939, utilizava um processo para conhecer o direito e outro para efetivá-lo.
              Isto, porém, ia de encontro à celeridade e efetividade do Processo, o que ensejou a deflagração de várias reformas no sistema de execução do CPC, instalando-se o chamado processo sincrético como regra e o processo autônomo como exceção.
              Essas reformas podem ser assim resumidas:
a) 1º Momento - Lei nº 8.952/1994, que reescreveu o art. 461, para tratar do cumprimento das obrigações de fazer ou não fazer;
              De acordo com o art. 461 e seus parágrafos, quando julgado procedente o pedido de obrigações de fazer ou não fazer, o juiz expede uma ordem ao devedor. Se ele não a atende, desnecessário processo autônomo de execução. Basta que se postule as providências previstas nos §§ 4º, 5º e 6º do art. 461 para efetivar a determinação judicial.
b) 2º Momento – Lei nº 10.444/2002, que introduziu o art. 461-A, para tratar do cumprimento das obrigações de entrega de coisa;
              Antes, o devedor era citado para promover a entrega, sob pena de busca e apreensão ou imissão de posse, conforme o bem fosse móvel ou imóvel. Com as alterações acrescentadas pela Lei nº 10.444/02, a sentença que condena à entrega de coisa é mandamental, e dispensa posterior processo de execução.
              De acordo com o § 2º do art. 461-A, "não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel". O processo de execução para entrega de coisa, tratado no Livro da Execução, ficou reservado apenas para aquelas obrigações fundadas em título extrajudicial.
c) 3º Momento – Lei nº 11.232/2005, que estendeu o processo sincrético em relação ao cumprimento das obrigações de pagar quantia certa (obrigação de pagar dinheiro, fundada em título judicial, exceto contra a fazenda pública), nos termos do art. 475-J;
              Foi a maior de todas as alterações. O cumprimento das sentenças condenatórias em obrigação de fazer ou não fazer e de entrega de coisa continua sendo feito na forma dos arts. 461 e 461-A. Mas a lei modificou a execução das obrigações por quantia certa, e ao fazê-lo, acabou por transformar a própria estrutura do processo como um todo.
              Antes, uma ação com um pedido de cobrança, desde o ajuizamento da demanda até a satisfação da obrigação, poderia render até três processos distintos: o de conhecimento (de natureza cognitiva); o de liquidação (também de natureza cognitiva), caso o valor da condenação não fosse líquido;e o de execução. Em cada um deles - dada a sua autonomia – era preciso promover-se uma nova citação do réu. Havia  uma sentença, que punha fim ao processo de conhecimento; outra, ao processo de liquidação, e uma terceira, que encerrava o de execução.
d) 4º Momento – Lei nº 11.382/2006,  que alterou o processo de execução autônomo, que remanesce basicamente em relação aos títulos extrajudiciais (arts. 652 e segs. do CPC), cujos procedimentos são aplicáveis subsidiariamente no caso de SATISFAÇÃO DE TUTELA JURISDICIONAL (títulos judiciais).
              Antes dessas alterações, a regra para a SATISFAÇÃO DOS DIREITOS (tutelas jurisdicionais e título executivo extrajudiciais)  era o processo de execução autônomo. As exceções eram, por exemplo, ações de despejo e ações possessórias, para cuja execução não se exigia processo de execução.
              Hoje, a regra para a satisfação da TUTELA JURISDICIONAL é o cumprimento de sentença, ressalvadas algumas situações excepcionais, conforme previsto no art. 475-N, parágrafo único.
              Em suma, a execução hoje rege-se em dois formatos, ditados pelas Leis nº 11.232/05 e nº 11.382/06. A idéia do legislador foi proporcionar uma execução mais efetiva, já esta era tida como o grande problema de frustração do processo.

 
4  ESPÉCIES DE EXECUÇÃO (ATUAIS FORMAS DE EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS)
              O próprio CPC, no seu Livro II, sistematiza o processo de execução, tratando-o sob diversas modalidades. Disso, tomando como referência os variados aspectos da execução, a doutrina aponta as seguintes classificações:
4.1  Quanto ao procedimento OU natureza do título
POR FASE (cumprimento de sentença) ou POR PROCESSO AUTÔNOMO (execução propriamente dita)
4.1.1 Execução por fase (Processo sincrético, cumprimento de sentença) – alcança os títulos executivos judiciais, exceto no caso do parágrafo único do art. 475-N (títulos judiciais atípicos): a sentença penal condenatória; a sentença arbitral; e a sentença estrangeira homologado pelo STJ.
              A execução por fase alcança as sentenças que reconheçam as seguintes obrigações:
              - De fazer ou não fazer (art. 461);
              - De entregar coisa (art. 461-A); e
              - De pagar (art. 475-J)
4.1.2 Execução por processo (Processo autônomo) - é própria dos os títulos executivos extrajudiciais (art. 585), mas também alcança alguns títulos judiciais, tais como: as execuções contra a Fazenda. Pública (arts. 730 e 731); a execução de alimentos (arts. 732 e 735); e, excepcionalmente, os títulos judiciais atípicos (parágrafo único do art. 475-N).
Em face das alterações do CPC, a doutrina vem tratando como EXECUÇÃO apenas aquela efetuada por processo autônomo (Livro III do CPC, do art. 566 ao art. 795).
4.2  Quanto à natureza da prestação devida
4.2.1  No cumprimento de sentença, quanto à natureza da prestação, a execução pode ser:
              - De obrigação de fazer ou não fazer (art. 461);
              - De entregar coisa certa ou incerta (art. 461-A); e
              - De pagar (art. 475-J)
4.2.2  Na execução por processo, quanto à natureza da prestação, a execução pode ser:
a)  Execução de obrigação de dar (ou entregar)
         a.1) DAR COISA, que pode ser
certa (arts. 621 ao 628) e
incerta ou indeterminada (art. 629 ao 631).
         a.2) DAR DINHEIRO (ou execução por quantia certa), que pode ser:
- Execução por quantia certa contra devedor solvente (arts. 646 ao 724);
- Execução contra a Fazenda Pública (arts. 730 ao 731);
- Execução de prestação de alimentos (arts. 732 ao 735);
- Execução fiscal (Lei nº 6.830/80); e
- Execução por quantia certa contra devedor insolvente (arts. 748 ao 786-A).
b)  Execução de obrigação de FAZER (arts. 632 ao 638) e NÃO FAZER (arts. 642 e 643).

4.3  Quanto à eficácia do título executivo
              A execução, a rigor, é sempre definitiva. Contudo, tendo-se em mente o objetivo de satisfazer o direito do credor no mais curto prazo possível, desde logo já se executa o houver de incontroverso na execução, daí a classificação e DEFINITIVA e PROVISÓRIA.
              É definitiva quando não houver qualquer discussão pendente (integralidade ou parte da execução). Caso contrário, será provisória.
              Há distinção no procedimento, a depender de se tratar de execução por fase e por processo.
a)  Execução por fase (tem previsão no art. 475-I, § 1º). É definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo).
              A execução definitiva efetiva-se nos termos do art. 475-J, sendo processada nos próprios autos, e a provisória, nos termos do art. 485-O, sendo processada em autos suplementares, conforme dispõe o art. 475-O, § 3º.

b)  Execução por processo (regida pelo art. 587). A simples interposição de embargos à execução não induz à execução provisória. É preciso que o juiz lhe atribua efeito suspensivo.

4.4 Outras classificações
            As classificações acima descritas ganham outras formas e nomenclaturas, contudo, sempre esbarrando praticamente na mesma substância. Veja-se, por exemplo, o quadro abaixo, em que se toma como referência basicamente os mesmos elementos, surtindo o mesmo resultado:
CLASSIFICAÇÃO QUANTO À NATUREZA DA OBRIGAÇÃO
Obrigação de dar coisa
Execução de entrega de coisa certa
Execução de entrega de coisa incerta
Obrigação de fazer e não fazer
Execução de obrigação de fazer
Execução de obrigação de não fazer
Obrigação de pagar quantia certa
Obrigação de pagar quantia certa contra devedor solvente
 Obrigação de pagar quantia certa contra devedor insolvente
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TÍTULO EM QUE SE BASEIA
Títulos executivos judiciais (Art. 475-N, CPC)

Cumprimento de sentença “stricto sensu”
Sentença judicial que reconheça obrigação de fazer e não fazer (artigo 461, CPC)
Sentença judicial que reconheça obrigação de dar coisa (artigo 461-A, CPC)
Execução “sine
intervallo” (ou execução por fase - processo uno)
Sentença judicial que reconheça obrigação de pagar quantia;
Sentença judicial que reconheça
obrigação de pagar quantia (arts. 475-I e 475-J, CPC)
Execução por processo

Sentença penal condenatória; Sentença arbitral; Sentença estrangeira homologada pelo STF: depois de distribuída a petição inicial e citado o executado, aplica-se o procedimento da nova lei  (art. 475-I ao 475-R, CPC)[1]
Títulos executivos extrajudiciais (Art. 585, CPC)
EXECUÇÃO

Livro II, CPC/artigos 566 e segs., CPC
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO SEU CARÁTER
Execução definitiva
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, CPC
Fundada em título extrajudicial/sentença passada em julgado
Execução Provisória
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, par. 1º e 542, par. 2º, CPC
Artigo 475-O, CPC
Fundada em sentença pendente de recurso desprovido de efeito suspensivo (RE e REsp).
Corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exequente, que se responsabiliza a reparar os danos do executado, e exige caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos” (art. 475-O, I a III, CPC)







5  REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de. Aspectos polêmicos da nova execução. São Paulo: RT, 2006.
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito processual Civil. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 47 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
MEDINA, José Miguel Garcia. Processo Civil Moderno. Execução, 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.


[1] Segue, subsidiariamente, as mesmas regras da execução por título extrajudicial (CPC, art. 614).



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