Processo Civil


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Série “LIÇÕES DE SALA-DE-AULA
A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Teoria Geral - Parte 2
AS CONDIÇÕES DA AÇÃO E OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS NA EXECUÇÃO.
Clemilton da Silva Barros
1  INTRODUÇÃO
Parte da doutrina brasileira não aceita falar em condições da ação em se tratando de ação executiva[1], muitos entendendo que as condições da ação, bem como os pressupostos processuais são institutos exclusivos dos procedimentos cognitivos.
Contudo, o que e verifica em sede de avaliação preliminar é que toda espécie de ação tende a instalar um processo, movimentando assim diversos atores, tais como o réu ou devedor e o próprio Poder Jurisdicional, portanto, justificando-se, em qualquer espécie, o preenchimento de requisitos legais mínimos para se tornar juridicamente viável o exercício da ação.
Assim, estando a execução, seja por processo ou por fase, vinculada ao exercício do direito de ação, e considerando-se que o exercício desta prende-se à constante satisfação das suas condições, e certo de que qualquer espécie de processo necessita a todo tempo dos seus pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido, não parece haver sentido em se afastar as condições da ação e os pressupostos processuais do âmbito da execução, merecendo, portanto, o tema, uma apurada investigação, o que ora se propõe empreender.
2  AS CONDIÇÕES DA AÇÃO NA EXECUÇÃO
Aqueles que se põem contra a exigência das condições da ação na ação executiva sustentam que o próprio título executivo já equivale a tais condições. Ora, a ação de execução constitui prerrogativa legal do credor de movimentar o Estado-juiz para que este imponha a satisfação de um direito anteriormente reconhecido, seja mediante um título executivo judicial ou um título executivo extrajudicial.
Estamos, pois, falando de uma relação jurídica processual na qual o título executivo constitui apenas um instrumento que servirá para a devida aferição da viabilidade da demanda (condições da ação). É o que buscaremos demonstrar.
Primeiro importar observar que a relação jurídica processual sempre flui de uma relação de direito material[2]. Com isso, não é demais dizer que a relação processual está atrelada à relação de direito material, figurando as condições com uma ponte que une essas duas espécies de relações jurídicas.
Noutro giro, cada uma das condições da ação encontra-se associada a um dos elementos da demanda, que por sua vez derivam a partir dos elementos da demanda, estando a estes vinculados.
Os elementos da relação de direito material são três: o fato, o objeto e o sujeito. São estes três elementos que dão existência e forma a todas as relações jurídicas de direito material.
Dos referidos elementos da relação material, fluem os correspondentes elementos da relação processual: a causa de pedir, o pedido e as partes. Em se tratado de ação executiva, a causa de pedir corresponde ao inadimplemento do devedor; o pedido remete a uma execução de fazer ou não fazer, de entregar coisa ou de entregar dinheiro; e as partes são, via de regra, o credor e devedor.
Seja na ação de conhecimento, seja na ação de execução, as condições da ação fluem como meros reflexos dos três elementos da demanda, e com eles se entrelaçam, sendo também em número de três: interesse de agir, possibilidade jurídica do pedido e legitimidade das partes.
Note-se que do elemento material “fato” vem a “causa de pedir” (elemento da demanda) e desta vem o “interesse de agir” (condição da ação). Do mesmo modo, ao objeto (elemento da relação material) se vincula o pedido (elemento da demanda), que dá origem à possibilidade jurídica do pedido (condição da ação). E, por fim, do elemento “sujeito“ vem o elemento “partes”, de onde flui condição da ação “legitimidade das partes”.
Mas algo precisa ainda ser dito para se fechar a linha de raciocínio aqui desenvolvida. Para que não se pense que as coincidências, relações e vínculos aqui apontados se dão de forma espontânea e automática. Não é assim. Vale dizer, toda relação jurídica, seja de direito material ou processual, tem de conter os seus três elementos, ou então estará incompleta.
Ao ser exercido o direito de ação, os elementos da relação material se convertem em elementos da demanda, e para que tal exercício seja juridicamente viável, o magistrado ingressa no interior da cada um dos elementos da demanda para verificar se estes estão a se combinar com os elementos da relação de direito material. Portanto, as condições da ação entram em cena exatamente nesse momento de aferição dos elementos da demanda, os quais não podem desgarrar-se dos elementos da relação jurídica material.
Feitas essas digressões, resta claro, pois, que o título executivo não substitui as condições da ação. Justifica-as, na medida em que deve trazer em si todos os elementos de direito material a serem convertidos nos elementos da demanda, conversão essa aferida mediante a análise das condições da ação. Pelo que representa o título executivo no âmbito da relação jurídica material, constitui elemento fundamental na verificação da viabilidade da relação executiva, contudo, não se confunde com as condições da ação.
Enfim, o requerimento da tutela jurisdicional executiva está sujeito à aferição das necessárias condições para o exercício do direito de ação, quais sejam: a legitimidade de parte, a possibilidade jurídica do pedido e o interesse de agir.
2.1  Legitimidade para a execução.
Como no processo de conhecimento, deve-se cogitar sobre quem pode figurar no polo ativo e no polo passivo da demanda. Vale dizer, quem pode requerer a execução e contra quem se requer a execução, aferição essa efetuada a partir da “pertinência, em abstrato, entre os sujeitos da relação processual e os sujeitos da relação de direito material (legitimidade ordinária), ou pela autorização legal para que alguém litigue sobre direitos alheios em nome próprio (legitimidade extraordinária)”[3].
Não é demais dizer que essa analise só é viabilizada mediante o exame de alguns elementos do título executivo. É este que indicará quem é o credor e quem é o devedor da obrigação assumida, ou quem lhe poderá fazer as vezes.
2.1.1  Legitimidade ativa
Tem disciplinamento pelos artigos 566 ao 567 do CPC. Além do credor, o Ministério Público, o espólio, os herdeiros ou sucessores do credor, o cessionário e o sub-rogado também podem, em determinadas situações, figurar no pólo ativo da execução, conforme dispõe o CPC, daí sendo a legitimidade ativa classificada em:
a) Legitimidade ativa ordinária – o próprio credor do título executivo judicial ou extrajudicial é o legitimado ordinário, ou natural, para promover a execução, conforme dispõe o art. 566, I do CPC. Diz-se que há uma coincidência entre aquele que afirma um direito material e aquele a favor de quem correrá a demanda executiva, ou seja, a parte ativa material é a mesma parte ativa processual.
b) Legitimidade ativa extraordinária – ocorre quando o credor, por autorização expressa da Lei, cede lugar a quem não esteja propriamente vinculado ao título executivo. É o que se verifica nas hipóteses em que o Ministério Público (CPC, art. 81) ocupa o polo ativo da execução mesmo não sendo credor, no caso da Lei de Ação Civil Pública; na Lei de Improbidade Administrativa; na Lei da Ação Popular etc.
Art. 566. Podem promover a execução forçada:
(...).
II - o Ministério Público, nos casos prescritos em lei.
Ao contrário do que ocorre na legitimidade ordinária, na extraordinária há uma descoincidência entre a afirmação que se faz no plano processual e a titularidade no plano material, ou seja, distinguem-se a parte processual e a parte material.
c) Legitimidade derivada ou superveniente – ocorre quando, por circunstâncias outras, o credor é substituído no polo ativo da execução pelo espólio, pelos herdeiros, pelo cessionário, ou pelo sub-rogados, conforme dispõe o art. 567 do CPC. Confira-se:
Art. 567. Podem também promover a execução, ou nela prosseguir:
I - o espólio, os herdeiros ou os sucessores do credor, sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o direito resultante do título executivo;
II - o cessionário, quando o direito resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos;
III - o sub-rogado, nos casos de sub-rogação legal ou convencional.
Conquanto seja silente o CPC, a legitimação extraordinária também deve ser aplicada para os casos de dissolução e liquidação de pessoas jurídicas, hipóteses em que os sucessores passam a ser exequentes, assim identificados de acordo com as leis materiais.
2.1.2  Legitimidade Passiva
Tem disciplinamento pelo artigo 568 do CPC, que dispõe:
Art. 568. São sujeitos passivos na execução:
I - o devedor, reconhecido como tal no título executivo;
II - o espólio, os herdeiros ou os sucessores do devedor;
III - o novo devedor, que assumiu, com o consentimento do credor, a obrigação resultante do título executivo;
IV - o fiador judicial;
V - o responsável tributário, assim definido na legislação própria.
A legitimidade passiva na execução pode ser classificada em:
a) Legitimidade ordinária – quando a execução recai sobre a figura do próprio devedor ou responsável, ou seja, inclui-se também as figuras do fiador, do avalista e do responsável tributário, que não são propriamente devedores, mas apenas garantidores ou responsáveis pela dívida.
b) Legitimidade derivada ou superveniente – ocorre quando o devedor por alguma circunstância, é substituído no polo passivo da demanda executiva pelo herdeiro, pelo espólio, pelos cessionários, pelos sub-rogados etc.
Aqui também se incluem os casos de dissolução e liquidação de pessoas jurídicas, hipóteses em que passam os sucessores a posição de executado, assim identificados de acordo com as leis materiais.
2.1.3  A Pluralidade de partes e a intervenção de terceiros na execução
Na execução pode muito bem existir pluralidade de partes, seja no pólo ativo, seja no passivo. Portanto, poderá ocorrer a formação de litisconsórcios ativos, passivos ou mistos.
Contudo, não se admite intervenção de terceiros, isto porque a atividade jurisdicional executiva pressupõe o anterior reconhecimento do direito que integra o objeto da execução.
Importa observar que a atuação do terceiro interessado é sempre voltada para que o reconhecimento do direito lhe seja favorável, e como na execução já houve o reconhecimento do direito, não há mais que se falar no ingresso de um terceiro para atuar com tal objetivo.
A doutrina porém, admite a intervenção do assistente (simples ou litisconsorcial) quando houver alguma atividade de caráter cognitivo nos procedimentos executórios. É o que pode ocorrer com a figura do responsável pela dívida, o fiador, por exemplo, que poderá intervir no processo para tentar fazer valer o seu benefício de ordem.
2.2  O Interesse de agir
O interesse de agir surge da necessidade de se obter, por intermédio do processo, um pronunciamento, ou atitude, do órgão jurisdicional acerca do interesse substancial submetido à apreciação.
Caracteriza-se pelo binômio “necessidade-utilidade” e “adequação”. Vale dizer, não basta que se faça necessária e útil a atuação do Judiciário, tendo também que ser adequada a via procedimental eleita pelo autor.
Na execução, o interesse de agir flui, sobretudo, da disposição do art. 580, que prevê aquilo tratado por muitos doutrinadores como “requisitos” ou “pressupostos específicos da execução”, quais sejam, a existência de um título executivo e o inadimplemento do devedor.
Tais requisitos nada mais são do que uma das condições da ação executiva, qual seja, o interesse de agir. Com efeito, a posse do título executivo demonstra o interesse de agir na sua modalidade “interesse-adequação”, o que legitima o credor a eleger a via procedimental executiva. A ausência do título acarreta a carência da ação executiva.[4]
Já o “interesse-necessidade” encontra-se assentado na alegação de descumprimento da prestação pelo devedor, restando ao credor socorrer-se do Poder Judiciário, uma vez que não lhe é permitido resolver o conflito executivo pela via da autotutela.
Em suma, repousa, fundamentalmente, o interesse de agir na execução, seja ela sincrética ou por processo, na necessidade da intervenção do Estado diante do inadimplemento, pelo devedor, de uma obrigação encetada em título executivo, judicial ou extrajudicial.
Pode-se também identificar o interesse jurídico como condição da tutela jurisdicional executiva, nos termos dos arts. 581 e 582 do CPC, in verbis:
Art. 581. O credor não poderá iniciar a execução, ou nela prosseguir, se o devedor cumprir a obrigação; mas poderá recusar o recebimento da prestação, estabelecida no título executivo, se ela não corresponder ao direito ou à obrigação; caso em que requererá ao juiz a execução, ressalvado ao devedor o direito de embargá-la.
Art. 582. Em todos os casos em que é defeso a um contraente, antes de cumprida a sua obrigação, exigir o implemento da do outro, não se procederá à execução, se o devedor se propõe satisfazer a prestação, com meios considerados idôneos pelo juiz, mediante a execução da contraprestação pelo credor, e este, sem justo motivo, recusar a oferta.
Parágrafo único. O devedor poderá, entretanto, exonerar-se da obrigação, depositando em juízo a prestação ou a coisa; caso em que o juiz suspenderá a execução, não permitindo que o credor a receba, sem cumprir a contraprestação, que lhe tocar.
Ainda no tocante ao interesse-adequação, como dito, relacionado à existência do título executivo, também encontra-se caracterizada pelo vínculo entre a espécie de título executivo considerado e o respectivo procedimento adotado: para o título executivo judicial (art. 475-N do CPC), via de regra, a execução se procede por simples requerimento (processo sincrético), se executivo extrajudicial (art. 585 do CPC), o autor ingressará com uma petição inicial, iniciando-se um novo processo.
2.3  A Possibilidade Jurídica do pedido
Por possibilidade jurídica do pedido, em termos gerais, entende-se como a aptidão que o objeto da ação apresenta de, em tese, ser acolhido, caso se configurem como verdadeiras as razões aditadas pelo autor. Noutros termos, a tutela pretendida deve ser admitida pelo ordenamento jurídico, ainda que de forma não expressa e ainda que o autor não possua o direito substancial alegado.
Na execução não é diferente. Ao autor não é dado postular atos executórios ou objeto não amparados pelo ordenamento jurídico, a exemplo da penhora de bens da Fazenda Púbica e do pedido de entrega de coisa cuja circulação ou comercialização não seja admitida pelo ordenamento jurídico. Há também impossibilidade jurídica do pedido executório quando a causa de pedir não é juridicamente possível, ainda que o objeto em si seja possível, como ocorre com a cobrança de dívida de jogo.
Enfim, qualquer execução há de estar fundada em título executivo, e todo título executivo tem de estar previsto em Lei.
3 OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS NA EXECUÇÃO
Por pressuposto processual deve-se entender como a ausência, no processo, de qualquer dos elementos ou situação que a Lei exige estar presente; ou a presença quando a Lei exige estar ausente. Refletem, pois, os requisitos de validade do processo.
Com efeito, independentemente de se tratar de processo de conhecimento, de processo cautelar, ou do processo de execução, existem os pressupostos processuais subjetivos e objetivos.
3.1  Os pressupostos processuais subjetivos
Estão relacionados com os sujeitos do processo, considerando-se a trilateralidade da relação processual, que se desenvolve entre autor (exequente na execução), juiz (órgão jurisdicional investido de jurisdição e de competência para a causa) e réu (executado).
3.1.1  As partes na execução
No que toca especificamente às partes (exequente e executado), seja na execução sincrética, seja na execução por processo autônomo, estas têm de ser capazes para o processo ou estar legalmente representadas ou assistidas (CPC, arts. 7º e 8º). Também necessitam estar patrocinadas por advogado (a chamada capacidade postulatória), a menos que o próprio ordenamento jurídico dispense tal requisito[5].
3.1.2 A competência para apreciar a execução
Em se tratando de execução de titulo executivo judicial, nominado pelo Código como “cumprimento de sentença”, dispõe o art. 475-P do CPC que a execução efetuar-se-á:
a) perante os tribunais, nas causas de sua competência originária;
b) perante o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição, podendo o exequente optar pelo juízo do local onde se encontram bens sujeitos à expropriação ou pelo do atual domicílio do executado, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem; e
c) perante o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira.
Já em se tratando de execução fundada em título executivo extrajudicial, prevê o art. 576 do CPC que será processada perante o juízo competente, na conformidade do disposto no Livro I, Título IV, Capítulos II e III.
Vale dizer, na execução de título extrajudicial aplicam-se as mesmas regras de competência do processo de conhecimento, explicitando a jurisprudência do STJ o seguinte: a) deve-se observar o foro de eleição; b) não havendo foro de eleição, prevalece o local do pagamento; e c) não havendo um local específico, a competência será do foro de domicílio do executado.
Importa ainda destacar a competência em sede de precatório, que não se insere propriamente na atividade jurisdicional, mas administrativa, mediante a qual o Presidente do Tribunal administra o precatório, cabendo ao juízo da execução decidir sobre os incidentes processuais. A Súmula 311 do STJ traz a seguinte disposição: Os atos do presidente do tribunal que disponham sobre processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional.
3.2  Os pressupostos processuais objetivos
Os pressupostos processuais objetivos estão relacionados com o objeto do processo e com a forma dos atos processuais. Portanto, incluem-se entres os pressupostos objetivos, a forma procedimental adequada, a citação válida, a inexistência de litispendência e de coisa julgada etc.
Em se tratando de execução, além dos pressupostos processuais comuns, a doutrina destaca os chamados “pressupostos específicos da execução”, arrolados pelo art. 580 do CPC, quais sejam, a existência de título executivo e a alegação de inadimplemento do devedor[6], os quais entendemos enquadrar-se na categoria de condições da ação, conforme já destacado linhas atrás.
Fala-se ainda de pressupostos específicos, em relação ao titulo executivo, que deve conter uma obrigação certa (tem seus elementos - sujeito ativo/sujeito passivo/prestação) perfeitamente definidos, ou seja, sujeitos e objeto definidos; líquida ou quantificada (quando a obrigação de dar coisa fungível possui o seu quantum debeatur; e exigível (quando o seu cumprimento não estiver sujeito a termo ou condição).
4  CONCLUSÃO
Da análise aqui empreendida, ainda que breve, bem se pode concluir que, não sendo absoluto o direito de ação e sendo a execução produto ou consequência do exercício da ação[7], afigura-se imprescindível algum requisito para se exercer a execução, requisitos estes mínimos, mas capazes de evitar que qualquer credor em potencial escolha seu devedor e contra este possa iniciar uma execução que não contenha os mínimos elementos a fazê-la prosperar. Assim não sendo, tanto alguém poderá ser demando indevidamente quanto o Estado poder ser invocado em vão.
Do mesmo modo, desenvolvendo-se a execução sempre mediante um procedimento processual, e certo de que este jamais se separa dos seus pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido, outra não poderá ser a conclusão senão a de que toda execução depende da constante satisfação dos chamados pressupostos processuais.
Figura o título executivo não como um feixe de condições da ação ou pressupostos processuais, mas instrumento que expressa os necessários elementos de direito material a serem convertidos nos elementos da demanda, conversão essa aferida mediante a análise das condições da ação.
Enfim, seja a execução procedida mediante processo, seja de forma sincrética, o avanço dos atos processuais dependem da constante satisfação das condições da ação e dos pressupostos processuais, como ocorre no processo de conhecimento[8].
REFERÊNCIAS
ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 14ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito processual Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
KLIPPEL, Rodrigo e BASTOS, Antonio Adonias. Manual de Processo civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
WAMBIER, Luiz Rodrigues e TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.


[1] DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito processual Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 563.
[2] Segundo observa Arruda ALVIM, “toda ação é oriunda de fatos e que estes fatos, necessariamente, têm uma qualificação jurídica”. (ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 14ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 405).
[3] KLIPPEL, Rodrigo e BASTOS, Antonio Adonias. Manual de Processo civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.1086.
[4] DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 418).
[5] A exemplo da disposição da Lei nº 9.099, art. 9º, que dispensa o patrocínio por advogado nas causas de até 20 salários mínimos, no âmbito dos Juizados Especiais.
[6] DONIZETTI, op. cit., p. 570.
[7] Segundo WAMBIER e TALAMINI, como consequência direta da existência de regime geral comum para a atividade jurisdicional cognitiva e executiva, aplicam-se ao processo de execução e à fase de cumprimento de sentença as regras sobre pressupostos processuais e condições da ação, nos termos dos arts.  2º, 3º, 6º, 267 e 301 do CPC (WAMBIER, Luiz Rodrigues e TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p;. 64).
[8]

COMO CITAR ESTE TEXTO:
BARROS, Clemilton da Silva. As condições da ação e os pressupostos processuais na execução. Disponível em: http://www.juridicosetc.blogspot.com. Acesso em: dia/mês/ano.
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Série  "LIÇÕES DE SALA-DE-AULA"


A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
  Teoria Geral  - Parte I
Clemilton da Silva Barros

1  INTRODUÇÃO
            O objetivo do curso é demonstrar a importância da efetividade para o Direito Processual Moderno (fase instrumental), avaliando, neste contexto, a pertinência das últimas mudanças legislativas em sede de execução; sistematizar conceitualmente as diversas modalidades de execução, que serão estudadas no decorrer do curso; e fazer compreender a dualidade do regramento da execução (ou efetivação do direito), classificada esta tendo em vista a natureza do título em que se funda (título judicial ou extrajudicial)
            Importa inicialmente proceder-se a um estudo sistemático do Código de Processo Civil Brasileiro, tendo em mente a tutela jurisdicional postulada pela parte. O CPC tem a seguinte divisão:
Livro IProcesso de Conhecimento – busca estabelecer a certeza jurídica definindo a titularidade de um direito;
Livro IIProcesso de Execução – visa satisfazer (efetivar) um direito já devidamente definido;
Livro III – Processo Cautelar – visa garantir a efetividade de um processo principal (conhecimento ou execução) e não de um direito.
Livro IV – Procedimentos Especiais – para situações em que, via de regra, a tutela pretendida reclama o acertamento do direito, o acautelamento e a execução na mesma relação processual;
Livro V – Disposições Finais e Transitórias – Regula a vigência e a aplicação do Código. A sua entrada em vigor e o regramento das relações jurídicas pretéritas (direito intertemporal)
              O Código prevê três espécies de processos e um procedimento que conjuga características dos três processos.
              O processo de execução pode ser definido como a atividade estatal que tem por fim a realização prática do comando concreto derivado do direito objetivo (Cândido R. Dinamarco).
2  TUTELAS JURISDICIONAIS
            A partir da sistemática adotada pelo CPC e considerando-se o tipo de proteção pretendido, três podem ser as modalidades de tutelas jurisdicionais:
a)  tutela de certeza, ou de conhecimento, ou declaratória (o poder jurisdicional certifica, pela coisa julgada, determinada relação jurídica);
b)  tutela de efetivação ou executiva (efetiva direitos subjetivos); e
c)  tutela de segurança ou cautelar (providência que assegure a efetivação das duas anteriores)
              Nota-se que a tutela executiva é o fim último da atividade jurisdicional. Busca a satisfação ou realização de um direito já acertado ou definido em título judicial ou extrajudicial.
              Via de regra, a tutela executiva atua exclusivamente em favor do credor, diferente do que ocorre com as tutelas cognitivas e cautelares. Não atua, porém, sobre a pessoa do devedor, mas sobre o seu patrimônio.
3 EVOLUÇÃO DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS (ESPÉCIES DE EXECUÇÃO)
              No sistema originário do CPC não havia distinções relevantes entre a execução por título judicial e extrajudicial. O Livro II tratava, de forma indistinta, de ambas.
              A sistemática adotada no texto original do atual CPC (de 1973), herdada do CPC de 1.939, utilizava um processo para conhecer o direito e outro para efetivá-lo.
              Isto, porém, ia de encontro à celeridade e efetividade do Processo, o que ensejou a deflagração de várias reformas no sistema de execução do CPC, instalando-se o chamado processo sincrético como regra e o processo autônomo como exceção.
              Essas reformas podem ser assim resumidas:
a) 1º Momento - Lei nº 8.952/1994, que reescreveu o art. 461, para tratar do cumprimento das obrigações de fazer ou não fazer;
              De acordo com o art. 461 e seus parágrafos, quando julgado procedente o pedido de obrigações de fazer ou não fazer, o juiz expede uma ordem ao devedor. Se ele não a atende, desnecessário processo autônomo de execução. Basta que se postule as providências previstas nos §§ 4º, 5º e 6º do art. 461 para efetivar a determinação judicial.
b) 2º Momento – Lei nº 10.444/2002, que introduziu o art. 461-A, para tratar do cumprimento das obrigações de entrega de coisa;
              Antes, o devedor era citado para promover a entrega, sob pena de busca e apreensão ou imissão de posse, conforme o bem fosse móvel ou imóvel. Com as alterações acrescentadas pela Lei nº 10.444/02, a sentença que condena à entrega de coisa é mandamental, e dispensa posterior processo de execução.
              De acordo com o § 2º do art. 461-A, "não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel". O processo de execução para entrega de coisa, tratado no Livro da Execução, ficou reservado apenas para aquelas obrigações fundadas em título extrajudicial.
c) 3º Momento – Lei nº 11.232/2005, que estendeu o processo sincrético em relação ao cumprimento das obrigações de pagar quantia certa (obrigação de pagar dinheiro, fundada em título judicial, exceto contra a fazenda pública), nos termos do art. 475-J;
              Foi a maior de todas as alterações. O cumprimento das sentenças condenatórias em obrigação de fazer ou não fazer e de entrega de coisa continua sendo feito na forma dos arts. 461 e 461-A. Mas a lei modificou a execução das obrigações por quantia certa, e ao fazê-lo, acabou por transformar a própria estrutura do processo como um todo.
              Antes, uma ação com um pedido de cobrança, desde o ajuizamento da demanda até a satisfação da obrigação, poderia render até três processos distintos: o de conhecimento (de natureza cognitiva); o de liquidação (também de natureza cognitiva), caso o valor da condenação não fosse líquido;e o de execução. Em cada um deles - dada a sua autonomia – era preciso promover-se uma nova citação do réu. Havia  uma sentença, que punha fim ao processo de conhecimento; outra, ao processo de liquidação, e uma terceira, que encerrava o de execução.
d) 4º Momento – Lei nº 11.382/2006,  que alterou o processo de execução autônomo, que remanesce basicamente em relação aos títulos extrajudiciais (arts. 652 e segs. do CPC), cujos procedimentos são aplicáveis subsidiariamente no caso de SATISFAÇÃO DE TUTELA JURISDICIONAL (títulos judiciais).
              Antes dessas alterações, a regra para a SATISFAÇÃO DOS DIREITOS (tutelas jurisdicionais e título executivo extrajudiciais)  era o processo de execução autônomo. As exceções eram, por exemplo, ações de despejo e ações possessórias, para cuja execução não se exigia processo de execução.
              Hoje, a regra para a satisfação da TUTELA JURISDICIONAL é o cumprimento de sentença, ressalvadas algumas situações excepcionais, conforme previsto no art. 475-N, parágrafo único.
              Em suma, a execução hoje rege-se em dois formatos, ditados pelas Leis nº 11.232/05 e nº 11.382/06. A idéia do legislador foi proporcionar uma execução mais efetiva, já esta era tida como o grande problema de frustração do processo.
 
4  ESPÉCIES DE EXECUÇÃO (ATUAIS FORMAS DE EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS)
              O próprio CPC, no seu Livro II, sistematiza o processo de execução, tratando-o sob diversas modalidades. Disso, tomando como referência os variados aspectos da execução, a doutrina aponta as seguintes classificações:
4.1  Quanto ao procedimento OU natureza do título
POR FASE (cumprimento de sentença) ou POR PROCESSO AUTÔNOMO (execução propriamente dita)
4.1.1 Execução por fase (Processo sincrético, cumprimento de sentença) – alcança os títulos executivos judiciais, exceto no caso do parágrafo único do art. 475-N (títulos judiciais atípicos): a sentença penal condenatória; a sentença arbitral; e a sentença estrangeira homologado pelo STJ.
              A execução por fase alcança as sentenças que reconheçam as seguintes obrigações:
              - De fazer ou não fazer (art. 461);
              - De entregar coisa (art. 461-A); e
              - De pagar (art. 475-J)
4.1.2 Execução por processo (Processo autônomo) - é própria dos os títulos executivos extrajudiciais (art. 585), mas também alcança alguns títulos judiciais, tais como: as execuções contra a Fazenda. Pública (arts. 730 e 731); a execução de alimentos (arts. 732 e 735); e, excepcionalmente, os títulos judiciais atípicos (parágrafo único do art. 475-N).
Em face das alterações do CPC, a doutrina vem tratando como EXECUÇÃO apenas aquela efetuada por processo autônomo (Livro III do CPC, do art. 566 ao art. 795).
4.2  Quanto à natureza da prestação devida
4.2.1  No cumprimento de sentença, quanto à natureza da prestação, a execução pode ser:
              - De obrigação de fazer ou não fazer (art. 461);
              - De entregar coisa certa ou incerta (art. 461-A); e
              - De pagar (art. 475-J)
4.2.2  Na execução por processo, quanto à natureza da prestação, a execução pode ser:
a)  Execução de obrigação de dar (ou entregar)
         a.1) DAR COISA, que pode ser
certa (arts. 621 ao 628) e
incerta ou indeterminada (art. 629 ao 631).
         a.2) DAR DINHEIRO (ou execução por quantia certa), que pode ser:
- Execução por quantia certa contra devedor solvente (arts. 646 ao 724);
- Execução contra a Fazenda Pública (arts. 730 ao 731);
- Execução de prestação de alimentos (arts. 732 ao 735);
- Execução fiscal (Lei nº 6.830/80); e
- Execução por quantia certa contra devedor insolvente (arts. 748 ao 786-A).
b)  Execução de obrigação de FAZER (arts. 632 ao 638) e NÃO FAZER (arts. 642 e 643).
4.3  Quanto à eficácia do título executivo
              A execução, a rigor, é sempre definitiva. Contudo, tendo-se em mente o objetivo de satisfazer o direito do credor no mais curto prazo possível, desde logo já se executa o houver de incontroverso na execução, daí a classificação e DEFINITIVA e PROVISÓRIA.
              É definitiva quando não houver qualquer discussão pendente (integralidade ou parte da execução). Caso contrário, será provisória.
              Há distinção no procedimento, a depender de se tratar de execução por fase e por processo.
a)  Execução por fase (tem previsão no art. 475-I, § 1º). É definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo).
              A execução definitiva efetiva-se nos termos do art. 475-J, sendo processada nos próprios autos, e a provisória, nos termos do art. 485-O, sendo processada em autos suplementares, conforme dispõe o art. 475-O, § 3º.
b)  Execução por processo (regida pelo art. 587). A simples interposição de embargos à execução não induz à execução provisória. É preciso que o juiz lhe atribua efeito suspensivo.
4.4 Outras classificações
            As classificações acima descritas ganham outras formas e nomenclaturas, contudo, sempre esbarrando praticamente na mesma substância. Veja-se, por exemplo, o quadro abaixo, em que se toma como referência basicamente os mesmos elementos, surtindo o mesmo resultado:
CLASSIFICAÇÃO QUANTO À NATUREZA DA OBRIGAÇÃO
Obrigação de dar coisa
Execução de entrega de coisa certa
Execução de entrega de coisa incerta
Obrigação de fazer e não fazer
Execução de obrigação de fazer
Execução de obrigação de não fazer
Obrigação de pagar quantia certa
Obrigação de pagar quantia certa contra devedor solvente
 Obrigação de pagar quantia certa contra devedor insolvente
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TÍTULO EM QUE SE BASEIA
Títulos executivos judiciais (Art. 475-N, CPC)
Cumprimento de sentença “stricto sensu”
Sentença judicial que reconheça obrigação de fazer e não fazer (artigo 461, CPC)
Sentença judicial que reconheça obrigação de dar coisa (artigo 461-A, CPC)
Execução “sine
intervallo” (ou execução por fase - processo uno)
Sentença judicial que reconheça obrigação de pagar quantia;
Sentença judicial que reconheça
obrigação de pagar quantia (arts. 475-I e 475-J, CPC)
Execução por processo
Sentença penal condenatória; Sentença arbitral; Sentença estrangeira homologada pelo STF: depois de distribuída a petição inicial e citado o executado, aplica-se o procedimento da nova lei  (art. 475-I ao 475-R, CPC)[1]
Títulos executivos extrajudiciais (Art. 585, CPC)
EXECUÇÃO
Livro II, CPC/artigos 566 e segs., CPC
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO SEU CARÁTER
Execução definitiva
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, CPC
Fundada em título extrajudicial/sentença passada em julgado
Execução Provisória
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, par. 1º e 542, par. 2º, CPC
Artigo 475-O, CPC
Fundada em sentença pendente de recurso desprovido de efeito suspensivo (RE e REsp).
Corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exequente, que se responsabiliza a reparar os danos do executado, e exige caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos” (art. 475-O, I a III, CPC)






5  REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de. Aspectos polêmicos da nova execução. São Paulo: RT, 2006.
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito processual Civil. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 47 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
MEDINA, José Miguel Garcia. Processo Civil Moderno. Execução, 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.


[1] Segue, subsidiariamente, as mesmas regras da execução por título extrajudicial (CPC, art. 614).


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TEMAS PARA MONOGRAFIA EM MATÉRIA DE EXECUÇÃO CÍVEL

ARTIGOS JURÍDICOS, TCC, MONOGRAFIAS EM GERAL E TESES.

A maior preocupação de todo graduando, sobretudo nos dois últimos semestres que antecedem a formatura, é sem dúvida  o tão famoso Trabalho de Conclusão do Curso – TCC. No caso do Curso de Direito, essa preocupação supera até mesmo o Exame da OAB, tido como “bicho papão” de todo graduando. Todo esse desconforto psicológico tem início a partir da escolha e definição do tema.
A propósito, operando como professor de graduação do Curso de Direito, bem com em pós-graduação, não raro sou interrompido no meio da aula para responder a questionamentos atinentes a tema do TCC. Também recebo inúmeras solicitações de sugestão de temas, tanto por e-mail quanto por telefone.
Pois bem, foi pensando nessa questão que selecionei vários temas em diversas matérias, que passarei a postar aqui neste espaço no intento de auxiliar a quem deles quiserem se servir. Tais temas se encaixam bem tanto para o TCC quanto para qualquer monografia, dissertação ou tese, inclusive, para prova dissertativa de concuros públicos e de Exame da OAB, cabendo observar que alguns dos temas aqui postados foram extraídos exatamente de provas realizadas e de Exame da OAB.
Iniciarei postando alguns temas voltados mais propriamente para a Execução no Processo Civil Brasileiro. Logo mais estarei postando outros temas, de matérias diversas, tais como Direito Previdenciário, Direito Constitucional, Direito do Trabalho, Direito Ambiental, Direito Administrativo etc.
A cada tema proposto, tentarei expressar alguma orientação no sentido de apontar os objetivos a serem alcançados com a pesquisa, deixando a cargo de cada um o progresso desses objetivos.
Desta vez selecionamos sete temas, quais sejam:
1. AS IMPLICAÇÕES DAS REFORMAS NO PROCESSO DE EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
O aluno procederá a uma pesquisa nos próprios juizados especiais para verificar o que as reformas trouxeram de positivo ou negativo.
2. A EXECUÇÃO CÍVEL NOS JUIZADOS ESPECIAIS
Do mesmo modo, seria elaborada pesquisa nos próprios juizados especiais para verificar como se dão as execuções de cada umas das diversas espécies de obrigações nos juizados especiais cíveis.
3.   A IMPORTÂNCIA PRÁTICA DOS PROVIMENTOS MANDAMENTAIS NO SISTEMA PROCESSUAL BRASILEIRO
Buscar-se-á avaliar a questão do cumprimento imediato da decisão judicial, com a previsão de mecanismos de coerção indireta, como a multa diária por descumprimento.
4. OS EFEITOS PRÁTICOS DA UNIFICAÇÃO DAS FASES DE CONHECIMENTO E EXECUÇÃO EFETUADA PELA ÚLTIMAS REFORMAS DO CPC
Conforme se sabe, a execução de títulos executivos judiciais, via de regra, deixou de ser um processo autônomo, passando a ser mais uma fase  procedimental denominada cumprimento de sentença. Além do requerimento do autor, a execução também pode ser iniciada pelo próprio órgão jurisdicional ex officio, dispensando-se, em ambos os casos, a nova citação do réu. No que isso melhorou em termos de efetividade do processo?
5. A POSSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO DO BEM POR INICIATIVA PARTICULAR, INTRODUZIDA PELA LEI N° 11.382/2006: EFEITOS PRÁTICOS. VANTAGENS E DESVANTAGENS
Aqui se fará um estudo acerca do novo instituto, ALIENAÇÃO DO BEM POR INICIATIVA PARTICULAR, evidenciando quais as suas vantagens e desvantagens para a efetividade do processo. Também poderão ser evidenciados os obstáculos enfrentados no campo prático para a realização do procedimento, sugerindo-se aos magistrados e ao próprio legislador opções de melhoramento do instituto.
6. INVERSÃO DA PRIORIDADE EM RELÇAO AOS ATOS EXPROPRIATÓRIOS, NOS TERMOS DA LEI N. 11.382/2006:  CONSEQUÊNCIAS EM TERMOS DE EFETIVIDADE DO PROCESSO
A ideia aqui é, a partir da identificação do motivo que levou o legislador a alterar a sequência de prioridades dos atos executivos anteriormente estabelecida, na qual o leilão ou praça figuravam num plano prioritário como primeira opção do exequente, seguida da adjudicação até se chegar ao usufruto de imóvel ou empresa. 
Atualmente, se o exequente não tem interesse em adjudicar o bem, poderá proceder à alienação particular, ficando o leilão ou praça como última opção. No que isso melhor para a efetividade da prestação jurisdicional?
7. EFEITO PRÁTICO DA MULTA DE 10% (DEZ POR CENTO), PREVISTA NO ART. 475-J, DO CPC, IMPOSTA AO DEVEDOR QUE NÃO EFETUAR O PAGAMENTO NO PRAZO DE 15 DIAS.
A ideia aqui é avaliar se a referida multa traz alguma contribuição para afastar a inadimplência do devedor. Para tanto, faz se necessário um estudo acerca de tal multa, envolvendo a sua natureza jurídica; o seu montante de 10%, quando comparado à remuneração de capital atualmente praticada pelo mercado financeiro, a exemplo da poupança, que varia em torno de meio por cento; bem como a busca de dados estatísticos na comarca local, ou em determinado juízo, acerca do índice de inadimplência dos devedores, comparando-se com a situação existente antes da nova regra.

Boa sorte!

quarta-feira, 16 de maio de 2012





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CONSIDERAÇÕES PROGNÓSTICAS DO REEXAME NECESSÁRIO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO


Clemilton da Silva Barros

Resumo: O texto remete a um breve histórico da remessa necessária, apontando as diversas normas que a prevê no nosso ordenamento jurídico, além do art. 475 do Código de Processo Civil, com uma abordagem das suas principais características e natureza jurídica, desaguando na velha polêmica estabelecida em torno do princípio da “non reformatio in pejus”, no que defende o autor a impossibilidade de agravamento da situação do ente público em sede de remessa necessária, especialmente por força do princípio da adstrição ou da congruência (arts. 128 e 460 do CPC), sempre evidenciando o entendimento expressado no âmbito da doutrina e da jurisprudência.

Palavra-chave: Fazenda Pública; remessa necessária; non reformatio in pejus; interesse público.

Sumário: 1 Introdução; 2 Evolução histórica; 3 Denominações; 4 Natureza jurídica; 4.1 A remessa obrigatória e as espécies recursais; 4.1.1 O aspecto da voluntariedade dos recursos; 4.1.2 Os pressupostos recursais; 4.1.3 A reapreciação da matéria e os efeitos suspensivo e devolutivo; 4.1.4 Legitimidade para a remessa necessária; 4.1.5 Os princípios recursais; 4.1.6 A remessa necessária como condição de validade e de eficácia da sentença; 5 O objeto do reexame necessário e as suas hipóteses de cabimento; 5.1 O art. 475 do CPC  após as alterações da lei 10.352/01; 5.2 Outras hipóteses de remessa necessária; 6 A remessa necessária no contexto das reformas das decisões judiciais; 6.1 O princípio da non reformatio in pejus; 6.2 O princípio da non reformatio in pejus e a remessa necessária; 7 Conclusão;  8 Referências.

1  INTRODUÇÃO

Predomina entre nós a regra segundo a qual, esgotados os recursos possíveis, ou decorrido o prazo de sua interposição, as decisões judiciais fazem coisa julgada, e aí se tornam imutáveis. Aliás, essa é a mais típica das características da jurisdição. E uma vez transitada em julgado, a decisão judicial passa a produzir plenamente seus efeitos.
Mas a essa regra, ou regras, o ordenamento jurídico opõe algumas exceções. A ação rescisória, por exemplo, observado o prazo decadencial de dois anos, tem o condão de revolver a matéria, embora já estando sob o manto da coisa julgada.
Uma outra exceção emerge do art. 475 do CPC, o qual relaciona nos seus incisos I e II situações em que a sentença, conquanto já decorrido o prazo de interposição do competente recurso, não alcança o trânsito em julgado, e não produzirá efeito algum antes de ser reapreciada pelo Tribunal, situação que caracteriza o chamado duplo grau obrigatório de jurisdição,  nominado pela doutrina de “remessa obrigatória” ou simplesmente “reexame necessário”, só alcançando as sentenças, na forma do art. 162, § 1º, do CPC, nunca as decisões interlocutórias.
Tal fenômeno era chamado de “apelação de ofício” pelo Código de Processo Civil de 1939, consistindo em condição de eficácia da sentença, que não fará coisa julgada antes de reexaminada pelo Tribunal. Ou seja, a qualquer tempo a matéria poderá ser revolvida, e se vier a ser satisfeitos os termos da sentença sem a apreciação do órgão revisor, essa satisfação estará eivada de vício insanável.
Conforme veremos, há ainda muita controvérsia envolvendo alguns aspectos do reexame necessário, sobretudo no tocante à sua natureza jurídica, alguns doutrinadores entendendo tratar-se de uma espécie recursal, o que é combatido por outros. Desse questionamento vem a indagação, se os seus efeitos estão restritos a beneficiar a Fazenda Pública ou se a qualquer das partes. Indagação esta que constitui o objeto nuclear deste estudo, na medida em que, na hipótese de o Tribunal vir a agravar a situação da Fazenda Pública pela via da remessa necessária, para uns estaria caracterizada a reformatio in pejus, o que seria vedado pelo ordenamento processual vigente. Outros, ao contrário, entendem perfeitamente possível tal agravamento.
Tecidas essas considerações, passaremos à análise do reexame necessário, seu disciplinamento em nosso ordenamento jurídico, evolução históricas, natureza jurídica, terminologia e a possibilidade de aplicação do princípio non reformatio in pejus, no que também buscaremos os apontamentos da doutrina e da jurisprudência sobre o tema.

2  EVOLUÇÃO HISTÓRICA
O instituto do reexame obrigatório adotado por nosso ordenamento jurídico tem suas origens encravadas no Direito Lusitano, datada, a lei que o criou, de 12 de março de 1355.
Num primeiro momento a sua aplicação se restringiu ao ambiente das questões processuais penais, com a finalidade de conter eventuais excessos da parte dos magistrados quando do julgamento de matéria criminal. Logo mais, com esses mesmos fins, integraria as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, então chamado de “apelação ex officio”.
No Brasil, conforme anota Jorge Tosta (2001, p. 12), a primeira norma jurídica a consagrar o referido instituto é datada de 04/10/1831 (Lei nº 04/1831, art. 90), impondo ao juiz a obrigação de apelar nas causas em que restasse vencida a Fazenda Pública. Nesse momento histórico, ao recorrer de ofício, o juiz operava efetivamente na defesa dos interesses da Fazenda Pública, assemelhando-se a uma espécie de causídico desta, e o que se buscava objetivamente era a reforma do julgado, e não a sua simples revisão pelo Tribunal no sentido de aperfeiçoamento da sentença, como é hoje.
Mais de um século depois de introduzido no ordenamento jurídico brasileiro,  reexame obrigatório integraria o nosso primeiro grande diploma de normas procedimentais, o Código de Processo Civil de 1939. Trinta anos depois, o Decreto-Lei nº 779/1969 disciplinaria a sua aplicação também no âmbito do Processo do Trabalho.
O Código de Processo Civil de 1939 assim dispunha:
Art. 822 – A apelação necessária ou ex officio será interposta pelo juiz mediante simples declaração na própria sentença.
Parágrafo único. Haverá apelação necessária:
I – Das sentenças que declararam a nulidade de casamento.
II – Das que homologam o desquite amigável.
III – Das proferidas contra a União, o Estado ou o Município.
Não é difícil notar a realidade social insculpida no texto revogado, sob a histórica preponderância do princípio inquisitório, e a importância do poder religioso, chegando este a se confundir com o próprio poder estatal. A previsão era nitidamente autoritária, deixando os direitos dos cidadãos comuns em posição infinitamente inferior, revelando um total desprezo aos princípios do contraditório, da isonomia e do devido processo legal.
Daí em diante, como bem noticia Samir José Caetano Martins[1], diversas leis extravagantes trouxeram disposições semelhantes, sempre associadas à tutela do erário, citando a Lei nº 2.664, de 03/12/1955, que dispõe sobre ações judiciais decorrentes de atos das Mesas das Câmaras do Congresso Nacional e da Presidência dos Tribunais Federais; a Lei nº 6.014, de 27/12/1973, que inseriu a previsão do duplo grau obrigatório na Lei nº 1.533, de 31/12/1951 (Lei do Mandado de Segurança) e na Lei nº 4.717, de 29/07/1965 (Lei da Ação Popular); a Lei nº 6.071, de 03/07/1974, que inseriu a previsão do duplo grau obrigatório no Decreto-Lei nº 3.365, de 21/07/1941 (Lei Geral das Desapropriações) e a Lei nº 8.437, de 30/06/1992 (que dispõe sobre medidas cautelares contra atos do Poder Público). Em 17 de abril de 1963, pelo Decreto nº 3.069, tal instituto viria a se estender também às causas matrimoniais.
O legislador de 1973, seguindo de perto a evolução político-social e atentando para uma linguagem tecnicamente mais satisfatória aos intentos jurídicos, reeditou o instituto do “reexame necessário” ou “remessa oficial”, também conhecida por “remessa necessária” e “duplo grau de jurisdição obrigatório”, outrora “recurso de ofício” ou “apelação de ofício”. O fato é que com o novo Código de Processo Civil o instituto em destaque ganhou feições bem mais apropriadas aos preceitos processuais antes ignorados.
Com efeito, no texto original do Código de 1973 ainda figurou a previsão do reexame necessário de sentença que anulasse casamento (art. 475, I), expressando a manutenção da influência do poder religioso. Mas a revisão produzida pela Lei nº 10.352, de 26/12/2001, tal excluiu tal previsão, no que o legislador também teve o cuidado de estabelecer situações limitadoras, como consta do atual texto:
Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público; (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI). (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)
§ 2o Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)
§ 3o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
Vê-se que é notável a evolução, a começar pelo abandono à antiga terminologia.

3  DENOMINAÇÕES

Como declinado, muitas denominações têm sido atribuídas ao instituto do reexame necessário, ora sendo chamado de remessa obrigatória, ora de remessa oficial, remessa necessária, recurso de ofício (ou ex officio), apelação de ofício, e ainda de duplo grau de jurisdição obrigatório.
Todas essas expressões buscam apenas traduzir o modo como o instituto se lança concretamente no mundo jurídico, alcançando as hipóteses a que se destina, por norma revestida de imperatividade absoluta, tendo em vista o interesse público, obrigando o juiz a submeter seu entendimento singular à avaliação de um entendimento colegiado, buscando amparar não exatamente o indivíduo, mas o interesse de toda a sociedade, concretizado na prestação jurisdicional que venha a conter o maior grau de correção possível.
Até mesmo por força de hábito, todas essas denominações ainda são bastante utilizadas.  E embora algumas se afigurem impróprias, em face do atual tratamento normativo, doutrinário e jurisprudencial, não há no meio jurídico quem desconheça qualquer delas. Entretanto, como estamos a falar de um instituto jurídico, portanto, inserto no âmbito de uma ciência, impõe que sejamos o mais didático e objetivo possível, embora nunca descuidando do cunho científico, eis que no estudo de qualquer ciência os nomes das coisas, sobretudo dos seus institutos, têm sempre fundamental relevo.
Com efeito, os institutos tanto devem ter um nome específico, quanto esse nome deve se situar o mais próximo possível da sua natureza e do seu objeto. Nesse diapasão, desde logo afastaremos as expressões “recurso de ofício” (ou ex officio) e  “apelação de ofício”, como assim já procedeu o Legislador de 1973, abrindo mão das terminologias adotadas pelo Código anterior.
Bom ressaltar que o Código de Processo Civil de 1973 não atribuiu denominação alguma ao instituto em comento, limitando-se a descrever as suas hipóteses de incidência, conforme se nota pela disposição do art. 475, cuja atual redação é fruto da Lei nº 10.352, de 26/12/2001. Por outro lado, também não acolheu a terminologia adotada pelo Código revogado (apelação ex officio). Diante disso, a doutrina já foi quem se incumbiu de lhe atribuir nomes, ora chamando-o de reexame necessário, ora de remessa necessária e ainda de reexame obrigatório, denominações estas que expressam o mesmo grau de significância, adequando-se perfeitamente ao seu objeto, à sua natureza jurídica e ao seu conteúdo.
Reexame necessário parece-nos a expressão mais conveniente, inclusive, sendo a mais preferida da doutrina e da jurisprudência.

 

4   NATUREZA JURÍDICA

A definição da natureza de um dado instituto inicia-se com a tentativa de sua identificação perante os demais institutos que lhes são similares, considerando o seu universo científico. Nisto, parte-se de um procedimento de simples comparação, individualizando-o e detectando suas particularidades e características mais singularizadas, até se saber em que ramo ou sub-ramo da ciência ele se insere e a que regras se submete. Consiste, portanto, tal procedimento em se definir a real posição do instituto considerado dentro de um sistema, categorizando-o, identificando seu endereçamento no universo em que se encontra, tudo, em face do seu conteúdo e  das suas características.
Sendo assim, o universo dos institutos jurídicos que poderíamos dizer similares ao reexame necessário é aquele no qual se encontram os recursos. Aliás, a primeira idéia que se tem acerca do reexame necessário é a de que se trata de uma espécie recursal. E isto é inevitável, haja vista o tradicional tratamento dado ao referido instituto pelo ordenamento jurídico brasileiro, bem assim pelo seu próprio objeto, consistente na reanálise do julgado pelo órgão revisor, objeto este muito peculiar aos dos recursos.
É de se lembrar que no Código de Processo Civil de 1939 o reexame necessário foi disciplinado com feições de recurso, inclusive, figurando naquele Código entre as espécies recursais (art. 822) e com nome de recurso (apelação ex officio), o que lhe rendeu muitas críticas durante toda a sua vigência.
Atento a esse equívoco teórico-legislativo, como já ressaltado, o legislador de 1973 procedeu às devidas retificações, não somente alterando a terminologia do instituto em comento, mas também a sua localização no contexto do novo Código, inscrevendo-o no Título VIII, distinto, portanto, daquele destinado a tratar dos recursos (Título X).

4.1  A remessa obrigatória e as espécies recursais
Conforme vimos, o novo CPC caminhou no sentido de exterminar a controvérsia que girava em torno da natureza jurídica da remessa oficial, porquanto, dentre os muitos reclames da doutrina, os mais comoventes acentuavam faltarem-lhe os requisitos próprios dos recursos, que os tornam os verdadeiros instrumentos de impugnação das decisões judiciais adotados pelo nosso ordenamento jurídico. Não afastou de todo as controvérsias, mas admitamos que amenizou sobremaneira os debates e as críticas.

4.1.1   O aspecto da voluntariedade dos recursos ausente na remessa necessária
A bem da verdade, a nova disposição legal sobre já seria mais do que suficiente para privar do reexame necessário a idéia de similaridade com as espécies recursais. Basta a simples observância da sistemática adotada pelo legislador de 1973 para concluir-se que foi clara a intenção de distanciá-lo dos recursos em geral, inscrevendo-os em Títulos distintos. Todavia, há ainda quem defenda tratar-se de uma autêntica espécie de recurso.
Pela simples definição de “recursos” não é fácil de se delimitar a exata distinção entre estes e o reexame necessário. Isto porque todos têm basicamente o mesmo alcance prático, encampando também o mesmo conteúdo teórico.  
A doutrina expressa diversos definições para os recursos. Uns os definem como remédios processuais postos pela lei à disposição das partes, do Ministério Público ou de terceiros, submetendo a decisão judicial a um novo julgamento por órgão judicial hierarquicamente superior àquele que a proferiu.
Frederico Marques (2003,  p. 381), por exemplo, ao definir recurso, pontifica:
Um procedimento que se forma para que seja revisto pronunciamento jurisdicional contido em sentença, decisão interlocutória ou acórdão. O mencionado autor prossegue (ob. cit.  p. 387),  expressando que se trata de um “quase-recurso”, inclusive, com efeito devolutivo e efeito suspensivo e, em relação ao julgamento nele proferido, aplicam-se as regras concernentes à apelação, pois se trata de remédio destinado a rever sentenças de primeira instância. Por isso mesmo, o vencido, ainda que não tenha interposto apelação voluntária, pode entrar com embargos infringentes, se for o caso.
Para Humberto Theodoro Júnior (1992, p. 542), na sua acepção técnica e restrita, o recurso é um “meio ou poder de provocar o reexame de uma decisão, pela mesma autoridade judiciária, ou por outra hierarquicamente superior, visando obter a sua reforma ou modificação, ou apenas a sua invalidação”.
Alexandre Freitas Câmara (2007, p. 55), citando Babosa Moreira, acentua que recurso é “o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo,  a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão judicial que se impugna”.
Da análise de todas essas citações podemos destacar, sobretudo, que os recursos são movidos pela interesse da parte, daí a consagração da alcunha  “remédio voluntário”, o que, efetivamente não se observa em relação ao reexame necessário.
Na verdade, a doutrinária é amplamente majoritária no sentido de negar natureza recursal ao reexame necessário, no que se citamos Nelson Nery Júnior e Rosa Nery (2003, p. 813), para quem a natureza jurídica do referido instituto é de “condição de eficácia da sentença que, embora existente e válida, somente produzirá efeitos depois de confirmada pelo Tribunal”.

4.1.2   Os pressupostos recursais
Bom, nessa idéia de distinção, é importante invocar os chamados requisitos de admissibilidade dos recursos (alguns preferem pressupostos recursais) para que se dê o provimento jurisdicional, indispensáveis, pois, aos recursos e ausentes no reexame necessário. Tais requisitos (ou pressupostos) são classificados em intrínsecos e extrínsecos.
Os primeiros operam como prolongamento das condições da ação, tendo em vista que o direito de recorrer se traduz em expressa manifestação do direito de ação. Os pressupostos intrínsecos, portanto, estão relacionados com o cabimento do recurso, a legitimação das partes e com interesse de agir (interesse de recorrer).
Já os requisitos extrínsecos operam como prolongamento dos pressupostos processuais. São fatores externos à decisão que se busca reformar, mais voltados, pois, para as questões procedimentais, atinentes à tempestividade, ao preparo, à inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer; à regularidade formal etc.
Enquanto o regular processamento dos recursos em geral depende da caracterização dos requisitos recursais, no reexame necessário não se cogita de tais requisitos. O juiz prolator da sentença, ao contrária do que ocorre na hipótese de recurso, apenas remete os autos ao órgão ad quem, por simples despacho, por força da disposição legal, sem perquirir os pressupostos recursais.

4.1.3   A reapreciação da matéria e os efeitos suspensivo e devolutivo
Bom, por algumas das características verificadas no reexame necessário até seria possível enquadrá-lo nas definições de recursos, isto, se tomássemos como referencial a reapreciação da matéria e a presença dos efeitos suspensivo e devolutivo, possíveis em ambos os institutos. Estes parecem-nos ser os únicos pontos em comum entre os recurso e reexame necessário. Já as particularidades são inúmeras, tornando-os por demais distintos, impedindo que lhes sejam dados tratamentos idênticos.

4.1.4   Legitimidade para a remessa necessária
A análise de um único requisito atinente aos recursos já seria bastante para evidenciar a distinção entre estes e o reexame necessário.
Vejamos, por exemplo, no tocante à legitimidade para a interposição do recurso. No termos do art. 499 do CPC, detêm legitimidade para recorrer,  a parte vencida, o terceiro prejudicado (entenda-se  terceiro interressado) e o Ministério Público.
No caso do reexame necessário podemos dizer que a legitimidade recai sobre o próprio juiz prolator da sentença, a quem caberá a iniciativa de envio dos autos ao juízo ad quem. E mais, esta legitimidade se dá exclusivamente por força de lei, e não por prerrogativa ou ônus.

4.1.5   Os princípios recursais
Os princípios recursais constituem outro ponto de distinção entre os recursos e a remessa necessária.
Sobre os recursos incidem diversos princípios específicos, como o princípio da unicidade ou da singularidade, segundo o qual para cada pronunciamento jurisdicional a previsão é de uma única espécie recursal; o princípio da taxatividade, garantindo que toda espécie recursal deve está prevista em lei; o princípio da fungibilidade, que permite, no caso de dúvida objetiva, o conhecimento de um recurso por outro; o já anunciado princípio da voluntariedade, que exige a iniciativa da parte; o princípio non reformatio in pejus, pelo qual não é permitido agravar a situação do recorrente. Enfim, são diversos os princípios aplicáveis aos recursos. E como já destacado, tais princípio não são aplicados ao reexame necessário.

4.1.6   A remessa necessária como condição de validade e de eficácia da sentença
Como já declinado, é amplamente majoritário o entendimento que nega ao reexame necessário a natureza de recurso. Tal entendimento partiria do próprio legislador de 1973, que o deslocou do capítulo pertinente aos recursos, para o capítulo concernente à sentença e à coisa julgada.
Desse modo, afastada a natureza recursal e reconhecida a singularidade do reexame necessário, a conclusão da doutrina é de que se trata de um instituto sui generis, cuja natureza jurídica é de elemento condicional da eficácia da sentença, e não de uma espécie de recurso, bastando mencionar a ausência do elemento volitivo, indissociável dos recursos em geral.
Aliás, enfatiza Nelson Nery Júnior (2003, p. 813) que à remessa necessária faltam a voluntariedade, a tipicidade, a dialeticidade, o interesse em recorrer, a legitimidade, a tempestividade e o preparo, características e pressupostos de admissibilidade dos recursos. De outro modo, nenhum dos princípios recursais é aplicados à remessa obrigatória.
Há, porém, quem entenda tratar-se o reexame necessário de uma autêntica espécie recursal, a exemplo de Sérgio Bermudes, em sua obra Comentários ao Código de Processo Civil, 2ª ed., vol. VII, São Paulo: RT, 1977, pp. 32-33, citado por Alexandre Câmara (2007, p. 3) que o acompanha nesse entendimento, mas e corrente minoritária.
Em suma, os verdadeiros meios de impugnação das decisões judiciais são os recursos. O reexame necessário não. Este é apenas condição de validade e eficácia da sentença nas causas em que seja expressamente consignada a sua incidência, nos termos do CPC, art. 475, e das demais hipóteses previstas no ordenamento jurídico.  A exceção, especialmente no tocante à eficácia, flui da Lei 1.533/51, art. 12, parágrafo único,  em se tratando de ação de mandado de segurança, em que a sentença produzirá efeitos de imediato com a sua publicação, antes mesmo da remessa dos autos ao Tribunal para o reexame necessário.

5   O OBJETO DO REEXAME NECESSÁRIO E AS SUAS HIPÓTESES DE CABIMENTO
Conforme já estudamos no item anterior, o vigente Código de Processo Civil prevê o reexame necessário no seu art. 475, cujo objeto primordial, como se extrai do próprio texto da lei, consiste no resguardo do interesse público, traduzido no máximo de certeza e justiça das sentenças em que haja sucumbência da Fazenda Pública. Assim, verificada tal situação, independente de haver provocação da parte interessada, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, sob pena de a sentença não produzir seus respectivos efeitos. Não o fazendo o juiz da causa, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
Mesmo antes das inovações trazida pela Lei nº 10.352/2001, não se cogitava de outro elemento ensejador da remessa necessária que não fosse o interesse público. Na antiga redação do art. 475 do CPC, a remessa necessária era obrigatória também em caso de sentença anulatória de casamento, matéria outrora reputada de elevado interesse público, merecendo também um grau mais elevado de atenção por parte do Estado. Todavia, mediante a Lei nº 10.352/2001, o legislador reformador  entendeu que tal hipótese já não requer tanta proteção.
É preciso, porém, ressaltar que esse interesse público de que falamos sofre variações de acordo com o objeto da remessa necessária na hipótese considerada. Expliquemos: é que o instituto da remessa necessária não é exclusividade do CPC, tendo previsão também em diversos outros diplomas normativos, e em todos eles sempre em prol do interesse público, mas nem sempre esse interesse público se traduz na defesa da Fazenda Pública.
Com efeito, todas as situações de cabimento da remessa necessária previstas no nosso ordenamento jurídico seguem o mesmo procedimento, resumido no encaminhamento dos autos, pelo próprio juiz que proferir a sentença, ao órgão revisor para a devida reapreciação. Mas o objeto nem sempre o mesmo, embora em todas as situações o fim último seja sempre o interesse público.
Veja-se que o interesse público efetivamente objetivado pela remessa necessária prevista no CPC, art. 475, de fato está centrado na defesa da Fazenda Pública. Noutro giro, no caso da remessa necessária em sede de Ação Popular o interesse público protegido tem seus reflexos voltados para a verificação minuciosa do pedido popular e da causa de pedir popular, de modo a proporcionar um novo exame sobre a matéria, quando a sentença extinguir o processo por carência ou julgar improcedente o pedido popular.
Na ação de mandado de segurança, igualmente, o interesse público protegido com a remessa necessária não corresponde exatamente à defesa da Fazenda Pública, mas da Administração Pública. Enfim, existem diversas hipóteses em que o interesse público protegido na remessa necessária é distinto do interesse da Fazenda Pública, embora também seja interesse público.

5.1  O art. 475 do CPC após as alterações da Lei 10.352/01
As hipóteses originalmente dispostas no Código sofreram alterações pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001. Foi então excluído o inciso I (que aplicava a remessa necessária às sentenças declaratórias de nulidade do casamento); reescrito o inciso II, que passaria a ser inciso I, nele sendo incluídas outras figuras da Fazenda Pública, substituindo-se a expressão "proferida contra a União, o Estado e o Município", por "proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as autarquias e fundações de direito público".
Vê-se que foram incluídas expressamente no contexto da norma as autarquias e fundações públicas, o que há muito já era admitido na prática forense, de modo que a inovação deu-se apenas para positivar a matéria, não se tratando, efetivamente, de alargamento das hipóteses de cabimento da remessa necessária, mesmo porque nunca fez sentido a exclusão desses dois entes, também de direito público, e que, igualmente à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, sempre gozaram de outros privilégios processuais, a exemplo do prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, execução mediante precatório etc. Aliás, o que fez a lei a Lei nº 10.352/01 foi simplesmente trazer para o bojo do Código de Processo Civil um consenso da prática jurídica, que, inclusive,  já havia sido positivado pela Lei nº  9.469/97 (art. 10º).
Nesse mesmo sentido, a expressa inclusão do Distrito Federal no rol dos beneficiários da remessa necessária, que se deu apenas para reparar a lacuna deixada pelo legislador de 1973, porquanto ninguém jamais duvidou de que ao Distrito Federal seria estendido o mesmo tratamento conferido aos demais entes federativos.
Com a referida Lei nº 10.352/01, o inciso III passou a ser inciso II, com modificação do texto. Antes constava:
III – que julgar improcedente a execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, número VI).
Após a reforma vigora a seguinte redação:
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
Foi substituída a expressão “que julgar improcedente a execução” pela expressão “que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução”. A alteração buscou apenas corrigir a imprecisão literal existente no texto anterior, que se referia impropriamente à “improcedência da execução”. Para muitos, na execução não se deve falar em improcedência do pedido satisfativo, pois não há uma apreciação cognitiva propriamente. É possível sim, em certas situações, falar-se em improcedência dos embargos à execução, pois nestes é que há uma efetiva atividade cognitiva. O legislador lapidou a literalidade do comando legal para então adequá-lo à devida técnica.
O novo texto, ao falar dos embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública, repetiu a remissão ao art. 585, inciso VI, que trata dos títulos executivos extrajudiciais. Tal dispositivo, com a Lei nº 11.382/06, foi renomeado, deixando de ser inciso VI e passando a figurar como inciso VII do referido artigo, constando a seguinte redação:,
VII - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma  lei;
Pois bem, a situação a que se refere o inciso II do art. 475, remete-nos à execução fiscal, regulada pela Lei nº 6.830/80, consistindo no processo de execução da dívida ativa da Fazenda Pública de qualquer das esferas da federação, devendo-se entender por dívida ativa, conforme dispõe o art. 2º da lei mencionada, toda aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, ou seja, qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às suas respectivas autarquias e fundações públicas. Em suma, é dívida ativa todo crédito devido à Fazenda Pública.
O referido inciso VII do art. 585 do CPC é quem define o título executivo apto a deflagrar a execução, que se inicia, obviamente, pela apresentação de uma petição inicial devidamente instruída com a Certidão de Dívida Ativa. Citado o devedor, este poderá opor embargos à execução, na forma do art. 16 da citada Lei de Execução Fiscal. Do julgamento destes, na forma do art. 475, inciso II, é que caberá a remessa necessária, caso a sentença acolha, total ou parcialmente, as alegações do executado embargante, ou seja, julgue contrariamente à Fazenda Pública.
Convém alertar que, para os fins do disposto do art. 475, inciso II, do CPC, a sentença que acolher a exceção de executividade (ou pré-executividade) interposta pelo devedor equivale à sentença de procedência dos embargos. Neste sentido Costa Machado (2006, p. 677).
É oportuno ressaltar que em se tratando de embargos do devedor opostos pela Fazenda Pública, mesmo sendo estes julgados improcedentes, não há o duplo grau obrigatório, porquanto, em tal hipótese certamente teríamos um caso de execução de título judicial, com a Fazendo Pública operando na qualidade de executada, e aí já restaria superada a fase cognitiva, quando, possivelmente teria se dado o uso da remessa necessária. Desse modo, a previsão de uma nova remessa necessária, diante da sucumbência da Fazenda Pública nos embargos do devedor, corresponderia à duplicação do instituto. Veja-se que a hipótese do art. 475, II, do CPC está restrita ao caso do art. 585, inciso VII, que trata de uma das espécie de título extrajudicial, cuja execução se procede sem que tenha havido uma fase cognitiva,  como é curial nas execuções de títulos extrajudiciais.
A lei modificadora também transformou o parágrafo único em parágrafo 1º e incluiu os parágrafos 2º e 3º, cujos teores traduzem dois freios ao cabimento da remessa necessária. Assim, embora sucumbente a Fazenda Pública, não haverá reexame obrigatório sempre que a condenação, ou o direito controvertido, corresposder a valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor, e também quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula do tribunal superior competente.
Na primeira hipótese o legislador apenas seguiu a linha das chamadas “causas de pequeno valor”, já adotada para definir a nova alçada do procedimento sumário, prevista no inciso I do art. 275 do CPC, visando, sobretudo, desafogar os tribunais, dispensando a remessa necessária quando a condenação ou o direito controvertido não superar 60 salários mínimos.
Já no caso do § 3º, o critério vislumbrado está relacionado com a plausibilidade do direito discutido, numa clara homenagem à jurisprudência dos STF e dos Tribunais Superiores, evitando assim o retardamento da prestação jurisdicional. Nos moldes da norma anterior não fazia qualquer sentido o duplo obrigatório quando a sentença, para condenar a Fazenda Pública, fundava-se em jurisprudência do STF ou em súmula do Tribunal Superior competente, uma vez que instância especial seria confirmada a sucumbência.

5.2  Outras hipóteses de remessa necessária
A remessa necessária não se limita às previsões dos incisos I e II do art. 475 do CPC. Diversas uutras hipóteses são previstas no ordenamento jurídico, conforme demonstraremos a seguir.
O art. 2, parágrafo único da a Lei 1.533/51 (Lei da Ação de Mandado de Segurança) também prevê a remessa necessária, assim dispondo:
Art. 12 - Da sentença, negando ou concedendo o mandado cabe apelação. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973)
Parágrafo único. A sentença, que conceder o mandado, fica sujeita ao duplo grau de jurisdição, podendo, entretanto, ser executada provisoriamente. (Redação dada pela Lei nº 6.071, de 1974).
Do mesmo modo, a Lei 4.717/65 (Lei da Ação Popular), cujo art. 19 prevê a remessa obrigatória quando a sentença concluir pela carência ou pela improcedência da ação,
Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo.  (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973).
Na previsão do art. 19 da Lei da Ação Popular a remessa necessária não busca propriamente a proteção da Fazenda Pública, e sim, da sociedade, do interesse público. Sendo qualquer cidadão parte legítima para propor ação popular que, em tese, busca proteger o interesse geral, a norma estabelece a revisão obrigatória de sentença que extinguir o feito por carência ou que julgar improcedente o pedido popular. Aqui fica bem clara a distinção entre interesse da Fazenda Pública e interesse público.
Também nas causas relativas à especificação da nacionalidade brasileira, nos termos do art. 4º, § 3º, da Lei nº 818/1949 (regula a aquisição, a perda e a reaquisição da nacionalidade, e a perda dos direitos políticos), com as alterações produzidas pela Lei nº 5.145/1966 e pela Lei nº 6.014/1973, in verbis:
Art. 4º - O filho de brasileiro, ou brasileira, nascido no estrangeiro e cujos pais ali não estejam a serviço do Brasil, poderá após a sua chegada ao País, para nele residir, requerer ao juízo competente do seu domicilio, fazendo-se constar deste e das respectivas certidões que o mesmo o valerá, como prova de nacionalidade brasileira, até quatro anos depois de atingida a maioridade. (Redação dada pela Lei nº 5.145, de 20/10/66).
§ 1º O requerimento será instruído com documentos comprobatórios da nacionalidade brasileira de um dos genitores do optante, na data de seu nascimento, e de seu domicilio do Brasil. (Incluído pela Lei nº 5.145, de 20/10/66);
§ 2º Ouvido o representante do Ministério Público Federal, no prazo de cinco dias, decidirá o juiz em igual prazo. (Incluído pela Lei nº 5.145, de 20/10/66);
§ 3º Esta decisão estará sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo Tribunal. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 27/12/73). Grifamos.
Na hipótese acima aventada, a subida do autos em remessa necessária independerá de a sentença ser de procedência ou de improcedência. O intento da norma é, pois, reavaliar a matéria, buscando alcançar o máximo de certeza, objetivando a segurança jurídica e não exatamente a proteção da Fazenda Pública.
O Decreto-Lei nº 779/1969, que dispõe sobre a aplicação de normas processuais trabalhistas à União Federal, aos Estados, Municípios, Distrito Federal e Autarquias ou Fundações de direito público que não explorem atividade econômica, traz a previsão da remessa necessária, no seu art. 1º, inciso V, ao que chama de “recurso ordinário ex officio”, tratando-o expressamente  como um dos “privilégios” processuais da Fazenda Pública, como se vê:
Art. 1º Nos processos perante a Justiça do Trabalho, constituem privilégio da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais ou municipais que não explorem atividade econômica:
[...];
V - o recurso ordinário "ex officio" das decisões que lhe sejam total ou parcialmente contrárias;
[...].
A Lei nº 8.437, de 30.06.1992, que dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público, também prevê a incidência da remessa necessária, ainda nominando-a de “recurso ex officio”, como fazia o Código de Processo Civil de 1939, conforme consta do seu art. 3º:
Art. 3° O recurso voluntário ou ex officio, interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.
Temos ainda a hipótese do Decreto-Lei nº 3.365/1941, conhecido doutrinariamente como “Lei Geral das Desapropriações”, em cujo art. 28, § 1º, também prevê a remessa necessária, assim dispondo:
Art. 28.  Da sentença que fixar o preço da indenização caberá apelação com efeito simplesmente devolutivo, quando interposta pelo expropriado, e com ambos os efeitos, quando o for pelo expropriante.
§ 1 º A sentença que condenar a Fazenda Pública em quantia superior ao dobro da oferecida fica sujeita ao duplo grau de jurisdição. (Redação dada pela Lei nº 6.071, de 1974).
[...].
Alerta-se para o fato de que em todas as hipóteses citadas a remessa necessária tem como alvo o resguardo do interesse público, e não exatamente a proteção da Fazenda Pública.
À exceção da sentença que decreta a carência da ação popular, que extingue o processo sem resolução do mérito (art. 267 do CPC), em todas as demais hipóteses somente as sentenças de mérito estão sujeitas à remessa necessária. E mais, somente as sentença, nunca os acórdãos. Veja-se que o caput do art. 475 menciona expressamente o termo “sentença”, a indicar que se trata de decisão prolatada pelo juiz singular (CPC, art. 162, § 1º). Os acórdãos, decisões próprias dos colegiados, mesmo em se tratado de competência originária, não estão sujeitos ao reexame obrigatório.
Não se incluem, portanto, nas hipóteses de remessa necessária, com a exceção já mencionada, as decisões que extinguem o processo sem resolução do mérito (art. 267 do CPC), bem assim todas as demais decisões não definitivas, como é o caso dos provimentos liminares concedidos em ação de mandado de segurança, ação cautelar, ação popular, ação civil pública e até mesmo em sede de tutela antecipada. Todas essas decisões, sendo prolatada contra o Poder Público, embora de caráter provisório, poderão, em regra, observadas as exceções legais, ser cumpridas de imediato, não se submetendo ao regime do duplo grau obrigatório de jurisdição.
Cabe ainda acrescentar que a exceção ou limite imposto à remessa necessária pelo CPC, no parágrafo 2º do seu art. 475, ou seja, na hipótese de condenação a valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, só se aplica às hipóteses de remessa necessária do próprio CPC (art. 475, incisos I e II). Nas hipóteses disciplinadas pelos demais diplomas legais, conforme acima demonstrado, não se cogita de tal limitação, porquanto configuram situações sui geniris, normalmente refletindo obrigações de fazer, não fazer ou dar coisa, fora do contexto econômico-financeiro próprio das condenações pecuniárias, nas quais, encontrando-se o poder público no pólo passivo da condenação, entra em cena a Fazenda Pública.
Enfim, o objeto da remessa necessária não se traduz exatamente na proteção à Fazenda Pública, mas na proteção do interesse público, do ordenamento jurídico, como forma de manifestação do princípio da segurança jurídica.

6  A REMESSA NECESSÁRIA NO CONTEXTO DAS REFORMAS DAS DECISÕES JUDICIAIS
As decisões judiciais, uma vez impugnadas, podem ser mantidas, reformadas, anuladas ou integradas. Diz-se que é mantida quando o órgão ad quem expressa a sua confirmação. É reformada quando merece do órgão revisor outra solução que a substitua. Dá-se a anulação quando verificada a inobservância de procedimento reputado essencial ao regular prosseguimento do feito, causando dano às partes, caso em que será proferida nova decisão. Por último, a integração ou esclarecimento supõe uma situação em que, por regra, nem é reforma, nem é nulidade, efetivando o juízo revisor uma espécie de interpretação do ato decisório, normalmente por força de embargos de declaração que, excepcionalmente, poderá ensejar nova decisão, o chamado efeito modificativo ou translativo nos embargos de declaração.
A doutrina aponta três categorias de instrumentos de impugnação das decisões judiciais, quais sejam, os recursos, as ações autônomas e os sucedâneos recursais, sendo os recursos os mais utilizados.
Há uma estreita relação de simetria entre um recurso e a própria causa (ação), sobretudo no que toca aos chamados elementos da ação (partes, pedido e causa de pedir).
No recurso, se o recorrente alega vício na decisão atacada, diz-se que a causa de pedir é error in procedendo e o pedido há de ser de invalidade da decisão. Se alega erro de análise da matéria, erro de escolha da decisão, a discussão então envolverá o conteúdo da decisão. Diz-se que causa de pedido é erro in judicando, e o pedido será reforma da decisão.
Neste estudo vamos nos prender mais à hipótese de error in judicando que, conforme já disposto, está relacionado com a matéria de fundo, com o juízo de valor expressado na decisão acerca do direito substancial invocado, e não com o procedimento. E se é assim, se a imperfeição da decisão é atribuída a uma valoração considerada inadequada do direito substancial alegado pelo autor, seja por erro na análise da matéria, seja pro má escolha da norma incidente, a decisão será tida como injusta, não se cogitando de invalidade, mas de reforma. Parte da doutrina pátria sustenta que em tal hipótese é impossível a correção ex officio, ou seja, a alteração do julgado somente poderá ser procedida mediante iniciativa da parte interessada, por reflexo do princípio da inércia.
Outros defendem a possibilidade de se reformar tal decisão sem a necessária intervenção das partes. Indicam as hipóteses em que incide o reexame obrigatório, conforme já estudamos nos itens anteriores, bem como em se configurando as situações previstas no art. 267, § 3º do CPC, quando então o juiz estará autorizado a conhecer de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos incisos IV (ausência de pressupostos processuais), V (perempção, litispendência ou coisa julgada) e VI (quando não concorrer qualquer das condições da ação).
Não se duvida de que o juiz possa operar de ofício na forma do art. 267, § 3º, para sanar as irregularidades ali apontadas. Isto, evidentemente, não contraria qualquer princípio processual, pois o objetivo é apenas sanar defeito de forma ou vício, e não modificar o juízo de valor expressado acerca do direito material discutido. A hipótese é, pois, de error in procedendo, não de error in judicando.
Se a imperfeição atribuída à decisão caracterizar error in judicando, aí sim, tal decisão somente poderá ser revista mediante intervenção da parte, à exceção dos casos de cabimento da remessa necessária, que constitui verdadeira exceção a esse a essa
Intervindo a parte interessada mediante a interposição do competente recurso, o órgão que o apreciar ficará limitado a dar-lhe provimento para melhorar a situação do recorrente ou a julgá-lo improcedente, mantendo aquilo que a sentença já havia concedido. Nunca, sob pena de nulidade, poderá o órgão revisor piorar a situação do recorrente, por força do princípio non reformatio in pejus, próprio das espécies recursais.
Discute-se, porém, se essa limitação do órgão revisor é levada a efeito em se tratando de remessa necessária, sabendo-se que esta não constitui uma espécie recursal e, portanto, não estaria sujeita ao princípio non reformatio in pejus,  como dito, próprio dos recursos.

6.1  O princípio da non reformatio in pejus
A proibição da “reformatio in pejus” consiste na impossibilidade de a instância revisora reformar a decisão judicial revisanda, resultando uma situação de piora para a parte recorrente. Objetiva, pois, garantir ao recorrente a mantença daquilo já lhe foi concedido na decisão recorrida, só sendo permitido ao órgão revisor negar provimento ao recurso, mantendo assim o que já concedido, ou reformar a decisão recorrido em benefício do recorrente, nunca para retirar o que já lhe tenha sido concedido na sentença.
Dito isso podemos concluir que o princípio em destaque é manifestação do princípio da congruência ou adstrição (CPC, art. 128 e 640) na fase recursal, limitando objetivamente a decisão do órgão revisor aos termos do pedido formulado nas razões recursais, como ocorre na sentença em relação à petição inicial. Disso, pode-se concluir que o recurso é também um projeto do acórdão do mesmo modo que a petição inicial é um projeto da sentença.
Segundo os princípios acima mencionados, bem assim o princípio do dispositivo, é inadmissível tanto a reformatio in pejus, como também a reformatio in melius, pois não pode o tribunal piorar nem tampouco melhorar a situação do recorrente além dos limites por ele mesmo fixado em seu recurso.
Mas é preciso lembrar que não se inclui nessa regra a possibilidade de serem conhecidas de officio as questão de ordem pública, relacionadas às hipóteses de error in procedendo, sobre que já discorremos no início deste item 6. Nesse caso, evidentemente, a modificação do julgado independerá de manifestação de qualquer das partes, não importando a quem vá prejudicar ou beneficiar, a exemplo do que ocorre na detecção da falta de condição da ação ou de pressuposto processual.

6.2  O princípio da non reformatio in pejus e a remessa necessária
A abrangência da proibição de reforma in pejus em sede de “reexame obrigatório” não é consenso, em se tratando de error in judicando, situação caracterizada por equívoco na decisão, erro no julgamento, na apreciação do direito material discutido, tratando-se, portanto, de acerto ou desacerto na avaliação da causa, e não de invalidade. Mas já não se discute sobre a atuação do órgão revisor nas questões de ordem pública, havendo erro in procedendo, ainda que não levantadas pelas partes, como comentado no item 6.1, situação em que se cogita de nulidade processual e não de acerto ou desacerto na avaliação da causa. Portanto, aqui analisaremos a modificação da sentença apenas sob a ótica do error in judicando.
Segundo orientação firmada pelo STJ (Súmula 45) e pelo STF (RTJ 114/913 e 108/1266; RT 598/260, 584/272 e 478/229), o “reexame obrigatório” é instituído em benefício exclusivo do ente público, não podendo o Tribunal agravar a situação daquele como resultado da remessa oficial, em face do princípio da proibição da reformatio in pejus. Todavia, ainda há muita controvérsia.
Nelson Nery Júnior (2003, p. 814) é enfático ao defender a plena possibilidade de agravamento da Fazenda Pública pelo Tribunal em sede remessa necessária. Para este doutrinador tal agravamento não caracterizaria a reformatio in pejus, tratando-se apenas da “incidência do interesse público do reexame integral da sentença”, por força do efeito translativo a que estão sujeitas as questões de ordem pública.
A discussão é de extrema importância em matéria processual, principalmente diante da nova corrente que se forma para fazer frente aos chamados “privilégios do Poder Público”, dentre os quais, segundo muitos pensadores, inclui-se por excelência a “remessa necessária”, principalmente do modo como vem sendo admitida, em exclusivo benefício da Fazenda Pública.
O próprio legislador já vem se mostrando cauteloso quanto ao referido instituto, como se pode notar pela disposição da Lei nº 10.352/2001, que reformou o art. 475 do CPC, encolhendo as hipóteses de aplicação da remessa necessária, numa clara ênfase à interpretação restritiva do instituto.
Uns poucos doutrinadores, bem como uns e outros magistrados, em julgamentos isolados, defendem a possibilidade de ser piorada a situação da Fazenda Pública em sede de remessa necessária. Entendem não caracterizar propriamente reformatio in pejus, ao fundamento de que a remessa necessária é uma manifestação do princípio inquisitório, e desse modo estaria o órgão revisor apenas aperfeiçoando o julgado, e não propriamente agravando a situação da Fazenda Pública, embora esse aperfeiçoamento viesse concretamente a produzir uma piora na condenação do ente público.
Outros, que também admitem a reforma para pior o fazem ao fundamento de que o agravamento na condenação é exatamente a reformatio in pejus, proibida apenas para os recursos, sendo plenamente possível em sede de remessa necessária, eis que esta não se trata de recuso. Neste sentido também leciona Barbosa Moreira (1998, p. 426), asseverando que a proibição da reformatio in pejus é um instituto inerente aos recursos, e não sendo a remessa obrigatória uma espécie de recurso, na sua seara não há que se falar em proibição de reforma para pior.
Novamente invocamos Nelson Nery Júnior (2003, p. 813-814), para quem não se pode falar em reformatio in pejus na remessa oficial, porque o princípio proibitivo da reforma para pior é conseqüência direta do princípio dispositivo aplicável aos recursos, e a remessa oficial tanto não é espécie recursal quanto não é informada pelo princípio dispositivo, e sim, pelo inquisitório, onde ressalta a incidência do interesse público no reexame integral da sentença.
Vê-se que a corrente defensora da proibição da reforma para pior na remessa necessária sustenta a clara existência do pleno efeito devolutivo nesta, e que o princípio inquisitivo está presente no sistema recursal brasileiro da mesma maneira como se manifesta na instrução processual em primeira instância.
Significa dizer que, conquanto prevaleça o princípio do dispositivo em algumas fases do procedimento, não podem ser ignoradas eventuais manifestações do princípio inquisitivo, decorrentes do caráter público do processo e do interesse do Estado na melhor prestação jurisdicional, estando o princípio inquisitivo manifestamente presente tanto nos procedimentos de primeira instância, quanto nos procedimentos recursais. E o efeito devolutivo, inerente aos recursos, embora se manifeste predominantemente no princípio dispositivo, não deixa de apresentar certas configurações típicas do princípio inquisitivo, a exemplo das manifestações de ofício na condução do processo. Portanto, para esta corrente, nada obsta que se fale em efeito devolutivo da remessa oficial, eis que o aludido efeito comporta nuanças tanto do princípio dispositivo quanto do inquisitivo.
A conclusão dessa doutrina favorável à reforma para piorar a situação da Fazenda Pública, pois, é de que a remessa necessária flui do princípio inquisitivo, ao passo que a regra proibitiva da reformatio in pejus está relacionada com o princípio dispositivo.
Entretanto, é indiscutivelmente majoritária a corrente contrária a esses posicionamentos. Aliás, corroborada pela jurisprudência, no que citamos a Súmula nº 45 do STJ e a Súmula nº 14 do TRF da 2ª Região:
Súmula n.º 45 (STJ) - No reexame necessário, é defeso, ao tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.
Súmula n.º 14 (TFR da 2ª Região) - A remessa necessária não pode ser provida para agravar a condenação imposta à Fazenda Pública, haja ou não recurso voluntário das partes.
A orientação firmada também pelo STF[2] é no sentido de que a proibição da reformatio in pejus estende-se às hipóteses de remessa necessária, não podendo a entidade pública ter sua situação agravada como resultado da remessa necessária, instituída em exclusivo benefício do poder público. Neste sentido, as lições de Humberto Theodoro Júnior (1992, p. 538).
Um dos dos argumentos da corrente majoritária se enverga sobre os motivos (fins) que teriam dado origem ao instituto da remessa necessária, concluindo que, se o referido instituto foi arquitetado e instituído no interesse da Fazenda Pública, seria incoerente admitir-se que esta viesse a ter sua situação agravada em sede de reexame. Seria mais uma razão para se afirmar a proibição da reformatio in pejus na remessa necessária.
Em suma, seja nas hipóteses do art. 475 do CPC, em que a remessa necessária busca proteger o interesse da Fazenda Pública, seja nas demais hipóteses previstas nas diversas normas citadas, em que a remessa necessária busca proteger não exatamente a Fazenda Pública, mas o interesse público, é amplamente majoritário o entendimento pela incidência do princípio non reformatio in pejus,  igualmente como se dá nas espécies recursos.

7  CONCLUSÃO
A remessa necessária, prevista no art. 475 do CPC, bem como em diversos outros diplomas normativos, a exemplo da Lei nº 1.533/51 (Lei da Ação de Mandado de Segurança); da Lei 4.717/65 (Lei da Ação Popular), e do Decreto-Lei nº 779/1969 (dispõe sobre a aplicação de normas processuais trabalhistas), é hoje vista por alguns doutrinadores como mais um dos injustificáveis privilégios processuais do Poder Público, objeto de violação da isonomia dentro do processo.
É consenso na doutrina e na jurisprudência o entendimento que nega natureza recursal à remessa necessária, tratando-se de um instituto sui generis, destinado a reavaliar a condenação imposta por sentença à Fazenda Pública, especialmente nas hipóteses do art. 475 do CPC, e a proteger o interesse geral nas demais hipóteses.
Têm sido estabelecidos fervorosos debates em torno do referido instituto, principalmente no que diz respeito à possibilidade de agravamento da condenação imposta à Fazenda Pública ou ao interesse público, quando a matéria é remetida ao órgão revisor por força da remessa necessária.
Com respaldo na jurisprudência do STJ e do STF, a doutrina é majoritária no sentido da impossibilidade de piora da condenação em remessa necessária, eis que consistiria em afronta ao prestigiado princípio da non reformatio in pejus. Contudo, cresce o número de julgados adotando entendimento contrário.
Efetivamente, podemos dizer que três correntes discutem o tema. A primeira delas, na qual se inserem as jurisprudências do STF e do STJ, indiscutivelmente majoritária, coíbe qualquer reforma no sentido de agravamento à Fazenda Pública em remessa necessária.
Uma segunda corrente defende a possibilidade de reforma para piorar a situação do condenado, ao fundamento de que a remessa necessária não seria informada pelo princípio dispositivo, pois o procedimento se dá por força de norma imperativa absoluta, agasalhando-se, portanto, tal instituto, na seara do princípio inquisitório, e por isto também não se pode falar em simples efeito devolutivo, mas em efeito translativo, devolvendo-se toda a matéria ao órgão jurisdicional revisor e não apenas a parte que afeta o ente público. Para os defensores deste pensamento, dentre os quais Nelson Nery Júnior, o agravamento da Fazenda Pública não teria qualquer relação com a proibição da reformatio in pejus. Seria uma espécie de imperativo da norma em busca da perfeição dos provimentos jurisdicionais.
Uma terceira corrente emerge da segunda, radicalizando-a. Defende o cabimento da própria reformatio in pejus, por não se tratar a remessa obrigatória de um recurso, propriamente, e sim, de um instrumento que busca alcançar o interesse público, cujo fim último é a máxima justeza dos provimentos jurisdicionais.
Ora, dizer-se que a remessa necessária aproveita ao estrito interesse do ente estatal seria excluir o verdadeiro intento do legislador, que estaria assentado no interesse geral, o qual vai além do mero interesse da pessoa jurídica de Direito Público. O interesse público abrange tanto o interesse do ente estatal, porque este é patrimônio de todos, como também os interesses e objetivos do Estado Brasileiro, consubstanciado no ordenamento jurídico como um todo, em especial no art. 3º, inciso I, da Constituição Federal, que expressa como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Não traduziria absurdo algum admitir-se que a remessa necessária está muito acima do mero interesse da pessoa jurídica de Direito Público, porquanto materializa a tentativa de se entregar à sociedade uma prestação jurisdicional o mais próximo possível dos sentimentos de justiça, independendo, assim, de se agravar ou não a situação do ente público.
Todavia, da forma em que foi concebida e se encontra positivada no nosso ordenamento jurídico, nos termos do art. 475 do CPC, especificamente para reavaliar uma condenação imposta contra a Fazenda Pública, que por sua vez representa o interesse geral, a conclusão há de ser pela incidência do princípio non reformatio in pejus.
O contrário disso, ou seja, admitir-se que a revisão do julgado em sede de remessa necessária possa piorar a condenação imposta à Fazenda Pública, equivale admitir-se que a outra parte possa disso se beneficiar, aumentando seu quinhão na sentença sem ter para tanto promovido o competente recurso, o que efetivamente esbarraria no princípio da demanda ou da inércia da jurisdição.
De fato, aparentemente há uma certa impertinência falar-se em proibição de reforma para pior em sede de remessa necessária, pois não se trata de uma espécie recursal, e o princípio da non reformatio in pejus é atinente aos recursos. Ora, mas não há norma superior estabelecendo essa exclusividade do princípio em destaque aos recursos e nem proibindo a sua extensão à remessa necessária.
Tudo gira em torno dos interesses mais relevantes no âmbito do Estado, o interesse geral, que se traduz na defesa do patrimônio público, este materializado nas suas diversas dimensões, justificando-se perfeitamente a existência de um instituto próprio a dar uma maior expressão de certeza à sentença, quando esteja em jogo o patrimônio público, o interesse geral, a exemplo do que ocorre na ação popular, quando a sentença extingue o processo por carência de ação ou julga improcedente o pedido popular, vindo a remessa necessária não exatamente para resguardar o interesse do ente público, mas o interesse da coletividade, que na hipótese afigura-se mais relevante do que o interresse do próprio ente estatal.
Enfim, seja qual for a situação, fica afastada a possibilidade de reforma da sentença para agravar a situação daquele a quem a remessa necessária deve aproveitar, seja a Fazenda Pública (nas hipóteses art. 475 do CPC), seja o interresse geral (nas hipóteses previstas nas demais normas). E isto, não por se tratar a remessa necessária de uma espécie recursal, mas por uma questão de razoabilidade, não se podendo admitir que aquele em função de quem foi criado um dado instituto seja em função deste prejudicado. Também, não há qualquer norma que estabeleça exclusividade do princípio non reformatio in pejus às espécies recursais, podendo este ser muito bem estendido à remessa necessária, eis que neste particular é similar aos recursos.
Por último, não cabe falar-se em reforma para pior, em sede de remessa necessária, por força do disposto nos arts. 128 e 460 do CPC, princípio da adstrição ou da congruência entre a decisão e o pedido, não podendo o tribunal conceder providências que não foram postuladas, ou seja, não poderá melhorar a situação da parte contrária à Fazenda Pública se esta sequer recorreu.
Não seria demais invocar também o princípio da inércia da jurisdição, perfeitamente aplicável na esfera recursal, vedando a atividade jurisdicional sem a correspondente provocação da parte (CPC, art. 2º), princípio este intimamente ligado ao já citado princípio da congruência, de modo que a parte não poderá ser agraciada com uma decisão ser formular, expressa e especificamente, pedido algum ao tribunal, sendo a este vedada a prolação de decisão infra, extra ou ultra petita, nos termos do art. 460 do CPC.

8  REFERÊNCIAS
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 16ª. ed., vol. I, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
DONIZETTI, Elpídio. Curso de Direito Processual Civil. 7ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
FUX, Luís. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 15 ed. Vol. 2, São Paulo: Saraiva, 2002.
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil Interpretado. 5ª ed. Barueri-SP: Manole, 2006.
MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 10 ed. vol. V. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 7º ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 10 ed. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
TOSTA, Jorge. Do reexame necessário no Direito Processual Civil. Dissertação de mestrado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo: 2001.




[1]  MARTINS, Samir José Caetano. Em torno do duplo grau de jurisdição obrigatório. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1242, 25 nov. 2006. Disponível em: . Acesso em 31 jul.2007.
[2]  STF (RTJ 114/913 e 108/1266; RT 598/260, 584/272 e 478/229).


COMO CITAR ESTE TEXTO:
BARROS, Clemilton da Silva.
Considerações prognósticas do reexame necessário no Processo Civil Brasileiro. Disponível em: http://www.juridicosetc.blogspot.com. Acesso em: dia/mês/ano.

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