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Série “LIÇÕES
DE SALA-DE-AULA”
A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Teoria Geral - Parte 2
AS CONDIÇÕES DA AÇÃO E OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS NA
EXECUÇÃO.
Clemilton da Silva Barros
1
INTRODUÇÃO
Parte da doutrina brasileira não aceita falar em condições da ação em
se tratando de ação executiva[1],
muitos entendendo que as condições da ação, bem como os pressupostos
processuais são institutos exclusivos dos procedimentos cognitivos.
Contudo, o que e verifica em sede de avaliação preliminar é que toda espécie
de ação tende a instalar um processo, movimentando assim diversos atores, tais
como o réu ou devedor e o próprio Poder Jurisdicional, portanto,
justificando-se, em qualquer espécie, o preenchimento de requisitos legais
mínimos para se tornar juridicamente viável o exercício da ação.
Assim, estando a execução, seja por processo ou por fase, vinculada ao
exercício do direito de ação, e considerando-se que o exercício desta prende-se
à constante satisfação das suas condições, e certo de que qualquer espécie de
processo necessita a todo tempo dos seus pressupostos de constituição e de
desenvolvimento válido, não parece haver sentido em se afastar as condições da
ação e os pressupostos processuais do âmbito da execução, merecendo, portanto, o
tema, uma apurada investigação, o que ora se propõe empreender.
2 AS
CONDIÇÕES DA AÇÃO NA EXECUÇÃO
Aqueles que se põem contra a exigência das condições da ação na ação
executiva sustentam que o próprio título executivo já equivale a tais
condições. Ora, a ação de execução constitui prerrogativa legal do credor de
movimentar o Estado-juiz para que este imponha a satisfação de um direito
anteriormente reconhecido, seja mediante um título executivo judicial ou um título executivo extrajudicial.
Estamos, pois, falando de uma relação jurídica processual na qual o título executivo constitui apenas um
instrumento que servirá para a devida aferição da viabilidade da demanda
(condições da ação). É o que buscaremos demonstrar.
Primeiro importar observar que a relação jurídica processual sempre
flui de uma relação de direito material[2].
Com isso, não é demais dizer que a relação processual está atrelada à relação
de direito material, figurando as condições com uma ponte que une essas duas
espécies de relações jurídicas.
Noutro giro, cada uma das condições da ação encontra-se associada a um
dos elementos da demanda, que por sua vez derivam a partir dos elementos da
demanda, estando a estes vinculados.
Os elementos da relação de direito material são três: o fato, o objeto e o sujeito. São estes
três elementos que dão existência e forma a todas as relações jurídicas de
direito material.
Dos referidos elementos da relação material, fluem os correspondentes
elementos da relação processual: a causa
de pedir, o pedido e as partes. Em se tratado de ação executiva, a causa de pedir corresponde ao inadimplemento do devedor; o pedido
remete a uma execução de fazer ou não fazer, de entregar coisa ou de entregar
dinheiro; e as partes são, via de regra, o credor e devedor.
Seja na ação de conhecimento, seja na ação de execução, as condições
da ação fluem como meros reflexos dos três elementos da demanda, e com eles se
entrelaçam, sendo também em número de três: interesse de agir, possibilidade jurídica do pedido e legitimidade das
partes.
Note-se que do elemento material “fato”
vem a “causa de pedir” (elemento da demanda) e desta vem o “interesse de agir” (condição da ação). Do mesmo modo, ao objeto (elemento
da relação material) se vincula o pedido
(elemento da demanda), que dá origem à possibilidade
jurídica do pedido (condição da ação).
E, por fim, do elemento “sujeito“ vem o elemento “partes”, de
onde flui condição da ação “legitimidade
das partes”.
Mas algo precisa ainda ser dito para se fechar a linha de raciocínio
aqui desenvolvida. Para que não se pense que as coincidências, relações e
vínculos aqui apontados se dão de forma espontânea e automática. Não é assim. Vale
dizer, toda relação jurídica, seja de direito material ou processual, tem de
conter os seus três elementos, ou então estará incompleta.
Ao ser exercido o direito de ação, os elementos da relação material se
convertem em elementos da demanda, e para que tal exercício seja juridicamente
viável, o magistrado ingressa no interior da cada um dos elementos da demanda
para verificar se estes estão a se combinar com os elementos da relação de
direito material. Portanto, as condições da ação entram em cena exatamente
nesse momento de aferição dos elementos da demanda, os quais não podem
desgarrar-se dos elementos da relação jurídica material.
Feitas essas digressões, resta claro, pois, que o título executivo não substitui as condições da ação. Justifica-as,
na medida em que deve trazer em si todos os elementos de direito material a
serem convertidos nos elementos da demanda, conversão essa aferida mediante a
análise das condições da ação. Pelo que representa o título executivo no âmbito
da relação jurídica material, constitui elemento fundamental na verificação da
viabilidade da relação executiva, contudo, não se confunde com as condições da
ação.
Enfim, o requerimento da tutela jurisdicional executiva está sujeito à
aferição das necessárias condições para o exercício do direito de ação, quais
sejam: a legitimidade de parte, a possibilidade jurídica do pedido e o interesse
de agir.
2.1 Legitimidade para a execução.
Como no processo de conhecimento, deve-se cogitar sobre quem pode figurar
no polo ativo e no polo passivo da demanda. Vale dizer, quem pode requerer a
execução e contra quem se requer a execução, aferição essa efetuada a partir da
“pertinência, em abstrato, entre os sujeitos da relação processual e os
sujeitos da relação de direito material (legitimidade ordinária), ou pela
autorização legal para que alguém litigue sobre direitos alheios em nome
próprio (legitimidade extraordinária)”[3].
Não é demais dizer que essa analise só é viabilizada mediante o exame
de alguns elementos do título executivo. É este que indicará quem é o credor e
quem é o devedor da obrigação assumida, ou quem lhe poderá fazer as vezes.
2.1.1
Legitimidade ativa
Tem disciplinamento pelos artigos 566 ao 567 do CPC. Além do credor, o
Ministério Público, o espólio, os herdeiros ou sucessores do credor, o cessionário
e o sub-rogado também podem, em determinadas situações, figurar no pólo ativo
da execução, conforme dispõe o CPC, daí sendo a legitimidade ativa classificada
em:
a) Legitimidade ativa ordinária – o próprio credor do título
executivo judicial ou extrajudicial é o legitimado ordinário, ou natural, para
promover a execução, conforme dispõe o art. 566, I do CPC. Diz-se que há uma
coincidência entre aquele que afirma um direito material e aquele a favor de
quem correrá a demanda executiva, ou seja, a parte ativa material é a mesma
parte ativa processual.
b) Legitimidade ativa extraordinária –
ocorre quando o credor, por autorização expressa da Lei, cede lugar a quem não
esteja propriamente vinculado ao título executivo. É o que se verifica nas
hipóteses em que o Ministério Público (CPC, art. 81) ocupa o polo ativo da
execução mesmo não sendo credor, no caso da Lei de Ação Civil Pública; na Lei
de Improbidade Administrativa; na Lei da Ação Popular etc.
Art. 566. Podem promover a execução
forçada:
(...).
II - o Ministério Público, nos casos
prescritos em lei.
Ao contrário
do que ocorre na legitimidade ordinária, na extraordinária há uma
descoincidência entre a afirmação que se faz no plano processual e a
titularidade no plano material, ou seja, distinguem-se a parte processual e a
parte material.
c) Legitimidade derivada ou superveniente
– ocorre quando, por circunstâncias outras, o credor é substituído no polo
ativo da execução pelo espólio, pelos herdeiros, pelo cessionário, ou pelo
sub-rogados, conforme dispõe o art. 567 do CPC. Confira-se:
Art. 567. Podem também promover a
execução, ou nela prosseguir:
I - o espólio, os herdeiros ou os
sucessores do credor, sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o
direito resultante do título executivo;
II - o cessionário, quando o direito
resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos;
III - o sub-rogado, nos casos de
sub-rogação legal ou convencional.
Conquanto
seja silente o CPC, a legitimação extraordinária também deve ser aplicada para
os casos de dissolução e liquidação de pessoas jurídicas, hipóteses em que os
sucessores passam a ser exequentes, assim identificados de acordo com as leis
materiais.
2.1.2
Legitimidade Passiva
Tem disciplinamento pelo artigo 568 do CPC, que dispõe:
Art. 568. São sujeitos passivos na
execução:
I - o devedor, reconhecido como tal no
título executivo;
II - o espólio, os herdeiros ou os
sucessores do devedor;
III - o novo devedor, que assumiu, com o
consentimento do credor, a obrigação resultante do título executivo;
IV - o fiador judicial;
V - o responsável tributário, assim
definido na legislação própria.
A legitimidade passiva na execução pode ser classificada em:
a) Legitimidade ordinária – quando a execução recai sobre a figura
do próprio devedor ou responsável, ou seja, inclui-se também as figuras do
fiador, do avalista e do responsável tributário, que não são propriamente
devedores, mas apenas garantidores ou responsáveis pela dívida.
b) Legitimidade derivada ou superveniente –
ocorre quando o devedor por alguma circunstância, é substituído no polo
passivo da demanda executiva pelo herdeiro, pelo espólio, pelos cessionários,
pelos sub-rogados etc.
Aqui também
se incluem os casos de dissolução e liquidação de pessoas jurídicas, hipóteses
em que passam os sucessores a posição de executado, assim identificados de
acordo com as leis materiais.
2.1.3 A Pluralidade de partes e a intervenção de
terceiros na execução
Na execução
pode muito bem existir pluralidade de partes, seja no pólo ativo, seja no
passivo. Portanto, poderá ocorrer a formação de litisconsórcios ativos,
passivos ou mistos.
Contudo, não
se admite intervenção de terceiros, isto porque a atividade jurisdicional
executiva pressupõe o anterior reconhecimento do direito que integra o objeto
da execução.
Importa
observar que a atuação do terceiro interessado é sempre voltada para que o reconhecimento
do direito lhe seja favorável, e como na execução já houve o reconhecimento do
direito, não há mais que se falar no ingresso de um terceiro para atuar com tal
objetivo.
A doutrina
porém, admite a intervenção do assistente (simples ou litisconsorcial) quando
houver alguma atividade de caráter cognitivo nos procedimentos executórios. É o
que pode ocorrer com a figura do responsável pela dívida, o fiador, por
exemplo, que poderá intervir no processo para tentar fazer valer o seu
benefício de ordem.
2.2 O Interesse de agir
O interesse
de agir surge da necessidade de se obter, por intermédio do processo, um
pronunciamento, ou atitude, do órgão jurisdicional acerca do interesse
substancial submetido à apreciação.
Caracteriza-se
pelo binômio “necessidade-utilidade” e “adequação”. Vale dizer, não basta que
se faça necessária e útil a atuação do Judiciário, tendo também que ser
adequada a via procedimental eleita pelo autor.
Na execução,
o interesse de agir flui, sobretudo, da disposição do art. 580, que prevê
aquilo tratado por muitos doutrinadores como “requisitos” ou “pressupostos
específicos da execução”, quais sejam, a existência de um título executivo e o
inadimplemento do devedor.
Tais
requisitos nada mais são do que uma das condições da ação executiva, qual seja,
o interesse de agir. Com efeito, a posse do título executivo demonstra o
interesse de agir na sua modalidade “interesse-adequação”, o que legitima o
credor a eleger a via procedimental executiva. A ausência do título acarreta a
carência da ação executiva.[4]
Já o
“interesse-necessidade” encontra-se assentado na alegação de descumprimento da
prestação pelo devedor, restando ao credor socorrer-se do Poder Judiciário, uma
vez que não lhe é permitido resolver o conflito executivo pela via da
autotutela.
Em suma, repousa,
fundamentalmente, o interesse de agir na execução, seja ela sincrética ou por
processo, na necessidade da intervenção do Estado diante do inadimplemento, pelo
devedor, de uma obrigação encetada em título executivo, judicial ou
extrajudicial.
Pode-se
também identificar o interesse jurídico como condição da tutela jurisdicional
executiva, nos termos dos arts. 581
e 582 do CPC, in verbis:
Art. 581. O credor não poderá iniciar a execução, ou nela
prosseguir, se o devedor cumprir a obrigação; mas poderá recusar o recebimento
da prestação, estabelecida no título executivo, se ela não corresponder ao
direito ou à obrigação; caso em que requererá ao juiz a execução, ressalvado ao
devedor o direito de embargá-la.
Art. 582. Em todos os casos em que é
defeso a um contraente, antes de cumprida a sua obrigação, exigir o implemento
da do outro, não se procederá à execução, se o devedor se propõe satisfazer a
prestação, com meios considerados idôneos pelo juiz, mediante a execução da
contraprestação pelo credor, e este, sem justo motivo, recusar a oferta.
Parágrafo único. O devedor poderá,
entretanto, exonerar-se da obrigação, depositando em juízo a prestação ou a
coisa; caso em que o juiz suspenderá a execução, não permitindo que o credor a
receba, sem cumprir a contraprestação, que lhe tocar.
Ainda no
tocante ao interesse-adequação, como dito, relacionado à existência do título
executivo, também encontra-se caracterizada pelo vínculo entre a espécie de
título executivo considerado e o respectivo procedimento adotado: para o título
executivo judicial (art. 475-N do CPC), via de regra, a execução se procede por
simples requerimento (processo sincrético), se executivo extrajudicial (art. 585
do CPC), o autor ingressará com uma petição inicial, iniciando-se um novo
processo.
2.3 A Possibilidade Jurídica do
pedido
Por possibilidade jurídica do pedido, em termos
gerais, entende-se como a aptidão que o objeto da ação apresenta
de, em tese, ser acolhido, caso se configurem como verdadeiras as razões
aditadas pelo autor. Noutros termos, a tutela pretendida deve ser admitida pelo
ordenamento jurídico, ainda que de forma não expressa e ainda que o autor não
possua o direito substancial alegado.
Na execução
não é diferente. Ao autor não é dado postular atos executórios ou objeto não amparados
pelo ordenamento jurídico, a exemplo da penhora de bens da Fazenda Púbica e do
pedido de entrega de coisa cuja circulação ou comercialização não seja admitida
pelo ordenamento jurídico. Há também impossibilidade jurídica do pedido
executório quando a causa de pedir não é juridicamente possível, ainda que o
objeto em si seja possível, como ocorre com a cobrança de dívida de jogo.
Enfim,
qualquer execução há de estar fundada em título executivo, e todo título
executivo tem de estar previsto em Lei.
3 OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
NA EXECUÇÃO
Por
pressuposto processual deve-se entender como a ausência, no processo, de
qualquer dos elementos ou situação que a Lei exige estar presente; ou a
presença quando a Lei exige estar ausente. Refletem, pois, os requisitos de
validade do processo.
Com efeito,
independentemente de se tratar de processo de conhecimento, de processo
cautelar, ou do processo de execução, existem os pressupostos processuais subjetivos
e objetivos.
3.1 Os pressupostos processuais
subjetivos
Estão
relacionados com os sujeitos do processo, considerando-se a trilateralidade da relação
processual, que se desenvolve entre autor (exequente na execução), juiz (órgão
jurisdicional investido de jurisdição e de competência para a causa) e réu
(executado).
3.1.1 As partes na execução
No que toca
especificamente às partes (exequente e executado), seja na execução sincrética,
seja na execução por processo autônomo, estas têm de ser capazes para o
processo ou estar legalmente representadas ou assistidas (CPC, arts. 7º e 8º).
Também necessitam estar patrocinadas por advogado (a chamada capacidade
postulatória), a menos que o próprio ordenamento jurídico dispense tal
requisito[5].
3.1.2 A competência para apreciar a execução
Em se tratando
de execução de titulo executivo judicial, nominado pelo Código como
“cumprimento de sentença”, dispõe o art. 475-P do CPC que a execução efetuar-se-á:
a) perante os
tribunais, nas causas de sua competência originária;
b) perante o
juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição, podendo o exequente
optar pelo juízo do local onde se encontram bens sujeitos à expropriação ou
pelo do atual domicílio do executado, casos em que a remessa dos autos do
processo será solicitada ao juízo de origem; e
c) perante o juízo cível competente, quando se tratar de
sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira.
Já em se tratando de execução fundada em título executivo extrajudicial,
prevê o art. 576 do CPC que será processada perante o juízo competente, na
conformidade do disposto no Livro I, Título IV, Capítulos II e III.
Vale dizer, na
execução de título extrajudicial aplicam-se as mesmas regras de competência do
processo de conhecimento, explicitando a jurisprudência do STJ o seguinte: a) deve-se
observar o foro de eleição; b) não havendo foro de eleição, prevalece o local
do pagamento; e c) não havendo um local específico, a competência será do foro
de domicílio do executado.
Importa ainda destacar a competência em
sede de precatório, que não se insere propriamente na atividade jurisdicional,
mas administrativa, mediante a qual o Presidente do Tribunal administra o
precatório, cabendo ao juízo da execução decidir sobre os incidentes
processuais. A Súmula 311 do STJ traz a
seguinte disposição: Os atos do presidente do tribunal que disponham sobre
processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional.
3.2 Os pressupostos processuais
objetivos
Os
pressupostos processuais objetivos estão relacionados com o objeto do processo
e com a forma dos atos processuais. Portanto, incluem-se entres os pressupostos
objetivos, a forma procedimental adequada, a citação válida, a inexistência de
litispendência e de coisa julgada etc.
Em se
tratando de execução, além dos pressupostos processuais comuns, a doutrina
destaca os chamados “pressupostos específicos da execução”, arrolados pelo art.
580 do CPC, quais sejam, a existência de título executivo e a alegação de
inadimplemento do devedor[6],
os quais entendemos enquadrar-se na categoria de condições da ação, conforme já
destacado linhas atrás.
Fala-se
ainda de pressupostos específicos, em relação ao titulo executivo, que deve
conter uma obrigação certa (tem seus elementos - sujeito
ativo/sujeito passivo/prestação) perfeitamente definidos, ou seja, sujeitos e
objeto definidos; líquida ou quantificada (quando a obrigação de dar coisa
fungível possui o seu quantum debeatur; e exigível (quando o seu cumprimento não
estiver sujeito a termo ou condição).
4 CONCLUSÃO
Da análise aqui
empreendida, ainda que breve, bem se pode concluir que, não sendo absoluto o
direito de ação e sendo a execução produto ou consequência do exercício da ação[7], afigura-se
imprescindível algum requisito para se exercer a execução, requisitos estes
mínimos, mas capazes de evitar que qualquer credor em potencial escolha seu
devedor e contra este possa iniciar uma execução que não contenha os mínimos
elementos a fazê-la prosperar. Assim não sendo, tanto alguém poderá ser demando
indevidamente quanto o Estado poder ser invocado em vão.
Do mesmo
modo, desenvolvendo-se a execução sempre mediante um procedimento processual, e
certo de que este jamais se separa dos seus pressupostos de constituição e de
desenvolvimento válido, outra não poderá ser a conclusão senão a de que toda
execução depende da constante satisfação dos chamados pressupostos processuais.
Figura o título executivo não como um feixe de condições da ação ou pressupostos
processuais, mas instrumento que expressa os necessários elementos de direito
material a serem convertidos nos elementos da demanda, conversão essa aferida
mediante a análise das condições da ação.
Enfim, seja a execução procedida mediante processo, seja de forma sincrética,
o avanço dos atos processuais dependem da constante satisfação das condições da
ação e dos pressupostos processuais, como ocorre no processo de conhecimento[8].
REFERÊNCIAS
ALVIM, Arruda. Manual
de direito processual civil. 14ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011.
DINAMARCO, Cândido
Rangel. Execução Civil. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
DONIZETTI, Elpídio.
Curso Didático de Direito processual Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008.
KLIPPEL, Rodrigo e
BASTOS, Antonio Adonias. Manual de Processo civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2011.
WAMBIER, Luiz Rodrigues e TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo
civil. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
[1] DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito processual
Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 563.
[2] Segundo
observa Arruda ALVIM, “toda ação é oriunda de fatos e que estes fatos,
necessariamente, têm uma qualificação jurídica”. (ALVIM, Arruda. Manual de direito
processual civil. 14ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011, p. 405).
[3]
KLIPPEL, Rodrigo e BASTOS, Antonio Adonias. Manual de Processo civil. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.1086.
[4]
DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000,
p. 418).
[5] A
exemplo da disposição da Lei nº 9.099, art. 9º, que dispensa o patrocínio por
advogado nas causas de até 20 salários mínimos, no âmbito dos Juizados Especiais.
[6] DONIZETTI, op. cit., p. 570.
[7] Segundo
WAMBIER e TALAMINI, como consequência direta da existência de regime geral
comum para a atividade jurisdicional cognitiva e executiva, aplicam-se ao
processo de execução e à fase de cumprimento de sentença as regras sobre
pressupostos processuais e condições da ação, nos termos dos arts. 2º, 3º, 6º, 267 e 301 do CPC (WAMBIER, Luiz
Rodrigues e TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. 12ª ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p;. 64).
COMO CITAR ESTE TEXTO:
BARROS,
Clemilton da Silva. As
condições da ação e os pressupostos processuais na execução.
Disponível em: http://www.juridicosetc.blogspot.com. Acesso
em: dia/mês/ano.
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Série "LIÇÕES DE SALA-DE-AULA"
A EXECUÇÃO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Teoria Geral - Parte I
Clemilton da Silva Barros
1
INTRODUÇÃO
O objetivo do curso é demonstrar a importância da
efetividade para o Direito Processual Moderno (fase instrumental),
avaliando, neste contexto, a
pertinência das últimas mudanças legislativas em sede de execução; sistematizar
conceitualmente as diversas modalidades de execução, que serão estudadas
no decorrer do curso; e fazer compreender a dualidade do regramento da execução (ou
efetivação do direito), classificada esta tendo em vista a natureza do título
em que se funda (título judicial ou extrajudicial)
Importa
inicialmente proceder-se a um estudo sistemático do Código de Processo
Civil Brasileiro, tendo em mente a tutela jurisdicional postulada pela parte. O
CPC tem a seguinte divisão:
Livro I
– Processo de Conhecimento – busca
estabelecer a certeza jurídica definindo a titularidade de um direito;
Livro II
– Processo de Execução – visa
satisfazer (efetivar) um direito já devidamente definido;
Livro III – Processo Cautelar – visa garantir a
efetividade de um processo principal (conhecimento ou execução) e não de um
direito.
Livro IV
– Procedimentos Especiais – para situações em que, via de regra, a tutela
pretendida reclama o acertamento do direito, o acautelamento e a execução na
mesma relação processual;
Livro V –
Disposições Finais e Transitórias – Regula a vigência e a aplicação do Código.
A sua entrada em vigor e o regramento das relações jurídicas pretéritas
(direito intertemporal)
O Código prevê três
espécies de processos e um procedimento que conjuga características dos três
processos.
O processo de execução pode ser definido como a
atividade estatal que tem por fim a realização prática do comando concreto
derivado do direito objetivo (Cândido R. Dinamarco).
2
TUTELAS JURISDICIONAIS
A partir da
sistemática adotada pelo CPC e considerando-se o tipo de proteção pretendido,
três podem ser as modalidades de tutelas jurisdicionais:
a) tutela de certeza, ou de conhecimento, ou
declaratória
(o poder jurisdicional certifica, pela coisa julgada, determinada relação
jurídica);
b) tutela de efetivação ou executiva (efetiva
direitos subjetivos); e
c) tutela de segurança ou cautelar (providência
que assegure a efetivação das duas anteriores)
Nota-se que a
tutela executiva é o fim último da atividade jurisdicional. Busca a satisfação
ou realização de um direito já acertado ou definido em título judicial ou
extrajudicial.
Via de regra, a
tutela executiva atua exclusivamente em favor do credor, diferente do que
ocorre com as tutelas cognitivas e cautelares. Não atua, porém, sobre a pessoa
do devedor, mas sobre o seu patrimônio.
3 EVOLUÇÃO DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS
(ESPÉCIES DE EXECUÇÃO)
No sistema
originário do CPC não havia distinções relevantes entre a execução por título
judicial e extrajudicial. O Livro II tratava, de forma indistinta, de ambas.
A sistemática
adotada no texto original do atual CPC (de 1973), herdada do CPC de 1.939,
utilizava um processo para conhecer o direito e outro para efetivá-lo.
Isto, porém, ia de
encontro à celeridade e efetividade do Processo, o que ensejou a deflagração de
várias reformas no sistema de execução do CPC, instalando-se o chamado processo sincrético como regra e o processo autônomo como exceção.
Essas reformas
podem ser assim resumidas:
a) 1º Momento - Lei nº 8.952/1994, que reescreveu o
art. 461, para tratar do cumprimento das obrigações
de fazer ou não fazer;
De acordo com o
art. 461 e seus parágrafos, quando julgado procedente o pedido de obrigações de fazer ou não fazer, o
juiz expede uma ordem ao devedor. Se ele não a atende, desnecessário processo
autônomo de execução. Basta que se postule as providências previstas nos §§ 4º,
5º e 6º do art. 461 para efetivar a determinação judicial.
b) 2º Momento – Lei nº
10.444/2002, que introduziu o art. 461-A, para tratar do cumprimento das obrigações de entrega de coisa;
Antes, o devedor
era citado para promover a entrega, sob pena de busca e apreensão ou imissão de
posse, conforme o bem fosse móvel ou imóvel. Com as alterações acrescentadas
pela Lei nº 10.444/02, a sentença que
condena à entrega de coisa é
mandamental, e dispensa posterior processo de execução.
De acordo com o §
2º do art. 461-A, "não cumprida a obrigação no prazo estabelecido,
expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na
posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel". O processo de
execução para entrega de coisa, tratado no Livro da Execução, ficou reservado
apenas para aquelas obrigações fundadas em título extrajudicial.
c) 3º Momento – Lei nº
11.232/2005, que estendeu o processo sincrético em relação ao cumprimento
das obrigações de pagar quantia certa (obrigação de pagar dinheiro, fundada em título
judicial, exceto contra a fazenda pública), nos termos do art. 475-J;
Foi a maior de
todas as alterações. O cumprimento das
sentenças condenatórias em obrigação de fazer ou não fazer e de entrega de
coisa continua sendo feito na forma dos arts. 461 e 461-A. Mas a lei
modificou a execução das obrigações por quantia certa, e ao fazê-lo, acabou por
transformar a própria estrutura do processo como um todo.
Antes, uma ação com
um pedido de cobrança, desde o ajuizamento da demanda até a satisfação da
obrigação, poderia render até três
processos distintos: o de
conhecimento (de natureza cognitiva); o
de liquidação (também de natureza cognitiva), caso o valor da condenação
não fosse líquido;e o de execução.
Em cada um deles - dada a sua autonomia – era preciso promover-se uma nova
citação do réu. Havia uma sentença, que
punha fim ao processo de conhecimento; outra, ao processo de liquidação, e uma
terceira, que encerrava o de execução.
d) 4º Momento – Lei nº
11.382/2006, que alterou o processo
de execução autônomo, que remanesce basicamente em relação aos títulos extrajudiciais (arts. 652 e segs. do CPC), cujos
procedimentos são aplicáveis subsidiariamente no caso de SATISFAÇÃO DE TUTELA JURISDICIONAL (títulos judiciais).
Antes
dessas alterações, a regra para a
SATISFAÇÃO DOS DIREITOS (tutelas jurisdicionais e título executivo
extrajudiciais) era o processo de
execução autônomo. As exceções eram, por exemplo, ações de despejo e ações
possessórias, para cuja execução não se exigia processo de execução.
Hoje, a regra para a satisfação da TUTELA
JURISDICIONAL é o cumprimento de sentença, ressalvadas algumas situações
excepcionais, conforme previsto no art. 475-N, parágrafo único.
Em suma, a execução hoje rege-se em dois formatos,
ditados pelas Leis nº 11.232/05 e nº 11.382/06. A idéia do legislador foi
proporcionar uma execução mais efetiva, já esta era tida como o grande problema
de frustração do processo.
4 ESPÉCIES DE EXECUÇÃO (ATUAIS FORMAS DE
EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS)
O próprio CPC, no seu Livro II, sistematiza o
processo de execução, tratando-o sob diversas modalidades. Disso, tomando como
referência os variados aspectos da execução, a doutrina aponta as seguintes
classificações:
4.1 Quanto ao procedimento OU natureza do
título
POR FASE (cumprimento de
sentença) ou POR PROCESSO AUTÔNOMO (execução propriamente dita)
4.1.1 Execução por fase
(Processo sincrético, cumprimento de
sentença) – alcança os títulos executivos judiciais, exceto no caso do
parágrafo único do art. 475-N (títulos judiciais atípicos): a sentença penal condenatória; a sentença
arbitral; e a sentença estrangeira homologado pelo STJ.
A execução por fase
alcança as sentenças que reconheçam as seguintes obrigações:
- De fazer ou não fazer (art. 461);
- De entregar coisa (art. 461-A); e
- De pagar (art. 475-J)
4.1.2 Execução por processo
(Processo autônomo) - é própria dos os títulos executivos extrajudiciais (art.
585), mas também alcança alguns títulos judiciais, tais como: as
execuções contra a Fazenda. Pública
(arts. 730 e 731); a execução de
alimentos (arts. 732 e 735); e, excepcionalmente, os títulos judiciais
atípicos (parágrafo único do art. 475-N).
Em face das alterações do CPC, a doutrina vem tratando como EXECUÇÃO
apenas aquela efetuada por processo autônomo (Livro III do CPC, do art. 566 ao art. 795).
4.2 Quanto à natureza da prestação devida
4.2.1 No cumprimento de sentença, quanto à natureza
da prestação, a execução pode ser:
- De obrigação de fazer ou não fazer (art. 461);
- De entregar coisa certa ou incerta (art. 461-A); e
- De pagar (art. 475-J)
4.2.2
Na execução por processo, quanto à natureza da prestação, a execução
pode ser:
a)
Execução de obrigação de dar (ou entregar)
a.1)
DAR COISA, que pode ser
– certa (arts. 621 ao
628) e
- incerta ou indeterminada
(art. 629 ao 631).
a.2)
DAR DINHEIRO (ou execução por quantia certa), que pode ser:
- Execução por quantia certa contra devedor solvente (arts. 646 ao
724);
- Execução contra a Fazenda Pública (arts. 730 ao 731);
- Execução de prestação de alimentos (arts. 732 ao 735);
- Execução fiscal (Lei nº 6.830/80); e
- Execução por quantia certa contra devedor insolvente (arts. 748 ao
786-A).
b)
Execução de obrigação de FAZER (arts. 632 ao 638) e NÃO FAZER (arts. 642 e 643).
4.3 Quanto
à eficácia do título executivo
A execução, a rigor, é sempre definitiva. Contudo,
tendo-se em mente o objetivo de satisfazer o direito do credor no mais curto
prazo possível, desde logo já se executa o houver de incontroverso na execução,
daí a classificação e DEFINITIVA e PROVISÓRIA.
É definitiva quando
não houver qualquer discussão pendente (integralidade ou parte da execução).
Caso contrário, será provisória.
Há distinção no
procedimento, a depender de se tratar de
execução por fase e por processo.
a)
Execução por fase (tem previsão no art. 475-I, § 1º). É
definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se
tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito
suspensivo).
A
execução definitiva efetiva-se nos termos do art. 475-J, sendo processada nos
próprios autos, e a provisória, nos termos do art. 485-O, sendo processada em
autos suplementares, conforme dispõe o art. 475-O, § 3º.
b)
Execução por processo (regida pelo art. 587). A
simples interposição de embargos à execução não induz à execução provisória. É
preciso que o juiz lhe atribua efeito suspensivo.
4.4 Outras classificações
As classificações acima descritas
ganham outras formas e nomenclaturas, contudo, sempre esbarrando praticamente na
mesma substância. Veja-se, por exemplo, o quadro abaixo, em que se toma como
referência basicamente os mesmos elementos, surtindo o mesmo resultado:
CLASSIFICAÇÃO QUANTO À NATUREZA DA OBRIGAÇÃO
|
|||||
Obrigação de dar coisa
|
Execução de entrega de coisa certa
|
||||
Execução de entrega de coisa incerta
|
|||||
Obrigação de fazer e não fazer
|
Execução de obrigação de fazer
|
||||
Execução de obrigação de não fazer
|
|||||
Obrigação de pagar quantia certa
|
Obrigação de pagar quantia certa contra
devedor solvente
|
||||
Obrigação de pagar quantia certa contra
devedor insolvente
|
|||||
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TÍTULO EM QUE SE BASEIA
|
|||||
Títulos
executivos judiciais (Art. 475-N, CPC)
|
Cumprimento de sentença “stricto sensu”
|
Sentença judicial que reconheça obrigação de
fazer e não fazer (artigo 461, CPC)
|
|||
Sentença judicial que reconheça obrigação de
dar coisa (artigo 461-A, CPC)
|
|||||
Execução “sine
intervallo” (ou execução por fase - processo
uno)
|
Sentença judicial que reconheça obrigação de
pagar quantia;
Sentença judicial que reconheça
obrigação de pagar quantia (arts. 475-I e
475-J, CPC)
|
||||
Execução por processo
|
Sentença penal condenatória; Sentença
arbitral; Sentença estrangeira homologada pelo STF: depois de distribuída a
petição inicial e citado o executado, aplica-se o procedimento da nova
lei (art. 475-I ao 475-R, CPC)[1]
|
||||
Títulos
executivos extrajudiciais (Art. 585, CPC)
|
EXECUÇÃO
|
Livro II, CPC/artigos 566 e segs., CPC
|
|||
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO SEU CARÁTER
|
|||||
Execução definitiva
|
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, CPC
|
Fundada em título extrajudicial/sentença
passada em julgado
|
|||
Execução Provisória
|
Artigo 587, CPC
Artigo 475-I, par. 1º e 542, par. 2º, CPC
Artigo 475-O, CPC
|
Fundada em sentença pendente de recurso
desprovido de efeito suspensivo (RE e REsp).
Corre por iniciativa, conta e
responsabilidade do exequente, que se responsabiliza a reparar os danos do
executado, e exige “caução suficiente e idônea, arbitrada pelo
juiz e prestada nos próprios autos” (art. 475-O, I a III, CPC)
|
|||
5 REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de.
Aspectos polêmicos da nova execução. São Paulo: RT, 2006.
DONIZETTI, Elpídio.
Curso Didático de Direito processual Civil. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 47 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2007.
MEDINA, José Miguel
Garcia. Processo Civil Moderno. Execução, 2 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011.
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TEMAS PARA MONOGRAFIA EM MATÉRIA DE EXECUÇÃO CÍVEL
ARTIGOS JURÍDICOS, TCC, MONOGRAFIAS EM GERAL E TESES.
A
maior preocupação de todo graduando, sobretudo nos dois últimos semestres que
antecedem a formatura, é sem dúvida o
tão famoso Trabalho de Conclusão do Curso – TCC. No caso do Curso de Direito,
essa preocupação supera até mesmo o Exame da OAB, tido como “bicho papão” de
todo graduando. Todo esse desconforto psicológico tem início a partir da escolha
e definição do tema.
A
propósito, operando como professor de graduação do Curso de Direito, bem com em
pós-graduação, não raro sou interrompido no meio da aula para responder a questionamentos
atinentes a tema do TCC. Também recebo inúmeras solicitações de sugestão de
temas, tanto por e-mail quanto por telefone.
Pois
bem, foi pensando nessa questão que selecionei vários temas em diversas matérias,
que passarei a postar aqui neste espaço no intento de auxiliar a quem deles
quiserem se servir. Tais temas se encaixam bem tanto para o TCC quanto para
qualquer monografia, dissertação ou tese, inclusive, para prova dissertativa de concuros públicos e de Exame da OAB, cabendo observar que alguns dos temas aqui postados foram extraídos exatamente de provas realizadas e de Exame da OAB.
Iniciarei
postando alguns temas voltados mais propriamente para a Execução no Processo Civil Brasileiro. Logo mais estarei postando
outros temas, de matérias diversas, tais como Direito Previdenciário, Direito Constitucional,
Direito do Trabalho, Direito Ambiental, Direito Administrativo etc.
A cada tema
proposto, tentarei expressar alguma orientação no sentido de apontar os
objetivos a serem alcançados com a pesquisa, deixando a cargo de cada um o
progresso desses objetivos.
Desta vez
selecionamos sete temas, quais sejam:
1. AS IMPLICAÇÕES DAS REFORMAS NO PROCESSO DE EXECUÇÃO EM
RELAÇÃO AOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
O
aluno procederá a uma pesquisa nos próprios juizados especiais para verificar o
que as reformas trouxeram de positivo ou negativo.
2. A EXECUÇÃO CÍVEL NOS JUIZADOS ESPECIAIS
Do
mesmo modo, seria elaborada pesquisa nos próprios juizados especiais para
verificar como se dão as execuções de cada umas das diversas espécies de
obrigações nos juizados especiais cíveis.
3. A
IMPORTÂNCIA PRÁTICA DOS PROVIMENTOS MANDAMENTAIS NO SISTEMA PROCESSUAL
BRASILEIRO
Buscar-se-á
avaliar a questão do cumprimento imediato da decisão judicial, com a previsão
de mecanismos de coerção indireta, como a multa diária por descumprimento.
4. OS EFEITOS PRÁTICOS DA UNIFICAÇÃO DAS FASES DE
CONHECIMENTO E EXECUÇÃO EFETUADA PELA ÚLTIMAS REFORMAS DO CPC
Conforme
se sabe, a execução de títulos executivos judiciais, via de regra, deixou de
ser um processo autônomo, passando a ser mais uma fase procedimental
denominada cumprimento de sentença. Além do requerimento do autor, a execução
também pode ser iniciada pelo próprio órgão jurisdicional ex officio,
dispensando-se, em ambos os casos, a nova citação do réu. No que isso melhorou
em termos de efetividade do processo?
5. A POSSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO DO BEM POR INICIATIVA
PARTICULAR, INTRODUZIDA PELA LEI N° 11.382/2006: EFEITOS PRÁTICOS. VANTAGENS E
DESVANTAGENS
Aqui
se fará um estudo acerca do novo instituto, ALIENAÇÃO
DO BEM POR INICIATIVA PARTICULAR, evidenciando
quais as suas vantagens e desvantagens para a efetividade do processo. Também
poderão ser evidenciados os obstáculos enfrentados no campo prático para a
realização do procedimento, sugerindo-se aos magistrados e ao próprio
legislador opções de melhoramento do instituto.
6. INVERSÃO DA PRIORIDADE EM RELÇAO AOS ATOS
EXPROPRIATÓRIOS, NOS TERMOS DA LEI N. 11.382/2006: CONSEQUÊNCIAS EM
TERMOS DE EFETIVIDADE DO PROCESSO
A
ideia aqui é, a partir da identificação do motivo que levou o legislador a
alterar a sequência de prioridades dos atos executivos anteriormente
estabelecida, na qual o leilão ou praça figuravam num plano prioritário como
primeira opção do exequente, seguida da adjudicação até se chegar ao usufruto
de imóvel ou empresa.
Atualmente,
se o exequente não tem interesse em adjudicar o bem, poderá proceder à
alienação particular, ficando o leilão ou praça como última opção. No que isso
melhor para a efetividade da prestação jurisdicional?
7. EFEITO PRÁTICO DA MULTA DE 10% (DEZ POR CENTO),
PREVISTA NO ART. 475-J, DO CPC, IMPOSTA AO DEVEDOR QUE NÃO EFETUAR O PAGAMENTO
NO PRAZO DE 15 DIAS.
A
ideia aqui é avaliar se a referida multa traz alguma contribuição para afastar
a inadimplência do devedor. Para tanto, faz se necessário um estudo acerca de
tal multa, envolvendo a sua natureza jurídica; o seu montante de 10%, quando
comparado à remuneração de capital atualmente praticada pelo mercado
financeiro, a exemplo da poupança, que varia em torno de meio por cento; bem
como a busca de dados estatísticos na comarca local, ou em determinado juízo,
acerca do índice de inadimplência dos devedores, comparando-se com a situação
existente antes da nova regra.
Boa sorte!
Boa sorte!
quarta-feira, 16 de maio de 2012
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CONSIDERAÇÕES PROGNÓSTICAS DO REEXAME NECESSÁRIO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Clemilton
da Silva Barros
Resumo: O texto
remete a um breve histórico da remessa necessária, apontando as diversas normas
que a prevê no nosso ordenamento jurídico, além do art. 475 do Código de
Processo Civil, com uma abordagem das suas principais características e
natureza jurídica, desaguando na velha polêmica estabelecida em torno do
princípio da “non reformatio in pejus”, no que defende o autor a
impossibilidade de agravamento da situação do ente público em sede de remessa
necessária, especialmente por força do princípio da adstrição ou da congruência
(arts. 128 e 460 do CPC), sempre evidenciando o entendimento expressado no
âmbito da doutrina e da jurisprudência.
Palavra-chave: Fazenda Pública; remessa necessária; non reformatio in pejus; interesse público.
Sumário: 1 Introdução; 2 Evolução histórica; 3 Denominações; 4
Natureza jurídica; 4.1 A remessa obrigatória e as espécies recursais; 4.1.1 O
aspecto da voluntariedade dos recursos; 4.1.2 Os pressupostos recursais; 4.1.3
A reapreciação da matéria e os efeitos suspensivo e devolutivo; 4.1.4
Legitimidade para a remessa necessária; 4.1.5 Os princípios recursais; 4.1.6 A
remessa necessária como condição de validade e de eficácia da sentença; 5 O
objeto do reexame necessário e as suas hipóteses de cabimento; 5.1 O art. 475
do CPC após as alterações da lei
10.352/01; 5.2 Outras hipóteses de remessa necessária; 6 A remessa necessária
no contexto das reformas das decisões judiciais; 6.1 O princípio da non
reformatio in pejus; 6.2 O princípio da non reformatio in pejus e a remessa
necessária; 7 Conclusão; 8 Referências.
1 INTRODUÇÃO
Predomina
entre nós a regra segundo a qual, esgotados os recursos possíveis, ou decorrido
o prazo de sua interposição, as decisões judiciais fazem coisa julgada, e aí se
tornam imutáveis. Aliás, essa é a mais típica das características da jurisdição.
E uma vez transitada em julgado, a decisão judicial passa a produzir plenamente
seus efeitos.
Mas
a essa regra, ou regras, o ordenamento jurídico opõe algumas exceções. A ação
rescisória, por exemplo, observado o prazo decadencial de dois anos, tem o
condão de revolver a matéria, embora já estando sob o manto da coisa julgada.
Uma
outra exceção emerge do art. 475 do CPC, o qual relaciona nos seus incisos I e
II situações em que a sentença, conquanto já decorrido o prazo de interposição
do competente recurso, não alcança o trânsito em julgado, e não produzirá
efeito algum antes de ser reapreciada pelo Tribunal, situação que caracteriza o
chamado duplo grau obrigatório de jurisdição,
nominado pela doutrina de “remessa obrigatória” ou simplesmente “reexame necessário”, só alcançando as
sentenças, na forma do art. 162, § 1º, do CPC, nunca as decisões
interlocutórias.
Tal
fenômeno era chamado de “apelação de ofício” pelo Código de Processo Civil de
1939, consistindo em condição de eficácia da sentença, que não fará coisa
julgada antes de reexaminada pelo Tribunal. Ou seja, a qualquer tempo a matéria
poderá ser revolvida, e se vier a ser satisfeitos os termos da sentença sem a
apreciação do órgão revisor, essa satisfação estará eivada de vício insanável.
Conforme
veremos, há ainda muita controvérsia envolvendo alguns aspectos do reexame
necessário, sobretudo no tocante à sua natureza jurídica, alguns doutrinadores entendendo
tratar-se de uma espécie recursal, o que é combatido por outros. Desse
questionamento vem a indagação, se os seus efeitos estão restritos a beneficiar
a Fazenda Pública ou se a qualquer das partes. Indagação esta que constitui o
objeto nuclear deste estudo, na medida em que, na hipótese de o Tribunal vir a
agravar a situação da Fazenda Pública pela via da remessa necessária, para uns estaria
caracterizada a reformatio in pejus,
o que seria vedado pelo ordenamento processual vigente. Outros, ao contrário,
entendem perfeitamente possível tal agravamento.
Tecidas essas considerações, passaremos à análise do
reexame necessário, seu disciplinamento em nosso ordenamento jurídico, evolução
históricas, natureza jurídica, terminologia e a possibilidade de aplicação do
princípio non reformatio in pejus, no
que também buscaremos os apontamentos da doutrina e da jurisprudência sobre o
tema.
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
O instituto do reexame obrigatório adotado por nosso ordenamento jurídico tem suas origens encravadas
no Direito Lusitano, datada, a lei que o criou, de 12
de março de 1355.
Num primeiro momento a sua aplicação se restringiu ao ambiente
das questões processuais penais, com a finalidade de conter eventuais excessos da parte dos magistrados quando do
julgamento de matéria criminal. Logo mais, com esses mesmos fins, integraria as
Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, então chamado de “apelação ex officio”.
No Brasil, conforme anota Jorge
Tosta (2001, p. 12), a primeira norma jurídica a consagrar o referido instituto
é datada de 04/10/1831 (Lei nº 04/1831, art. 90), impondo ao juiz a obrigação
de apelar nas causas em que restasse vencida a Fazenda Pública. Nesse momento histórico, ao recorrer de ofício, o juiz operava efetivamente
na defesa dos interesses da
Fazenda Pública, assemelhando-se
a uma espécie de causídico desta, e o que se buscava objetivamente era a
reforma do julgado, e não a sua simples revisão pelo Tribunal no sentido de
aperfeiçoamento da sentença, como é hoje.
Mais de um século depois de introduzido no ordenamento
jurídico brasileiro, reexame obrigatório integraria o nosso
primeiro grande diploma de normas procedimentais, o Código de Processo Civil de
1939. Trinta anos depois, o Decreto-Lei nº 779/1969 disciplinaria a sua
aplicação também no âmbito do Processo do Trabalho.
O Código de Processo Civil de 1939 assim dispunha:
Art. 822 – A apelação necessária ou ex
officio será interposta pelo juiz mediante simples declaração na própria
sentença.
Parágrafo único. Haverá apelação
necessária:
I – Das sentenças que declararam a
nulidade de casamento.
II – Das que homologam o desquite
amigável.
III – Das proferidas contra a União, o
Estado ou o Município.
Não é difícil notar a realidade social insculpida no
texto revogado, sob a histórica preponderância do princípio inquisitório, e a
importância do poder religioso, chegando este a se confundir com o próprio
poder estatal. A previsão era nitidamente autoritária, deixando os direitos dos
cidadãos comuns em posição infinitamente inferior, revelando um total desprezo
aos princípios do contraditório, da isonomia e do devido processo legal.
Daí em diante, como bem noticia Samir José Caetano Martins[1],
diversas leis extravagantes trouxeram disposições semelhantes, sempre
associadas à tutela do erário, citando a Lei nº 2.664, de 03/12/1955, que
dispõe sobre ações judiciais decorrentes de atos das Mesas das Câmaras do
Congresso Nacional e da Presidência dos Tribunais Federais; a Lei nº 6.014, de
27/12/1973, que inseriu a previsão do duplo grau obrigatório na Lei nº 1.533,
de 31/12/1951 (Lei do Mandado de Segurança) e na Lei nº 4.717, de 29/07/1965
(Lei da Ação Popular); a Lei nº 6.071, de 03/07/1974, que inseriu a previsão do
duplo grau obrigatório no Decreto-Lei nº 3.365, de 21/07/1941 (Lei Geral das
Desapropriações) e a Lei nº 8.437, de 30/06/1992 (que dispõe sobre medidas
cautelares contra atos do Poder Público). Em 17 de abril de 1963, pelo Decreto nº 3.069, tal instituto viria a
se estender também às causas matrimoniais.
O legislador de 1973, seguindo de perto a evolução
político-social e atentando para uma linguagem tecnicamente mais satisfatória
aos intentos jurídicos, reeditou o instituto do “reexame necessário” ou “remessa
oficial”, também conhecida por “remessa necessária” e “duplo grau de jurisdição
obrigatório”, outrora “recurso de ofício” ou “apelação de ofício”. O fato é que
com o novo Código de Processo Civil o instituto em destaque ganhou feições bem mais apropriadas aos preceitos processuais antes
ignorados.
Com efeito, no texto original do Código de 1973 ainda
figurou a previsão do reexame necessário de sentença que anulasse casamento (art. 475, I), expressando a
manutenção da influência do poder religioso. Mas a revisão produzida pela Lei
nº 10.352, de 26/12/2001, tal excluiu tal previsão, no que o legislador também
teve o cuidado de estabelecer situações limitadoras, como consta do atual texto:
Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de
jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a
sentença: (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
I - proferida contra a União, o Estado,
o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de
direito público; (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
II - que julgar procedentes, no todo ou
em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585,
VI). (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, o
juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o
fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los. (Incluído
pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)
§ 2o Não se aplica o disposto neste
artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo
não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência
dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor. (Incluído
pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)
§ 3o Também não se aplica o disposto
neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do
Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior
competente. (Incluído
pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001).
Vê-se que é notável a evolução, a começar pelo abandono
à antiga terminologia.
3 DENOMINAÇÕES
Como
declinado, muitas denominações têm sido atribuídas ao instituto do reexame
necessário, ora sendo chamado de remessa obrigatória, ora de remessa oficial, remessa
necessária, recurso de ofício (ou ex
officio), apelação de ofício, e ainda de duplo grau de jurisdição
obrigatório.
Todas
essas expressões buscam apenas traduzir o modo como o instituto se lança
concretamente no mundo jurídico, alcançando as hipóteses a que se destina, por
norma revestida de imperatividade absoluta, tendo em vista o interesse público,
obrigando o juiz a submeter seu entendimento singular à avaliação de um
entendimento colegiado, buscando amparar não exatamente o indivíduo, mas o
interesse de toda a sociedade, concretizado na prestação jurisdicional que
venha a conter o maior grau de correção possível.
Até
mesmo por força de hábito, todas essas denominações ainda são bastante
utilizadas. E embora algumas se afigurem
impróprias, em face do atual tratamento normativo, doutrinário e
jurisprudencial, não há no meio jurídico quem desconheça qualquer delas. Entretanto,
como estamos a falar de um instituto jurídico, portanto, inserto no âmbito de
uma ciência, impõe que sejamos o mais didático e objetivo possível, embora nunca
descuidando do cunho científico, eis que no estudo de qualquer ciência os nomes
das coisas, sobretudo dos seus institutos, têm sempre fundamental relevo.
Com
efeito, os institutos tanto devem ter um nome específico, quanto esse nome deve
se situar o mais próximo possível da sua natureza e do seu objeto. Nesse diapasão,
desde logo afastaremos as expressões “recurso de ofício” (ou ex officio) e “apelação de ofício”, como assim já procedeu
o Legislador de 1973, abrindo mão das terminologias adotadas pelo Código
anterior.
Bom ressaltar que o Código de Processo Civil de 1973
não atribuiu denominação alguma ao instituto em comento, limitando-se a
descrever as suas hipóteses de incidência, conforme se nota pela disposição do
art. 475, cuja atual redação é fruto da Lei nº
10.352, de 26/12/2001. Por outro lado, também não acolheu a terminologia
adotada pelo Código revogado (apelação ex
officio). Diante disso, a doutrina já foi quem se incumbiu de lhe atribuir nomes,
ora chamando-o de reexame necessário, ora
de remessa necessária e ainda de reexame
obrigatório, denominações estas que expressam o mesmo grau de significância,
adequando-se perfeitamente ao seu objeto, à sua natureza jurídica e ao seu conteúdo.
Reexame necessário parece-nos a expressão mais
conveniente, inclusive, sendo a mais preferida da doutrina e da jurisprudência.
4 NATUREZA JURÍDICA
A
definição da natureza de um dado instituto inicia-se com a tentativa de sua identificação
perante os demais institutos que lhes são similares, considerando o seu
universo científico. Nisto, parte-se de um procedimento de simples comparação, individualizando-o
e detectando suas particularidades e características mais singularizadas, até se
saber em que ramo ou sub-ramo da ciência ele se insere e a que regras se
submete. Consiste, portanto, tal procedimento em se definir a real posição do
instituto considerado dentro de um sistema, categorizando-o, identificando seu
endereçamento no universo em que se encontra, tudo, em face do seu conteúdo e das suas características.
Sendo assim, o
universo dos institutos jurídicos que poderíamos dizer similares ao reexame necessário é aquele no qual se encontram os recursos. Aliás, a
primeira idéia que se tem acerca do reexame
necessário é a
de que se trata de uma espécie recursal. E isto é inevitável, haja vista o
tradicional tratamento dado ao referido instituto pelo ordenamento jurídico
brasileiro, bem assim pelo seu próprio objeto, consistente na reanálise do
julgado pelo órgão revisor, objeto este muito peculiar aos dos recursos.
É de se lembrar que no Código de Processo Civil de 1939 o reexame
necessário foi disciplinado com feições de recurso, inclusive, figurando naquele
Código entre as espécies recursais (art. 822) e com nome de recurso (apelação ex officio), o que lhe rendeu muitas
críticas durante toda a sua vigência.
Atento
a esse equívoco teórico-legislativo, como já ressaltado, o legislador de 1973
procedeu às devidas retificações, não somente alterando a terminologia do
instituto em comento, mas também a sua localização no contexto do novo Código,
inscrevendo-o no Título VIII, distinto, portanto, daquele destinado a tratar
dos recursos (Título X).
4.1 A remessa obrigatória e as espécies recursais
Conforme
vimos, o novo CPC caminhou no sentido de exterminar a controvérsia que girava
em torno da natureza jurídica da remessa oficial, porquanto, dentre os muitos
reclames da doutrina, os mais comoventes acentuavam faltarem-lhe os requisitos próprios dos
recursos, que os tornam os verdadeiros instrumentos de impugnação das decisões
judiciais adotados pelo nosso ordenamento jurídico. Não afastou de todo as
controvérsias, mas admitamos que amenizou sobremaneira os debates e as críticas.
4.1.1 O aspecto da voluntariedade dos recursos
ausente na remessa necessária
A
bem da verdade, a nova disposição legal sobre já seria mais do que suficiente
para privar do reexame necessário a idéia de similaridade com as espécies
recursais. Basta a simples observância da sistemática adotada pelo legislador
de 1973 para concluir-se que foi clara a intenção de distanciá-lo dos recursos
em geral, inscrevendo-os em Títulos distintos. Todavia, há ainda quem defenda
tratar-se de uma autêntica espécie de recurso.
Pela simples definição de “recursos” não é fácil de
se delimitar a exata distinção entre estes e o reexame necessário. Isto porque
todos têm basicamente o mesmo alcance prático, encampando também o mesmo
conteúdo teórico.
A doutrina expressa diversos definições para os
recursos. Uns os definem como remédios processuais postos pela lei à disposição
das partes, do Ministério Público ou de terceiros, submetendo a decisão
judicial a um novo julgamento por órgão judicial hierarquicamente superior
àquele que a proferiu.
Frederico Marques (2003, p. 381), por exemplo, ao definir recurso, pontifica:
Um procedimento
que se forma para que seja revisto pronunciamento jurisdicional contido em
sentença, decisão interlocutória ou acórdão. O mencionado autor prossegue (ob.
cit. p. 387), expressando que se trata de um
“quase-recurso”, inclusive, com efeito devolutivo e efeito suspensivo e, em
relação ao julgamento nele proferido, aplicam-se as regras concernentes à
apelação, pois se trata de remédio destinado a rever sentenças de primeira
instância. Por isso mesmo, o vencido, ainda que não tenha interposto apelação
voluntária, pode entrar com embargos infringentes, se for o caso.
Para Humberto Theodoro Júnior (1992, p. 542), na sua
acepção técnica e restrita, o recurso é um “meio ou poder de provocar o reexame
de uma decisão, pela mesma autoridade judiciária, ou por outra hierarquicamente
superior, visando obter a sua reforma ou modificação, ou apenas a sua
invalidação”.
Alexandre Freitas Câmara (2007, p. 55), citando
Babosa Moreira, acentua que recurso é “o remédio voluntário idôneo a ensejar,
dentro do mesmo processo, a reforma, a
invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão judicial que se
impugna”.
Da análise de todas essas citações podemos destacar,
sobretudo, que os recursos são movidos pela interesse da parte, daí a
consagração da alcunha “remédio
voluntário”, o que, efetivamente não se observa em relação ao reexame
necessário.
Na
verdade, a doutrinária é amplamente majoritária no sentido de negar natureza
recursal ao reexame necessário, no que se citamos Nelson Nery Júnior e Rosa
Nery (2003, p. 813), para quem a natureza jurídica do referido
instituto é de “condição de eficácia da sentença que, embora existente
e válida, somente produzirá efeitos depois de confirmada pelo Tribunal”.
4.1.2 Os pressupostos
recursais
Bom, nessa idéia de distinção, é importante invocar os
chamados requisitos de admissibilidade dos recursos (alguns preferem
pressupostos recursais) para que se dê o provimento jurisdicional,
indispensáveis, pois, aos recursos e ausentes no reexame necessário. Tais requisitos
(ou pressupostos) são classificados em intrínsecos e extrínsecos.
Os primeiros operam como prolongamento das condições
da ação, tendo em vista que o direito de recorrer se traduz em expressa
manifestação do direito de ação. Os pressupostos intrínsecos, portanto, estão
relacionados com o cabimento do recurso, a legitimação das partes e com
interesse de agir (interesse de recorrer).
Já os requisitos extrínsecos operam como
prolongamento dos pressupostos processuais. São fatores externos à decisão que
se busca reformar, mais voltados, pois, para as questões procedimentais,
atinentes à tempestividade, ao preparo, à inexistência de fato impeditivo ou
extintivo do direito de recorrer; à regularidade formal etc.
Enquanto o regular processamento dos recursos em
geral depende da caracterização dos requisitos recursais, no reexame necessário
não se cogita de tais requisitos. O juiz prolator da sentença, ao contrária do
que ocorre na hipótese de recurso, apenas remete os autos ao órgão ad quem, por simples despacho, por força
da disposição legal, sem perquirir os pressupostos recursais.
4.1.3 A reapreciação da matéria e os efeitos
suspensivo e devolutivo
Bom, por algumas das características verificadas no
reexame necessário até seria possível enquadrá-lo nas definições de recursos, isto,
se tomássemos como referencial a reapreciação da matéria e a presença dos
efeitos suspensivo e devolutivo, possíveis em ambos os institutos. Estes parecem-nos
ser os únicos pontos em comum entre os recurso e reexame necessário. Já as
particularidades são inúmeras, tornando-os por demais distintos, impedindo que
lhes sejam dados tratamentos idênticos.
4.1.4 Legitimidade para a remessa necessária
A
análise de um único requisito atinente aos recursos já seria bastante para
evidenciar a distinção entre estes e o reexame necessário.
Vejamos,
por exemplo, no tocante à legitimidade para a interposição do recurso. No
termos do art. 499 do CPC, detêm legitimidade para recorrer, a parte vencida, o terceiro prejudicado
(entenda-se terceiro interressado) e o Ministério
Público.
No
caso do reexame necessário podemos dizer que a legitimidade recai sobre o
próprio juiz prolator da sentença, a quem caberá a iniciativa de envio dos
autos ao juízo ad quem. E mais, esta
legitimidade se dá exclusivamente por força de lei, e não por prerrogativa ou
ônus.
4.1.5 Os princípios recursais
Os princípios recursais constituem outro ponto de
distinção entre os recursos e a remessa necessária.
Sobre os recursos incidem diversos princípios
específicos, como o princípio da unicidade ou da singularidade, segundo o qual
para cada pronunciamento jurisdicional a previsão é de uma única espécie
recursal; o princípio da taxatividade, garantindo que toda espécie recursal
deve está prevista em lei; o princípio da fungibilidade, que permite, no caso
de dúvida objetiva, o conhecimento de um recurso por outro; o já anunciado
princípio da voluntariedade, que exige a iniciativa da parte; o princípio non reformatio
in pejus, pelo qual não é permitido agravar a situação do recorrente.
Enfim, são diversos os princípios aplicáveis aos recursos. E como já destacado,
tais princípio não são aplicados ao reexame necessário.
4.1.6 A remessa necessária como condição de validade e de eficácia da sentença
Como já declinado, é amplamente majoritário o
entendimento que nega ao reexame necessário a natureza de recurso. Tal
entendimento partiria do próprio legislador de 1973, que o deslocou do capítulo
pertinente aos recursos, para o capítulo concernente à sentença e à
coisa julgada.
Desse modo, afastada a natureza recursal e
reconhecida a singularidade do reexame necessário, a conclusão da doutrina é de
que se trata de um instituto sui generis,
cuja natureza jurídica é de elemento condicional da eficácia da sentença, e não de uma
espécie de recurso, bastando mencionar a ausência do elemento volitivo,
indissociável dos recursos em geral.
Aliás, enfatiza Nelson Nery Júnior (2003, p. 813)
que à remessa necessária faltam a voluntariedade, a tipicidade, a
dialeticidade, o interesse em recorrer, a legitimidade, a
tempestividade e o preparo, características e pressupostos de
admissibilidade dos recursos. De outro modo, nenhum dos
princípios recursais é aplicados à remessa obrigatória.
Há, porém, quem entenda tratar-se o reexame
necessário de uma autêntica espécie recursal, a exemplo de Sérgio Bermudes, em
sua obra Comentários ao Código de Processo Civil, 2ª ed., vol. VII, São Paulo:
RT, 1977, pp. 32-33, citado por Alexandre Câmara (2007, p. 3) que o acompanha
nesse entendimento, mas e corrente minoritária.
Em suma, os verdadeiros meios de impugnação
das decisões judiciais são os recursos. O reexame necessário não. Este é apenas
condição de
validade e eficácia da sentença nas causas em que seja expressamente
consignada a sua incidência, nos termos do CPC, art. 475, e das demais
hipóteses previstas no ordenamento jurídico. A exceção, especialmente no tocante à
eficácia, flui da Lei
1.533/51, art. 12,
parágrafo único, em se tratando de ação de mandado de segurança, em que a sentença
produzirá efeitos de imediato com a sua publicação, antes mesmo da remessa dos
autos ao Tribunal para o reexame necessário.
5 O OBJETO DO REEXAME NECESSÁRIO E AS SUAS HIPÓTESES
DE CABIMENTO
Conforme já estudamos no item anterior, o vigente Código
de Processo Civil prevê o reexame necessário no seu art. 475, cujo objeto
primordial, como se extrai do próprio texto da lei, consiste no resguardo do
interesse público, traduzido no máximo de certeza e justiça das sentenças em
que haja sucumbência da Fazenda Pública. Assim, verificada tal situação, independente de
haver provocação da parte interessada, o juiz ordenará a remessa dos autos ao
tribunal, sob pena de a sentença não produzir seus respectivos efeitos. Não o
fazendo o juiz da causa, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
Mesmo
antes das inovações trazida pela Lei nº 10.352/2001, não se cogitava de outro
elemento ensejador da remessa necessária que não fosse o interesse público. Na
antiga redação do art. 475 do CPC, a remessa necessária era obrigatória também
em caso de sentença anulatória de casamento, matéria outrora reputada de
elevado interesse público, merecendo também um grau mais elevado de atenção por
parte do Estado. Todavia, mediante a Lei nº 10.352/2001, o legislador
reformador entendeu que tal hipótese já
não requer tanta proteção.
É preciso, porém, ressaltar que esse interesse
público de que falamos sofre variações de acordo com o objeto da remessa
necessária na hipótese considerada. Expliquemos: é que o instituto da remessa
necessária não é exclusividade do CPC, tendo previsão também em diversos outros
diplomas normativos, e em todos eles sempre em prol do interesse público, mas
nem sempre esse interesse público se traduz na defesa da Fazenda Pública.
Com efeito, todas as situações de cabimento da
remessa necessária previstas no nosso ordenamento jurídico seguem o mesmo
procedimento, resumido no encaminhamento dos autos, pelo próprio juiz que
proferir a sentença, ao órgão revisor para a devida reapreciação. Mas o objeto
nem sempre o mesmo, embora em todas as situações o fim último seja sempre o
interesse público.
Veja-se que o interesse público efetivamente
objetivado pela remessa necessária prevista no CPC, art. 475, de fato está
centrado na defesa da Fazenda Pública. Noutro giro, no caso da remessa
necessária em sede de Ação Popular o interesse público protegido tem seus
reflexos voltados para a verificação minuciosa do pedido popular e da causa de
pedir popular, de modo a proporcionar um novo exame sobre a matéria, quando a
sentença extinguir o processo por carência ou julgar improcedente o pedido
popular.
Na ação de mandado de segurança, igualmente, o
interesse público protegido com a remessa necessária não corresponde exatamente
à defesa da Fazenda Pública, mas da Administração Pública. Enfim, existem
diversas hipóteses em que o interesse público protegido na remessa necessária é
distinto do interesse da Fazenda Pública, embora também seja interesse público.
5.1 O art. 475 do CPC após as alterações da Lei 10.352/01
As hipóteses originalmente dispostas no Código sofreram
alterações pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001. Foi então excluído o inciso I
(que aplicava a remessa necessária às sentenças declaratórias de nulidade do
casamento); reescrito o inciso II, que passaria a ser inciso I, nele sendo incluídas
outras figuras da Fazenda Pública, substituindo-se a expressão "proferida
contra a União, o Estado e o Município", por "proferida contra a
União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as autarquias e fundações
de direito público".
Vê-se que foram incluídas expressamente no contexto
da norma as autarquias e fundações públicas, o que há muito já era admitido na
prática forense, de modo que a inovação deu-se apenas para positivar a matéria,
não se tratando, efetivamente, de alargamento das hipóteses de cabimento da
remessa necessária, mesmo porque nunca fez sentido a exclusão desses dois entes,
também de direito público, e que, igualmente à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios, sempre gozaram de outros privilégios processuais, a
exemplo do prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, execução
mediante precatório etc. Aliás, o que fez a lei a Lei nº 10.352/01 foi
simplesmente trazer para o bojo do Código de Processo Civil um consenso da
prática jurídica, que, inclusive, já
havia sido positivado pela Lei nº 9.469/97
(art. 10º).
Nesse mesmo sentido, a expressa inclusão do Distrito
Federal no rol dos beneficiários da remessa necessária, que se deu apenas para
reparar a lacuna deixada pelo legislador de 1973, porquanto ninguém jamais
duvidou de que ao Distrito Federal seria estendido o mesmo tratamento conferido
aos demais entes federativos.
Com a referida Lei nº 10.352/01, o inciso III passou
a ser inciso II, com modificação do texto. Antes constava:
III
– que julgar improcedente a execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art.
585, número VI).
Após a reforma vigora a seguinte redação:
II
- que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida
ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
Foi
substituída a expressão “que julgar
improcedente a execução” pela
expressão “que julgar procedentes, no
todo ou em parte, os embargos à execução”. A alteração buscou apenas
corrigir a imprecisão literal existente no texto anterior, que se referia
impropriamente à “improcedência da execução”. Para muitos, na execução não se deve
falar em improcedência do pedido satisfativo, pois não há uma apreciação
cognitiva propriamente. É possível sim, em certas situações, falar-se em improcedência
dos embargos à execução, pois nestes é que há uma efetiva atividade cognitiva. O
legislador lapidou a literalidade do comando legal para então adequá-lo à
devida técnica.
O
novo texto, ao falar dos embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública,
repetiu a remissão ao art. 585, inciso VI, que trata dos títulos executivos extrajudiciais. Tal
dispositivo, com a Lei nº 11.382/06, foi renomeado, deixando de
ser inciso VI e passando a figurar como inciso VII do referido artigo,
constando a seguinte redação:,
VII - a certidão de
dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na
forma lei;
Pois bem, a situação a que se refere o inciso II do art. 475,
remete-nos à execução fiscal, regulada pela Lei nº 6.830/80, consistindo no
processo de execução da dívida ativa da Fazenda Pública de qualquer das esferas
da federação, devendo-se entender por dívida ativa, conforme dispõe o art. 2º
da lei mencionada, toda aquela definida como tributária ou não-tributária na
Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, ou seja,
qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei à União, aos Estados, ao
Distrito Federal, aos Municípios e às suas respectivas autarquias e fundações
públicas. Em suma, é dívida ativa todo crédito devido à Fazenda Pública.
O referido inciso VII do art. 585 do CPC é quem define o
título executivo apto a deflagrar a execução, que se inicia, obviamente, pela apresentação
de uma petição inicial devidamente instruída com a Certidão de Dívida Ativa.
Citado o devedor, este poderá opor embargos à execução, na forma do art. 16 da
citada Lei de Execução Fiscal. Do julgamento destes, na forma do art. 475,
inciso II, é que caberá a remessa necessária, caso a sentença acolha, total ou
parcialmente, as alegações do executado embargante, ou seja, julgue
contrariamente à Fazenda Pública.
Convém alertar que, para os fins do disposto do art. 475,
inciso II, do CPC, a sentença que acolher a exceção de executividade (ou
pré-executividade) interposta pelo devedor equivale à sentença de procedência
dos embargos. Neste sentido Costa Machado (2006, p. 677).
É oportuno ressaltar que em se tratando de embargos do
devedor opostos pela Fazenda Pública, mesmo sendo estes julgados improcedentes,
não há o duplo grau obrigatório, porquanto, em tal hipótese certamente teríamos
um caso de execução de título judicial, com a Fazendo Pública operando na
qualidade de executada, e aí já restaria superada a fase cognitiva, quando, possivelmente
teria se dado o uso da remessa necessária. Desse modo, a previsão de uma nova
remessa necessária, diante da sucumbência da Fazenda Pública nos embargos do
devedor, corresponderia à duplicação do instituto. Veja-se que a hipótese do
art. 475, II, do CPC está restrita ao caso do art. 585, inciso VII, que trata
de uma das espécie de título extrajudicial, cuja execução se procede sem que tenha
havido uma fase cognitiva, como é curial
nas execuções de títulos extrajudiciais.
A lei modificadora também transformou o parágrafo
único em parágrafo 1º e incluiu os parágrafos 2º e 3º, cujos teores traduzem dois
freios ao cabimento da remessa necessária. Assim, embora sucumbente a Fazenda
Pública, não haverá reexame obrigatório
sempre que a condenação, ou o direito controvertido, corresposder a valor certo não excedente a 60 (sessenta)
salários mínimos, bem como no caso de procedência
dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor, e
também quando a sentença estiver fundada
em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula do
tribunal superior competente.
Na primeira hipótese o legislador apenas
seguiu a linha das chamadas “causas de pequeno valor”, já adotada para definir
a nova alçada do procedimento sumário, prevista no inciso I do art. 275 do CPC,
visando, sobretudo, desafogar os tribunais, dispensando a remessa necessária quando
a condenação ou o direito controvertido não superar 60 salários mínimos.
Já no caso do § 3º, o critério
vislumbrado está relacionado com a plausibilidade do direito discutido, numa clara
homenagem à jurisprudência dos STF e dos Tribunais Superiores, evitando assim o
retardamento da prestação jurisdicional. Nos moldes da norma anterior não fazia
qualquer sentido o duplo obrigatório quando a sentença, para condenar a Fazenda
Pública, fundava-se em jurisprudência do STF ou em súmula do Tribunal Superior
competente, uma vez que instância especial seria confirmada a sucumbência.
5.2 Outras hipóteses de remessa necessária
A remessa necessária não se limita
às previsões dos incisos I e II do art. 475 do CPC. Diversas uutras hipóteses
são previstas no ordenamento jurídico, conforme demonstraremos a seguir.
O art. 2, parágrafo único da a Lei 1.533/51 (Lei da Ação de Mandado de
Segurança) também prevê a remessa necessária, assim dispondo:
Art. 12 - Da
sentença, negando ou concedendo o mandado cabe apelação. (Redação dada pela Lei
nº 6.014, de 1973)
Parágrafo
único. A sentença, que conceder o mandado, fica sujeita ao duplo grau de
jurisdição, podendo, entretanto, ser executada provisoriamente. (Redação dada
pela Lei nº 6.071, de 1974).
Do mesmo modo, a Lei 4.717/65 (Lei da Ação Popular), cujo art. 19 prevê a remessa obrigatória quando a sentença
concluir pela carência ou pela improcedência da ação,
Art. 19. A
sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita
ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada
pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito
suspensivo. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973).
Na previsão do art. 19 da Lei da
Ação Popular a remessa necessária não busca propriamente a proteção da Fazenda
Pública, e sim, da sociedade, do interesse público. Sendo qualquer
cidadão parte legítima para propor ação popular que, em tese, busca proteger o
interesse geral, a norma estabelece a revisão obrigatória de sentença que extinguir o feito por carência ou que julgar improcedente
o pedido popular. Aqui fica bem clara a distinção
entre interesse da Fazenda Pública e interesse público.
Também nas causas relativas à
especificação da nacionalidade brasileira, nos termos do art. 4º, § 3º, da Lei
nº 818/1949 (regula a aquisição, a perda e a reaquisição da nacionalidade, e a
perda dos direitos políticos), com as alterações produzidas pela Lei nº
5.145/1966 e pela Lei nº 6.014/1973, in
verbis:
Art. 4º - O
filho de brasileiro, ou brasileira, nascido no estrangeiro e cujos pais ali não
estejam a serviço do Brasil, poderá após a sua chegada ao País, para nele
residir, requerer ao juízo competente do seu domicilio, fazendo-se constar
deste e das respectivas certidões que o mesmo o valerá, como prova de
nacionalidade brasileira, até quatro anos depois de atingida a maioridade.
(Redação dada pela Lei nº 5.145, de 20/10/66).
§ 1º O
requerimento será instruído com documentos comprobatórios da nacionalidade
brasileira de um dos genitores do optante, na data de seu nascimento, e de seu
domicilio do Brasil. (Incluído pela Lei nº 5.145, de 20/10/66);
§ 2º Ouvido o
representante do Ministério Público Federal, no prazo de cinco dias, decidirá o juiz em igual prazo.
(Incluído pela Lei nº 5.145, de 20/10/66);
§ 3º Esta decisão estará sujeita ao duplo grau
de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo
Tribunal. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 27/12/73). Grifamos.
Na hipótese acima aventada, a
subida do autos em remessa necessária independerá de a sentença ser de
procedência ou de improcedência. O intento da norma é, pois, reavaliar a
matéria, buscando alcançar o máximo de certeza, objetivando a segurança
jurídica e não exatamente a proteção da Fazenda Pública.
O Decreto-Lei nº 779/1969, que dispõe
sobre a aplicação de normas processuais trabalhistas à União Federal, aos
Estados, Municípios, Distrito Federal e Autarquias ou Fundações de direito
público que não explorem atividade econômica, traz a previsão da remessa
necessária, no seu art. 1º, inciso V, ao que chama de “recurso ordinário ex officio”, tratando-o
expressamente como um dos “privilégios”
processuais da Fazenda Pública, como se vê:
Art. 1º Nos processos perante a Justiça do Trabalho,
constituem privilégio da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais
ou municipais que não explorem atividade econômica:
[...];
V - o recurso ordinário "ex officio" das decisões
que lhe sejam total ou parcialmente contrárias;
[...].
A Lei nº 8.437, de 30.06.1992, que
dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público,
também prevê a incidência da remessa necessária, ainda nominando-a de “recurso
ex officio”, como fazia o Código de Processo Civil de 1939, conforme consta do
seu art. 3º:
Art. 3° O recurso voluntário ou ex officio, interposto
contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de
direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de
vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.
Temos ainda a hipótese do
Decreto-Lei nº 3.365/1941, conhecido doutrinariamente como “Lei Geral das Desapropriações”,
em cujo art. 28, § 1º, também prevê a remessa necessária, assim dispondo:
Art. 28. Da
sentença que fixar o preço da indenização caberá apelação com efeito
simplesmente devolutivo, quando interposta pelo expropriado, e com ambos os
efeitos, quando o for pelo expropriante.
§ 1 º A
sentença que condenar a Fazenda Pública em quantia superior ao dobro da
oferecida fica sujeita ao duplo grau de jurisdição. (Redação dada pela Lei nº
6.071, de 1974).
[...].
Alerta-se para o fato de que em todas
as hipóteses citadas a remessa necessária tem como alvo o resguardo do
interesse público, e não exatamente a proteção da Fazenda Pública.
À exceção da sentença que decreta a
carência da ação popular, que extingue o processo sem resolução do mérito (art.
267 do CPC), em todas as demais hipóteses somente as sentenças de mérito estão
sujeitas à remessa necessária. E mais, somente as sentença, nunca os acórdãos. Veja-se
que o caput do art. 475 menciona expressamente
o termo “sentença”, a indicar que se trata de decisão prolatada pelo juiz
singular (CPC, art. 162, § 1º). Os acórdãos, decisões próprias dos colegiados,
mesmo em se tratado de competência originária, não estão sujeitos ao reexame
obrigatório.
Não se incluem, portanto, nas hipóteses de remessa
necessária, com a exceção já mencionada, as decisões que extinguem o processo
sem resolução do mérito (art. 267 do CPC), bem assim todas as demais decisões
não definitivas, como é o caso dos provimentos liminares concedidos em ação de
mandado de segurança, ação cautelar, ação popular, ação civil pública e até
mesmo em sede de tutela antecipada. Todas essas decisões, sendo prolatada
contra o Poder Público, embora de caráter provisório, poderão, em regra,
observadas as exceções legais, ser cumpridas de imediato, não se submetendo ao
regime do duplo grau obrigatório de jurisdição.
Cabe ainda acrescentar que a exceção ou limite imposto
à remessa necessária pelo CPC, no parágrafo 2º do seu art. 475, ou seja, na
hipótese de condenação a
valor certo não excedente a 60 (sessenta)
salários mínimos, só se aplica às hipóteses de remessa
necessária do próprio CPC (art. 475, incisos I e II). Nas hipóteses
disciplinadas pelos demais diplomas legais, conforme acima demonstrado, não se
cogita de tal limitação, porquanto configuram situações sui geniris, normalmente refletindo obrigações de fazer, não fazer
ou dar coisa, fora do contexto econômico-financeiro próprio das condenações
pecuniárias, nas quais, encontrando-se o poder público no pólo passivo da
condenação, entra em cena a Fazenda Pública.
Enfim, o objeto da remessa necessária não se traduz
exatamente na proteção à Fazenda Pública, mas na proteção do interesse público,
do ordenamento jurídico, como forma de manifestação do princípio da segurança
jurídica.
6
A REMESSA NECESSÁRIA NO CONTEXTO DAS REFORMAS DAS DECISÕES JUDICIAIS
As
decisões judiciais, uma vez impugnadas, podem ser mantidas, reformadas, anuladas
ou integradas. Diz-se que é mantida quando o órgão ad quem expressa a sua confirmação. É reformada quando merece do
órgão revisor outra solução que a substitua. Dá-se a anulação quando verificada
a inobservância de procedimento reputado essencial ao regular prosseguimento do
feito, causando dano às partes, caso em que será proferida nova decisão. Por
último, a integração ou esclarecimento supõe uma situação em que, por regra,
nem é reforma, nem é nulidade, efetivando o juízo revisor uma espécie de
interpretação do ato decisório, normalmente por força de embargos de declaração
que, excepcionalmente, poderá ensejar nova decisão, o chamado efeito
modificativo ou translativo nos embargos de declaração.
A
doutrina aponta três categorias de instrumentos de impugnação das decisões
judiciais, quais sejam, os recursos, as ações autônomas e os sucedâneos
recursais, sendo os recursos os mais utilizados.
Há
uma estreita relação de simetria entre um recurso e a própria causa (ação),
sobretudo no que toca aos chamados elementos da ação (partes, pedido e causa de
pedir).
No
recurso, se o recorrente alega vício
na decisão atacada, diz-se que a causa de pedir é error in procedendo e o pedido há de ser de invalidade da decisão.
Se alega erro de análise da matéria, erro de escolha da decisão, a discussão então
envolverá o conteúdo da decisão. Diz-se que causa de pedido é erro in judicando, e o pedido será reforma
da decisão.
Neste
estudo vamos nos prender mais à hipótese de error
in judicando que, conforme já disposto, está relacionado com a matéria de
fundo, com o juízo de valor expressado na decisão acerca do direito substancial
invocado, e não com o procedimento. E se é assim, se a imperfeição da decisão é
atribuída a uma valoração considerada inadequada do direito substancial alegado
pelo autor, seja por erro na análise da matéria, seja pro má escolha da norma incidente,
a decisão será tida como injusta, não se cogitando de invalidade, mas de reforma.
Parte da doutrina pátria sustenta que em tal hipótese é impossível a correção ex officio, ou seja, a alteração do
julgado somente poderá ser procedida mediante iniciativa da parte interessada, por
reflexo do princípio da inércia.
Outros
defendem a possibilidade de se reformar tal decisão sem a necessária
intervenção das partes. Indicam as hipóteses em que incide o reexame obrigatório, conforme já
estudamos nos itens anteriores, bem como em se configurando as situações
previstas no art. 267, § 3º do CPC, quando então o juiz estará autorizado a
conhecer de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não
proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos incisos IV (ausência de pressupostos processuais),
V (perempção, litispendência ou coisa
julgada) e VI (quando não concorrer
qualquer das condições da ação).
Não
se duvida de que o juiz possa operar de ofício na forma do art. 267, § 3º, para
sanar as irregularidades ali apontadas. Isto, evidentemente, não contraria
qualquer princípio processual, pois o objetivo é apenas sanar defeito de forma
ou vício, e não modificar o juízo de valor expressado acerca do direito
material discutido. A hipótese é, pois, de error
in procedendo, não de error in
judicando.
Se
a imperfeição atribuída à decisão caracterizar error in judicando, aí sim, tal decisão somente poderá ser revista
mediante intervenção da parte, à exceção dos casos de cabimento da remessa
necessária, que constitui verdadeira exceção a esse a essa
Intervindo
a parte interessada mediante a interposição do competente recurso, o órgão que
o apreciar ficará limitado a dar-lhe provimento para melhorar a situação do
recorrente ou a julgá-lo improcedente, mantendo aquilo que a sentença já havia
concedido. Nunca, sob pena de nulidade, poderá o órgão revisor piorar a
situação do recorrente, por força do princípio non reformatio in pejus, próprio das espécies recursais.
Discute-se,
porém, se essa limitação do órgão revisor é levada a efeito em se tratando de
remessa necessária, sabendo-se que esta não constitui uma espécie recursal e,
portanto, não estaria sujeita ao princípio non
reformatio in pejus, como dito,
próprio dos recursos.
6.1 O princípio da non reformatio in pejus
A
proibição da “reformatio in pejus”
consiste na impossibilidade de a instância revisora reformar a decisão judicial
revisanda, resultando uma situação de piora para a parte recorrente. Objetiva,
pois, garantir ao recorrente a mantença daquilo já lhe foi concedido na decisão
recorrida, só sendo permitido ao órgão revisor negar provimento ao recurso,
mantendo assim o que já concedido, ou reformar a decisão recorrido em benefício
do recorrente, nunca para retirar o que já lhe tenha sido concedido na
sentença.
Dito
isso podemos concluir que o princípio em destaque é manifestação do princípio
da congruência ou adstrição (CPC, art. 128 e 640) na fase recursal, limitando objetivamente
a decisão do órgão revisor aos termos do pedido formulado nas razões recursais,
como ocorre na sentença em relação à petição inicial. Disso, pode-se concluir
que o recurso é também um projeto do acórdão do mesmo modo que a petição inicial
é um projeto da sentença.
Segundo
os princípios acima mencionados, bem assim o princípio do dispositivo, é
inadmissível tanto a reformatio in pejus,
como também a reformatio in melius,
pois não pode o tribunal piorar nem tampouco melhorar a situação do recorrente
além dos limites por ele mesmo fixado em seu recurso.
Mas
é preciso lembrar que não se inclui nessa regra a possibilidade de serem conhecidas
de officio as questão de ordem
pública, relacionadas às hipóteses de error
in procedendo, sobre que já discorremos no início deste item 6. Nesse caso,
evidentemente, a modificação do julgado independerá de manifestação de qualquer
das partes, não importando a quem vá prejudicar ou beneficiar, a exemplo do que
ocorre na detecção da falta de condição da ação ou de pressuposto processual.
6.2 O princípio da non reformatio in pejus e a remessa necessária
A
abrangência da proibição de reforma in pejus em sede de “reexame
obrigatório” não é consenso, em se tratando de error in judicando, situação caracterizada por equívoco na decisão,
erro no julgamento, na apreciação do direito material discutido, tratando-se,
portanto, de acerto ou desacerto na avaliação da causa, e não de invalidade.
Mas já não se discute sobre a atuação do órgão revisor
nas questões de ordem pública, havendo erro
in procedendo, ainda que não levantadas pelas partes, como comentado no
item 6.1, situação em que se cogita de nulidade processual e não de acerto ou
desacerto na avaliação da causa. Portanto, aqui analisaremos a modificação da
sentença apenas sob a ótica do error in
judicando.
Segundo
orientação firmada pelo STJ (Súmula 45) e pelo STF (RTJ 114/913 e 108/1266; RT
598/260, 584/272 e 478/229), o “reexame obrigatório” é instituído
em benefício exclusivo do ente público, não podendo o Tribunal agravar a
situação daquele como resultado da remessa oficial, em face do princípio da
proibição da reformatio
in pejus. Todavia, ainda há muita controvérsia.
Nelson Nery Júnior (2003, p. 814) é enfático ao
defender a
plena possibilidade de agravamento da Fazenda Pública pelo Tribunal em sede remessa
necessária. Para este doutrinador tal agravamento não caracterizaria a reformatio
in pejus, tratando-se apenas da “incidência do interesse público do reexame
integral da sentença”, por força do efeito translativo a que estão sujeitas as
questões de ordem pública.
A discussão é de extrema importância em matéria
processual, principalmente diante da nova corrente que se forma para fazer
frente aos chamados “privilégios do Poder Público”, dentre os quais, segundo
muitos pensadores, inclui-se por excelência a “remessa necessária”,
principalmente do modo como vem sendo admitida, em exclusivo benefício da
Fazenda Pública.
O próprio legislador já vem se mostrando cauteloso
quanto ao referido instituto, como se pode notar pela disposição da Lei nº
10.352/2001, que reformou o art. 475 do CPC, encolhendo as hipóteses de aplicação
da remessa necessária, numa clara ênfase à interpretação restritiva do
instituto.
Uns
poucos doutrinadores, bem como uns e outros magistrados, em julgamentos
isolados, defendem a possibilidade de ser piorada a situação da Fazenda Pública
em sede de remessa necessária. Entendem não caracterizar propriamente reformatio in pejus, ao fundamento de
que a remessa necessária é uma manifestação do princípio inquisitório, e desse
modo estaria o órgão revisor apenas aperfeiçoando o julgado, e não propriamente
agravando a situação da Fazenda Pública, embora esse aperfeiçoamento viesse concretamente
a produzir uma piora na condenação do ente público.
Outros,
que também admitem a reforma para pior o fazem ao fundamento de que o
agravamento na condenação é exatamente a reformatio in pejus, proibida apenas para os recursos, sendo
plenamente possível em sede de remessa necessária, eis que esta não se trata de
recuso. Neste sentido também leciona Barbosa Moreira
(1998, p. 426), asseverando que a proibição da reformatio in pejus é um
instituto inerente aos recursos, e não sendo a remessa obrigatória uma espécie
de recurso, na sua seara não há que se falar em proibição de reforma para pior.
Novamente invocamos Nelson Nery Júnior (2003, p. 813-814), para quem não se pode falar em
reformatio in pejus na remessa oficial, porque o princípio proibitivo da reforma para pior é
conseqüência direta do princípio dispositivo aplicável aos recursos, e a
remessa oficial tanto não é espécie recursal quanto não é informada pelo
princípio dispositivo, e sim, pelo inquisitório, onde ressalta a incidência do
interesse público no reexame integral da sentença.
Vê-se que
a corrente defensora da proibição da reforma para pior na remessa necessária
sustenta a clara existência do pleno efeito devolutivo nesta, e que o princípio
inquisitivo está presente no sistema recursal brasileiro da mesma maneira como
se manifesta na instrução processual em primeira instância.
Significa
dizer que, conquanto prevaleça o princípio do dispositivo em algumas fases do
procedimento, não podem ser ignoradas eventuais manifestações do princípio
inquisitivo, decorrentes do caráter público do processo e do interesse do
Estado na melhor prestação jurisdicional, estando o princípio inquisitivo
manifestamente presente tanto nos procedimentos de primeira instância, quanto
nos procedimentos recursais. E o efeito devolutivo, inerente aos recursos,
embora se manifeste predominantemente no princípio dispositivo, não deixa de
apresentar certas configurações típicas do princípio inquisitivo, a exemplo das
manifestações de ofício na condução do processo. Portanto, para esta corrente,
nada obsta que se fale em efeito devolutivo da remessa oficial, eis que o
aludido efeito comporta nuanças tanto do princípio dispositivo quanto do
inquisitivo.
A conclusão dessa doutrina favorável à reforma para
piorar a situação da Fazenda Pública, pois, é de que a remessa necessária flui
do princípio inquisitivo, ao passo que a regra proibitiva da reformatio in pejus está relacionada com
o princípio dispositivo.
Entretanto,
é indiscutivelmente majoritária a corrente contrária a esses posicionamentos. Aliás,
corroborada pela jurisprudência, no que citamos a Súmula nº 45 do STJ e a
Súmula nº 14 do TRF da 2ª Região:
Súmula n.º 45
(STJ) - No reexame
necessário, é defeso, ao tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda
Pública.
Súmula n.º 14 (TFR
da 2ª Região) - A
remessa necessária não pode ser provida para agravar a condenação imposta à
Fazenda Pública, haja ou não recurso voluntário das partes.
A
orientação firmada também pelo STF[2] é
no sentido de que a proibição da reformatio
in pejus estende-se às hipóteses de remessa necessária, não podendo a
entidade pública ter sua situação agravada como resultado da remessa necessária,
instituída em exclusivo benefício do poder público. Neste
sentido, as lições de Humberto Theodoro Júnior (1992,
p. 538).
Um dos dos argumentos da corrente majoritária se
enverga sobre os motivos (fins) que teriam dado origem ao instituto da remessa
necessária, concluindo que, se o referido instituto foi arquitetado e instituído
no interesse da Fazenda Pública, seria incoerente admitir-se que esta viesse a
ter sua situação agravada em sede de reexame. Seria mais uma razão para se
afirmar a proibição da reformatio in pejus na remessa necessária.
Em suma, seja nas hipóteses do art. 475 do CPC, em
que a remessa necessária busca proteger o interesse da Fazenda Pública, seja
nas demais hipóteses previstas nas diversas normas citadas, em que a remessa
necessária busca proteger não exatamente a Fazenda Pública, mas o interesse
público, é amplamente majoritário o entendimento pela incidência do princípio non reformatio in pejus, igualmente como se dá nas espécies recursos.
7 CONCLUSÃO
A remessa necessária, prevista no art. 475 do CPC, bem
como em diversos outros diplomas normativos, a exemplo da Lei nº 1.533/51 (Lei
da Ação de Mandado de Segurança); da Lei 4.717/65 (Lei da Ação Popular), e do
Decreto-Lei nº 779/1969 (dispõe sobre a aplicação de normas processuais
trabalhistas), é hoje vista por alguns doutrinadores como mais
um dos injustificáveis privilégios processuais do Poder Público, objeto de
violação da isonomia dentro do processo.
É consenso na doutrina e na jurisprudência o
entendimento que nega natureza recursal à remessa necessária, tratando-se de um
instituto sui generis, destinado a reavaliar
a condenação imposta por sentença à Fazenda Pública, especialmente nas
hipóteses do art. 475 do CPC, e a proteger o interesse geral nas demais
hipóteses.
Têm sido estabelecidos fervorosos debates em torno do
referido instituto, principalmente no que diz respeito à possibilidade de agravamento
da condenação imposta à Fazenda Pública ou ao interesse público, quando a
matéria é remetida ao órgão revisor por força da remessa necessária.
Com respaldo na jurisprudência do STJ e do STF, a
doutrina é majoritária no sentido da impossibilidade de piora da condenação em
remessa necessária, eis que consistiria em afronta ao prestigiado princípio da non reformatio in pejus. Contudo,
cresce o número de julgados adotando entendimento contrário.
Efetivamente,
podemos dizer que três correntes discutem o tema. A primeira delas, na qual se
inserem as jurisprudências do STF e do STJ, indiscutivelmente majoritária,
coíbe qualquer reforma no sentido de agravamento à Fazenda Pública em remessa
necessária.
Uma
segunda corrente defende a possibilidade de reforma para piorar a situação do
condenado, ao fundamento de que a remessa necessária não seria informada pelo
princípio dispositivo, pois o procedimento se dá por força de norma imperativa
absoluta, agasalhando-se, portanto, tal instituto, na seara do princípio
inquisitório, e por isto também não se pode falar em simples efeito devolutivo,
mas em efeito translativo, devolvendo-se toda a matéria ao órgão jurisdicional
revisor e não apenas a parte que afeta o ente público. Para os defensores deste
pensamento, dentre os quais Nelson Nery Júnior, o agravamento da Fazenda
Pública não teria qualquer relação com a proibição da reformatio in pejus.
Seria uma espécie de imperativo da norma em busca da perfeição dos provimentos
jurisdicionais.
Uma
terceira corrente emerge da segunda, radicalizando-a. Defende o cabimento da própria reformatio in pejus,
por não se tratar a remessa obrigatória de um recurso, propriamente, e sim, de
um instrumento que busca alcançar o interesse público, cujo fim último é a
máxima justeza dos provimentos jurisdicionais.
Ora, dizer-se que a remessa necessária aproveita
ao estrito interesse do ente estatal seria excluir o verdadeiro intento do
legislador, que estaria assentado no interesse geral, o qual vai além do mero
interesse da pessoa jurídica de Direito Público. O interesse público abrange
tanto o interesse do ente estatal, porque este é patrimônio de todos, como
também os interesses e objetivos do Estado Brasileiro, consubstanciado no ordenamento
jurídico como um todo, em especial no art. 3º, inciso I, da Constituição
Federal, que expressa como um dos objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Não traduziria absurdo algum admitir-se que a
remessa necessária está muito acima do mero interesse da pessoa jurídica de
Direito Público, porquanto materializa a tentativa de se entregar à sociedade
uma prestação jurisdicional o mais próximo possível dos sentimentos de justiça,
independendo, assim, de se agravar ou não a situação do ente público.
Todavia, da forma em que foi concebida e se
encontra positivada no nosso ordenamento jurídico, nos termos do art. 475 do
CPC, especificamente para reavaliar uma condenação imposta contra a Fazenda Pública,
que por sua vez representa o interesse geral, a conclusão há de ser pela
incidência do princípio non reformatio in
pejus.
O contrário disso, ou seja, admitir-se que a
revisão do julgado em sede de remessa necessária possa piorar a condenação imposta
à Fazenda Pública, equivale admitir-se que a outra parte possa disso se
beneficiar, aumentando seu quinhão na sentença sem ter para tanto promovido o
competente recurso, o que efetivamente esbarraria no princípio da demanda ou da
inércia da jurisdição.
De fato, aparentemente há uma certa impertinência falar-se
em proibição de reforma para pior em sede de remessa necessária, pois não se
trata de uma espécie recursal, e o princípio da non reformatio in pejus é atinente aos recursos. Ora, mas não há
norma superior estabelecendo essa exclusividade do princípio em destaque aos
recursos e nem proibindo a sua extensão à remessa necessária.
Tudo gira em torno dos interesses mais relevantes no
âmbito do Estado, o interesse geral, que se traduz na defesa do patrimônio
público, este materializado nas suas diversas dimensões, justificando-se perfeitamente
a existência de um instituto próprio a dar uma maior expressão de certeza à
sentença, quando esteja em jogo o patrimônio público, o interesse geral, a
exemplo do que ocorre na ação popular, quando a sentença extingue o
processo por carência de ação ou julga improcedente o pedido popular, vindo a
remessa necessária não exatamente para resguardar o interesse do ente público,
mas o interesse da coletividade, que na hipótese afigura-se mais relevante do
que o interresse do próprio ente estatal.
Enfim, seja qual for a situação, fica afastada a
possibilidade de reforma da sentença para agravar a situação daquele a quem a
remessa necessária deve aproveitar, seja a Fazenda Pública (nas hipóteses art.
475 do CPC), seja o interresse geral (nas hipóteses previstas nas demais
normas). E isto, não por se tratar a remessa necessária de uma espécie
recursal, mas por uma questão de razoabilidade, não se podendo admitir que
aquele em função de quem foi criado um dado instituto seja em função deste prejudicado.
Também, não há qualquer norma que estabeleça exclusividade do princípio non reformatio in pejus às espécies
recursais, podendo este ser muito bem estendido à remessa necessária, eis que
neste particular é similar aos recursos.
Por último, não cabe falar-se em reforma para pior,
em sede de remessa necessária, por força do disposto nos arts. 128 e 460 do
CPC, princípio da adstrição ou da congruência entre a decisão e o pedido, não
podendo o tribunal conceder providências que não foram postuladas, ou seja, não
poderá melhorar a situação da parte contrária à Fazenda Pública se esta sequer
recorreu.
Não seria demais invocar também o princípio da
inércia da jurisdição, perfeitamente aplicável na esfera recursal, vedando a
atividade jurisdicional sem a correspondente provocação da parte (CPC, art.
2º), princípio este intimamente ligado ao já citado princípio da congruência,
de modo que a parte não poderá ser agraciada com uma decisão ser formular,
expressa e especificamente, pedido algum ao tribunal, sendo a este vedada a
prolação de decisão infra, extra ou ultra petita, nos termos do art. 460 do
CPC.
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TOSTA, Jorge. Do
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obrigatório. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1242, 25 nov. 2006. Disponível
em: . Acesso em 31
jul.2007.
[2] STF (RTJ 114/913 e 108/1266; RT 598/260, 584/272 e 478/229).
COMO CITAR ESTE TEXTO:
BARROS,
Clemilton da Silva.
Considerações prognósticas do reexame necessário no
Processo Civil Brasileiro. Disponível em: http://www.juridicosetc.blogspot.com. Acesso
em: dia/mês/ano.
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